Ofertas de escola para contratados com critérios ilegais

Alerta é da Provedoria de Justiça. Professores chegam a ser escolhidos pela "ordem alfabética do nome próprio"

Formalmente, trata-se apenas de um "alerta", mas os termos utilizados pela Provedoria da Justiça (PJ) em relação à escolha dos professores contratados pelas direcções das escolas são duros. Em ofício enviado ao Ministério da Educação e Ciência (MEC), a provedoria defende a necessidade de "pôr cobro às práticas ilegais em matéria de contratação de escola" e sublinha que, nalguns casos, aquelas se traduzem na "violação de princípios estruturantes da actividade administrativa" e na "ofensa de direitos fundamentais".

O problema não é novo: desde 2007 que alimenta denúncias nos blogues de Educação, bem como os protestos dos sindicatos. Em causa está o facto de, nas "ofertas de escola" para professores contratados, nem todas direcções de escola fixarem "critérios de selecção objectivos", como é sua competência, frisa a PJ.

No ofício em que aponta inúmeros exemplos de irregularidades e indica o nome das escolas em que estas foram detectadas, a provedora adjunta, Helena Vera-Cruz Pinto, não se limita a perguntar quais as medidas que o MEC se propõe tomar para "repor a legalidade violada" e "evitar a repetição de situações semelhantes". Avisa, ainda, que "contemporizar" com as ilegalidades "aumenta seriamente o risco de afeiçoamento" dos procedimentos do concurso "a candidatos previamente determinados".

Casos caricatos

Alguns dos casos foram denunciados pela Federação Nacional de Professores (Fenprof), quando pediu a intervenção da Provedoria de Justiça em relação às "ofertas de escola", o meio de contratação de professores após 31 de Dezembro e, antes dessa data, sempre que se verifica a recusa de um horário distribuído através da Bolsa de Recrutamento.

Há casos caricatos, como aqueles em que se apontam como factores de desempate "a ordem alfabética do nome próprio" ou "a menor distância da residência à escola". Mas a PJ dá especial relevância àqueles que, na sua perspectiva, resultam na "subversão total da regra do concurso". É o caso, aponta, da inclusão, entre os critérios, do "parecer favorável" da direcção da escola, que, segundo a provedora-adjunta, transforma "o procedimento concursal naquilo a que este, por definição, se opõe: a escolha arbitrária do órgão decisor". Acontece o mesmo com a entrevista, que, "sem prévia vinculação a parâmetros objectivos", "equivale a uma escolha discricionária do órgão decisor".

Os actos "que determinem, por escolha arbitrária, os docentes a contratar não só infringem a imposição legal de que a contratação deve obedecer a um procedimento de selecção como infringem o conteúdo essencial de um direito fundamental - o direito de acesso a funções públicas em condições de igualdade", sublinha a provedora adjunta.

Noutro grupo de critérios reunidos pela PJ estão aqueles que "restringem, de modo arbitrário, o universo de candidatos" e "condicionam o acesso ao posto de trabalho". Exemplos: ter prestado serviço docente, no ano anterior, numa determinada turma de uma certa escola do mesmo agrupamento; ou, no caso de uma vaga para o ensino de Português, ter "formação na área do desenvolvimento de competências básicas em Tecnologias da Informação e Comunicação e na área das construções e apresentações electrónicas em PowerPoint".

Questionado pelo PÚBLICO, o MEC comentou o alerta da PJ referindo que "o processo decorre desde 2007" e que "as escolas têm vindo a percorrer um caminho de amadurecimento e de melhoria na qualidade do seu trabalho nesta matéria". Através do gabinete de imprensa, acrescenta que tem estado "atento ao desenrolar do processo e alerta as escolas sempre que haja algum indício de irregularidade".

Para Mário Nogueira, da Fenprof, não chega: é necessário que "haja sanções para quem cometeu as ilegalidades e medidas que evitem que elas sejam praticadas". Os representantes das duas associações de directores escolares no país, Manuel Pereira e Adalmiro Fonseca, consideram os casos "graves", mas "pontuais".

O MEC não revelou quantas ofertas de escola foram feitas desde o início do ano lectivo. Mário Nogueira disse desconhecer o número, mas acrescentou ter reunido "mais de cem exemplos de ofertas com irregularidades".

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