Cartas à Directora

Litania para este Natal

A todas as vozes que se calam, mesmo por vergonha ou preconceito, das preces de Natal, mas sentem um impulso de compaixão porque vivem o essencial e desprezam a aparência…
A todas as novas e velhas solidões, encandeadas pelas luzes de um progresso que não tem vergonha de as cegar assim porque é das trevas que nascerá de novo a luz da solidariedade…
A todos os amordaçados por delitos de opinião, nas prisões deste “novo” mundo, para que as feridas dos seus silêncios sangrem no sonhos de todos os poderosos porque o remorso pode dar frutos abrindo os corações…
A todos os que estenderam braços em abraços, sem preconceitos de raça ou condição social porque deles será o futuro, por mais longínquo que pareça…
A todos os que ousaram rir perante a hipocrisia reinante, dando a resposta mais subtil às índoles empedernidas dos donos dos “saberes” e das “verdades” porque a felicidade há-de vir vestida de palhaço pobre…
A todas os que nasceram neste ano e que vão sofrer as convulsões dos afectos e das novas desigualdades porque carregam em cima dos ombros a tarefa Hercúlea de construir um mundo novo…
A todas as expressões de arte que surgiram nestes tempos baços, frutos dos desalgemados do mundo porque só elas podem colorir as almas e os corações desencantados…
A todas as vítimas dos abutres de colarinho branco ou vermelho, que provocaram a crise financeira para poderem comer o resto da carne dos fracos, no banquete do liberalismo económico porque será do seu desnecessário sacrifício que poderá nascer uma nova ordem económica …
A todos aqueles que combateram e combatem os velhos preconceitos sem caírem no relativismo radical do laicismo porque será nesse meio-termo do bom senso que se poderão criar novos valores…,
A todo os que souberam dar Amor nestes tempos de guerra psicológica e desamparo afectivo porque será sempre esse o lugar do encontro fraterno e da salvação da própria Humanidade…

José Carlos Palha, Gaia
 

 

 

Processos de Natal

Ao princípio, reza a lenda impressa, era o Reino. O Senhor o tinha ungido em óbvio desejo divino. Desse tempo em que os piolhos nasciam e morriam mudos terá restado uma ou outra estátua equestre. Veio depois, noblese oblige, a grande cidade burguesa, rica do seu livre comércio, férias pagas e direito universal de voto. Agora que tudo são ruínas, frementes fantasmagorias, avista-se a República dos Juízes: é, ao menos, o que anunciam os próprios ao século, embalados da furiosa heroicidade das figuras da Marvel. Será caso para inscrever em cada umbral, público ou privado, a divisa "lasciate ogni speranza voi ch'entrate"? Enfim, a cada época, o seu Processo. Entretanto, votos de Feliz Natal e Próspero Ano Novo, especialmente para os doentinhos e os privados de liberdade que, afinal, somos quase todo(a)s. 

Rita L. Aguiar, Lisboa

 

 

 
 

 

 

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