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A pandemia empurra os indianos para o interior das florestas — onde os tigres espreitam
Na Índia, a pandemia tem obrigado muitas famílias a ter de pescar no interior de Sundarbans, arriscando-se a um encontro fatal com um tigre. Além disso, o aumento da frequência de tempestades, provocadas pelas alterações climáticas, torna muitos terrenos agrícolas inférteis e faz aumentar as dificuldades. "Se eu não for para a selva, não terei comida suficiente.”
Parul Haldar é uma das mulheres que perdeu o marido em sequência de um ataque de um tigre, enquanto pescava nas florestas de mangue em Sundarbans, na Índia. Agora, sem a ajuda do companheiro há quatro anos, é ela que tem de estar na proa do pequeno barco de madeira a puxar as redes do rio, descreve a Reuters.
Ashtami Mondal, de 29 anos, viu o marido Haripada Mondal pela última vez em Março de 2020. Seria encontrado morto meses depois, em Setembro, vítima de um ataque semelhante, deixando um filho de 9 anos. Haripada era o único a ter dinheiro para sustentar a família e saiu para pescar poucos dias antes do confinamento nacional devido à covid-19. “Se não houvesse nenhum confinamento ou coronavírus, ele teria saído daqui para trabalhar [noutros locais da Índia]”, diz Ashtami, à agência.
Em Sundarbans, uma área ecologicamente frágil, composta por pequenas ilhas, há cerca de 10 mil quilómetros quadrados de árvores junto aos rios. A zona é conhecida pela floresta de mangue e pela população de tigres, cujos ataques fatais a humanos têm vindo a ser mais frequentes: de acordo com o director da reserva de tigres Tapas Das, cinco pessoas foram mortas desde Abril de 2020, enquanto os meios de comunicação locais dão conta de 21 mortes no ano passado. A covid-19 é apontada como um novo factor que justifica este aumento, pois fez com que dezenas de milhares de pessoas tivessem de pescar nos rios das florestas locais por não estarem a ganhar dinheiro noutros trabalhos pela Índia.
É o caso de Haldar, mãe solteira de quatro filhos, que se coloca em risco sempre que vai pescar. É a prova viva das crescentes pressões económicas e ecológicas que enfrentam as mais de 14 milhões de pessoas que vivem na área, tanto do lado da Índia, como do Bangladesh. A agricultura escasseia e há cada vez mais trabalhadores migrantes, que agora não se podem deslocar por causa da covid-19. Haldar depende como nunca do que encontra no delta, por isso todos os dias arrisca-se a ter um encontro fatal com um tigre.
"Quando entro na floresta, sinto que tenho a minha vida nas mãos", conta Haldar, de 39 anos, sentada à porta da sua casa em Satjelia, depois de regressar da pesca. É o que faz grande parte do dia – é da apanha de peixe que vem o dinheiro para gerir a casa e para a escola da filha Paril, de 11 anos. "Por mais difícil que seja, eu quero educá-la", diz à Reuters. Para além disso, duas vezes por mês, viaja pelo interior das florestas para capturar caranguejos, remando seis horas num barco raquítico, juntamente com a sua mãe. "Se eu não for para a selva, não terei comida suficiente.”
Investigadores afirmam que as tempestades ciclónicas, provocadas pelas alterações climáticas, têm sido mais intensas e mais frequentes na área. Como muitas das ilhas estão abaixo do nível das águas do mar, ficam em risco casas e quintas que estavam protegidas por aterros, além de as culturas ficarem cobertas de água salina, originando terras inférteis durante meses – foi o que aconteceu a 1500 famílias em 2020, entre as quais a de Nagin Munda. "Já não tenho peixe no meu lago, não tenho vegetais no meu jardim e metade da minha cultura de arroz desapareceu", lamenta o agricultor de 50 anos.