Cristiano Ronaldo

"A minha mãe continua a tratar-me como um bebé." Ele gosta, porque vê-se ao espelho e encontra uma criança. Momentos, o livro que está nas bancas há dias, tem 173 páginas onde o puto-maravilha mostra alguns dos seus lados que não são do domínio público. Como este: "Gostava de ter um filho algum tempo antes de casar." Ou este: adora massagens nos pés

a Como sempre, há duas hipóteses em cima da mesa, os dados estão lançados, faites vos jeux: ou falamos daquele lado dele que pouca gente conhece (das unhas encravadas que não tem, por exemplo) ou descrevemos os mimos que dá à bola antes de entrar em campo (e esta parte, a desportiva, é muito mais chata, até porque toda a gente sabe que ele tem muita habilidade - mais do que isso, talvez - para a coisa.) Neste "Agora Escolha" versão de imprensa, há uma regra que inventámos agora: não descartamos nenhuma das hipóteses, apenas passa primeiro a que teve mais votos. Como nunca ninguém vai saber quem ganhou, somos nós que damos a cara pela opção...Ladies and gentlemen, eis Cristiano Ronaldo, o menino da mamã. O outro, o que este ano arrebatou de uma assentada dois prémios, o de melhor jogador do ano em Inglaterra e o de melhor jovem do ano, fica mais lá para a frente, algures para o 12.º parágrafo.
Não é preciso adiantarmo-nos muito na leitura de Momentos, o livro que o puto-maravilha do Manchester United escreveu em parceria com Manuela Brandão e que chegou há poucos dias às bancas, para percebermos isso mesmo - que ele ainda é um menino da mamã. "A minha mãe continua a tratar-me como um bebé. Eu gosto de me ver como um miúdo". Assim mesmo, sem rodeios. E não podia ser de outra maneira, dizemos nós, fica-lhe bem este realismo: Cristiano Ronaldo tem 22 anos e uma cara de miúdo (mas já é muito rodado) que não engana ninguém.
Dono de uma das contas bancárias mais chorudas do mundo da bola conjugado em português (o contrato que o liga ao Manchester até 2012 garantir-lhe-á qualquer coisa como 700 mil euros/mês), Cristiano Ronaldo tem duas paixões na vida: família e futebol, por ordem de prioridade, como deixa transparecer no livro editado pela Ideias&Rumos. A mãe, Maria Dolores, será a que mais vibra com a carreira do filho.
Diz o craque - que aos 16 anos treinou pela primeira vez com a equipa profissional do Sporting e aos 18 aterrou em Old Trafford - que o obstetra que assistiu ao parto anunciou à sua mãe: "Dona Dolores, o seu filho tem pés de jogador." Ela emocionou-se. A partir daí, a vida da mãe Dolores seria vivida de emoção em emoção, até à apoteose final - a mais recente foi no final da Premier League deste ano, quando invadiu o relvado de Old Trafford para festejar com ele o seu primeiro campeonato. Chovia a potes, ela tinha os saltos dos sapatos enterrados na relva mas tinha de estar lá, com as suas lágrimas.
Dura vida esta, a de mãe de um menino da mamã. No primeiro jogo em que foi titular pela equipa principal do Sporting (em casa, contra o Moreirense), Ronaldo marcou dois golos e Dolores (aficionada pela bola, adepta incondicional do Sporting) teve de ser assistida no estádio. No Portugal-Inglaterra do Euro 2004 desmaiou e de então para cá já nem vê nenhum penálti que ele marque. Na última Páscoa, no camarote presidencial de Old Trafford, o United defrontava a Roma a contar para os quartos-de-final da Liga dos Campeões. Os da casa ganharam 7-1 e Dolores assinalou com lágrimas cada um dos golos da equipa do filho. "Não tem juízo nenhum, a minha mãe."
Um filho antes de casar
Mãe, mãe, mãe... E mulheres, outras que não a mãe? Não, as irmãs Cátia (Ronalda no mundo da música) e Elma também não contam, estão no capítulo paixão familiar. Ao longo das 173 páginas do livro, profusamente ilustrado com fotos de Jorge Monteiro, Ronaldo não fala de nenhuma em particular. Quer dizer, até fala: da holandesa que acampou - mesmo - frente à sua casa de Manchester. Viajara da Holanda de propósito para o ver e Cristiano teve de lhe pagar a viagem de regresso. Ela, insistente, ainda voltou uma vez.
Ele diz, sem papas na língua, que está "em idade de namorar" e que pode fazê-lo porque não tem nenhum compromisso. "Não tenho intenção de casar já. Nem nos tempos mais próximos", assegura. Mas atenção meninas em idade fértil: Ronaldo gostava "de ter um filho algum tempo antes de casar". "E se fosse do sexo masculino, então que tivesse os meus genes futebolísticos." As candidaturas devem ser enviadas para Manchester United, Sir Matt Busby Way, Old Trafford, Manchester, M16 ORA... (É a esta morada que chega todos os dias, revela Cristiano, um sem-número de cartas que lhe são dirigidas. Umas são simplesmente pedidos de autógrafos ou fotografias; outras muito mais ousadas. Os pedidos de financiamento são o pão nosso de cada dia - há tempos recebeu um para a criação de caracóis em viveiro...)
Quem é Cristiano Ronaldo, o menino da mamã, visto pelo próprio? "Quando me contemplo ao espelho observo uma pessoa absolutamente igual a tantas outras", confessa. E diz mais: "O espelho revela-me também uma criança. Sou-o com orgulho e tudo farei para continuar a sê-lo. Quero ser eternamente criança." Ronaldo é uma criança "antitabagista" (que o diga o primo Nuno, que vive com ele e o cunhado Zé na casa de Manchester), que acorda às 7h30 e come, antes de sair para Old Trafford, um iogurte, uma torrada e uma tosta mista, que "gostava de conhecer a pessoa que inventou o avião", que foi para Inglaterra sem saber quase nada de inglês, que acreditou no Pai Natal "até aos 10, 11 anos", que não tem "qualquer culto pelo físico".
É verdade, ele jura que não. "Vai longe o tempo em que me escapava para o ginásio da Academia do Sporting e me agarrava às máquinas de musculação", conta. Se fez tanto exercício ao longo da carreira foi apenas porque "queria ficar mais forte". Ainda antes de sair da Madeira rumo à conquista do continente e, depois, do mundo, era "pequeno e franzino" e quis contrariar isso: chegou a comer "dois pratos de sopa antes da refeição", para crescer.
Hoje, para além do exercício indispensável à sua condição de jogador, tem "cuidado para que as unhas dos pés não encravem" e gosta de uma boa massagem nos mesmos pés que lhe rendem milhões. Andou um ano com aparelho para corrigir os dentes mas não apreciou "nada a experiência". Fora isso, é uma criança tranquila e caseira, detesta ter a casa desarrumada, gosta de cinema - quase todos os tipos de filmes, mas os de terror agradam-lhe muito - e ouve música diversificada. No Mundial de 2006, obrigou os companheiros da selecção nacional a ouvir até à exaustão World, hold on, de Bob Sinclar.
"Na lua" em Manchester
Eis Cristiano Ronaldo ("Abelhinha" para os amigos do Andorinha, o seu primeiro clube), que ainda quase não tinha gozado a maioridade e já se tornara uma estrela maior do futebol mundial. Frequentou um colégio de freiras e sempre que voltava da escola atirava "a mochila para o sofá" e ia jogar à bola nas ruas próximas da Quinta do Falcão, onde vivia com a família. Aos 12 anos jogava no Nacional e chegou um convite do Sporting.
"Passei a ser o único responsável por mim próprio entre os 12 e os 13 anos. Foi neste momento que comecei a crescer." Deixou a Madeira - "a ilha mais bonita do mundo", onde planeia, quando pendurar as botas, construir um hotel de sete estrelas, o CR7 - e instalou-se, sozinho, na Academia do Sporting. As saudades da família fizeram-no ter "vontade de desistir". A sua pronúncia, que motivou a troça dos colegas de escola, também não ajudou nada à festa.
Mesmo com muitas lágrimas, Cristiano deixou-se ficar por Lisboa. Com o tempo começou a deixar a escola para trás e apostou forte no futebol. Hoje está ligeiramente arrependido. "Lamento não ter ido mais além na minha formação escolar, mas tive de fazer uma opção na minha vida", confessa. Mas não aconselha "nenhum jovem" a fazer o mesmo.
Praticamente não aqueceu o lugar na equipa principal do Sporting, onde chegou aos 16 anos, pela mão do treinador Laszlo Bolöni (será sempre uma "referência" para ele, porque o lançou no futebol profissional). Dois anos depois, mudou-se de armas - mas sem bagagem, recorda - para Manchester. Estreou-se contra o Bolton e foi considerado o melhor jogador em campo. "Sentia-me na lua."
Quem é Cristiano Ronaldo, o jogador, visto pelo próprio? "Jamais terei a veleidade de dizer que não conseguiria viver sem uma bola. Mas posso assegurar que não sou capaz de imaginar, sequer, a minha vida sem um treino, sem um relvado, sem um jogo, sem o entusiasmo e o empolgamento da competição." Momentos também desvenda algumas das suas rotinas no United - ficam os fãs a saber que as brincadeiras que faz com a bola antes dos jogos servem para "descomprimir".
Pega na bola, passa-a por baixo de um pé, depois do outro, eleva-a, pára-a no peito, acaricia-a... "Faço-o por puro prazer mas também para quebrar algum stress que me possa atacar antes do jogo", explica. Antes de cada partida, "assim que o treinador divulga a constituição da equipa", Ronaldo vai para o balneário e começa "a dar toques na bola". É sempre assim, é quase religioso.
Sem "vedetismo"
Não será propriamente novidade para ninguém, mas ele admite que fica "aborrecido" quando não é titular. "Não gosto de estar no banco ou fora dos convocados." Os adversários é que devem gostar. A páginas tantas, Ronaldo confidencia o que já ouviu de jogadores de outros clubes. "Não faças mais dribles que já estás a ganhar por seis", pediu-lhe um jogador do Roma nos quartos da Champions; alguns laterais-direitos quase suplicam que vá jogar para o lado oposto.
Cristiano Ronaldo parece ter os pés assentes na relva, perdão, na terra: "Cheguei a Manchester com 18 anos e a partir daí foi sempre a melhorar. Digo com orgulho mas sem vaidade: a minha evolução é inegável." Do United para a selecção portuguesa vai apenas um passo - até às lágrimas na final do Euro 2004. "Nunca imaginei que perderíamos aquela taça. Senti-me à toa. Só queria estar sozinho". Outro passo até à Alemanha, em 2006. "Não fiz um Campeonato do Mundo excelente, tenho noção disso, mas retirei da minha participação muitas e boas ilações." Não diz quais.
Vinte e dois anos, dois clubes profissionais, a selecção nacional e três treinadores no currículo. Há palavras para cada um deles em Momentos. Sobre Bolöni estamos conversados. Alex Ferguson, técnico do Manchester: "Assinei pelo United por causa dele". Está tudo dito. Luiz Felipe Scolari, seleccionador nacional: "Somos verdadeiramente amigos (...) Nunca esquecerei a conversa que teve comigo quando o meu pai morreu. Chorámos os dois."
Ladies and gentlemen, eis Cristiano Ronaldo visto pelos olhos de Manuela Brandão. "É uma pessoa simples, muito acessível, muito brincalhona, muito humilde e acima de tudo muito profissional." Ela já o conhecia bem mas com Momentos passou a conhecê-lo "bem melhor". "Conheci melhor o lado humano do Cristiano Ronaldo e conheci-lhe outra faceta: a ausência de vedetismo que uma estrela da dimensão dele poderia ter."

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