A lição do futebol

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Um título deste jornal - "As bandeiras não estão nas janelas, mas sábado tudo pode mudar" - lembra a Portugal os tempos da inocência, quando o PIB ainda não tinha começado a descer para o poço onde nos meteram, José Sócrates não passava de um anónimo sem importância e sem futuro e nada impedia o prof. Marcelo Rebelo de Sousa de promover campanhas patrióticas na televisão. De resto, nessa altura pouca gente sabia dos milhões que, num acto de absoluta irresponsabilidade e pura política provinciana, se haviam praticamente deitado fora para satisfazer meia dúzia de cidades com pretensões. Espero que desta vez não apareçam bandeiras e que o país veja a selecção com um pouco de inteligência e melancolia. Não principalmente pelo futebol, mas pelo que o futebol nos diz sobre o nosso destino.

Um ministro qualquer - já não me lembro quem foi - sugeriu um dia destes que os jovens, na absoluta impossibilidade de arranjar emprego, começassem a emigrar. A ideia não é nova (vem do século XVIII) e até muito recentemente Portugal viveu do dinheiro que os portugueses corridos de Portugal lhe mandavam do Brasil, da Venezuela, da França, da Alemanha e da "Europa". Se por acaso as "remessas" diminuíam (ou acabavam), a nossa desgraçada "tirinha" entrava logo numa crise financeira e, a seguir, como calculam, numa crise política. Sucedeu assim em 1864-1870, com a guerra do Brasil com o Paraguai, e mais tarde (em 1888 e 1889), mas com efeitos muito mais profundos, lá e cá, com a queda do Império e o fim definitivo da escravatura. As "remessas" da "Europa" duraram enquanto duraram, sobretudo até Portugal também "aderir" a essa insanidade comum, que largamente retirava o objecto ao exercício.

Em 2012, o nosso futebol vive como os portugueses viveram sempre e, nessa medida, não deixa de ser um extraordinário emblema da época. Claro que já não exportamos camponeses do Minho a morrer de fome, exportamos Ronaldo e umas dezenas de outros, que os clubes daqui não podem contratar ou pagar - e que, de resto, sem esse negócio não se aguentavam. O campeonato serve para "afinar" o produto indígena e estrangeiro (da América Latina, por exemplo) e, quando ele se torna lucrativo, para o vender para o mercado internacional. Exportar é a saída, anunciam por aí. Apetece perguntar: pessoas como de costume?

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