“Quem for contra a imigração, é contra o desenvolvimento do país”, diz presidente da Confederação dos Agricultores

Presidente da Confederação dos Agricultores diz que o sector depende da imigração, mas defende controlo para evitar precariedade. Deixa recado à “gente da cidade” e critica “extremistas ambientais”.

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Álvaro Mendonça e Moura, presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) José Sena Goulão / LUSA
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O presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) afirmou que, "quem for contra a imigração, é contra o desenvolvimento do país", sublinhando que qualquer Governo deve passar pela concertação social para "ouvir os outros".

"É muito importante percebermos todos que quem for contra a imigração é contra o desenvolvimento do país. Isto precisa de ser interiorizado", defendeu Álvaro Mendonça e Moura, em entrevista à Lusa.

O antigo embaixador, que assumiu a presidência da CAP no ano passado, destacou a importância dos trabalhadores estrangeiros para sectores como a agricultura, turismo ou construção, que dependem desta mão-de-obra "para a sua sobrevivência".

No caso particular da agricultura, o presidente da confederação lembrou que algumas empresas chegam a ter 300 trabalhadores imigrantes, uma vez que em Portugal seria impossível recrutar este número. Porém, ressalvou que deve haver controlo para que as pessoas sejam contratadas "em boa e devida forma", com contratos de trabalho.

Álvaro Mendonça e Moura destacou que foi a CAP a propor medidas para facilitar a concessão de habitação a trabalhadores migrantes nas empresas agrícolas. "Foi uma proposta da CAP, não foi dos sindicatos [...]. Nós queremos trabalhadores estrangeiros, mas trabalhadores estrangeiros devidamente integrados, com condições de vida dignas e com respeito pelos seus direitos", vincou.

O líder da confederação dos agricultores pediu que se evitem populismos, nomeadamente a ideia de que Portugal poderia prescindir destes trabalhadores, o que disse ser "um disparate com gravíssimas implicações económicas".

Mendonça e Moura notou também que qualquer governo "deve ser obrigado a passar pela concertação social" e a discutir com os seus parceiros, lembrando o acordo de reforço dos rendimentos, assinado em Outubro de 2023.

Através deste acordo foi decidido "um reforço muito significativo" do primeiro pilar (pagamentos directos) da Política Agrícola Comum (PAC), de modo a que o sector esteja mais próximo dos "parâmetros organizacionais" de Espanha ou França. "Isso nunca tinha sido feito e é muito importante para nós. Está ainda por implementar e por isso eu digo que, seja qual for o governo [...], é essencial respeitar o que foi acordado em sede de concertação social", acrescentou.

Neste sentido, Álvaro Mendonça e Moura considerou que a concertação social deve sempre ser um fórum importante para que as confederações patronais, os sindicatos e o Governo possam ouvir-se, perceber as prioridades e preocupações dos outros.

Em Outubro de 2023, o Governo de António Costa (PS) assinou com os parceiros sociais um reforço do acordo de rendimentos, que subiu para 820 euros o salário mínimo nacional, com um referencial de aumento para os restantes salários de 5%, acima dos 4,8% anteriormente previstos.

Um dos principais pontos deste acordo passou também pelo acréscimo do rendimento das famílias, através da redução do IRS (Imposto sobre o Rendimento de pessoas Singulares), da actualização dos escalões e da isenção do IRS no salário mínimo.

Por outro lado, tem por objectivo o incremento da competitividade da economia, com o reforço do regime fiscal de incentivo à capitalização das empresas, do regime fiscal de apoio ao investimento e do aumento dos apoios aos agricultores.

Ninguém de bom senso" nega as alterações climáticas

O presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal defendeu, também em entrevista à Lusa, que "ninguém de bom senso" nega a existência de alterações climáticas e criticou os "extremistas ambientais" que compram arroz da Tailândia e manga do Brasil.

"As alterações climáticas estão aí, não é uma questão. Ninguém de bom senso disputa a existência de alterações climáticas, que os agricultores verificam todos os dias", afirmou Álvaro Mendonça e Moura.

O impacto no sector agrícola é visível, por exemplo, nas vindimas, que hoje se realizam um mês mais cedo do que há algumas décadas. Perante este problema, o sector agrícola tem feito um "esforço enorme" para ser mais eficiente, nomeadamente, no que diz respeito à utilização da água, condição que disse ser necessária para uma empresa ser competitiva.

"O agricultor não só percebe as alterações climáticas, como tem todo o interesse em adaptar-se no sentido de ser mais eficiente e é esse caminho que tem feito. Provavelmente, mais do que qualquer outro sector", sublinhou.

No entanto, Álvaro Mendonça e Moura notou que "muita gente da cidade" ainda não se deu conta deste investimento que o setcor agrícola tem vindo a fazer ao longo dos anos. Esta adaptação às alterações climáticas passa também pela introdução de novas culturas porque "não se pode continuar a produzir em 2024 como em 1960".

Contudo, Álvaro Mendonça e Moura criticou aquilo que disse ser um "extremismo ambiental" que não aceita a agricultura e que gostaria que toda a paisagem fosse "um sítio de lazer para o citadino ir uma vez por ano", vincando que não se pode fazer uma dissociação entre sustentabilidade ambiental, social e económica.

"Esses são os que depois vão ao supermercado comprar arroz da Tailândia e manga do Brasil, ignorando a pegada carbónica e os produtos utilizados" nestes alimentos, acrescentou.

Assim, o antigo embaixador lamentou o "dogmatismo ambiental", sublinhando que o foco deve ser colocado na produção de alimentos saudáveis, com o menor impacto possível.

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