Medo e "caça" aos adversários políticos na Guiné-Bissau

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Governo diz que manda nas Forças Armadas e nega responsabilidade AFP

Opositores sequestrados e espancados. Governo instaurado após golpe de Abril diz que é "totalmente alheio" e condena

Clima de medo, protagonizado por indivíduos afectos às Forças Armadas, "caça aos adversários políticos". É assim que a Liga Guineense dos Direitos Humanos descreve a situação em Bissau, onde pelo menos dois opositores do golpe de Estado de Abril foram sequestrados e espancados brutalmente.

Iancuba Indjai, dirigente da Frenagolpe, plataforma que agrupa organizações que se opõem ao poder militar, raptado a meio do dia de segunda-feira, junto à sede do Partido Africano da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), foi abandonado "muito maltratado" ainda nesse dia, numa mata, na estrada para Cantchungo, disse ao PÚBLICO a filha, Guie Aissatu Indjai. O também líder do Partido da Solidariedade e Trabalho estava ontem "em local seguro, sob cuidados médicos".

Silvestre Alves, líder do Movimento Democrático Guineense, sequestrado a meio da tarde de segunda-feira à porta do seu escritório de advogado, no centro de Bissau, foi encontrado horas depois nos arredores, na estrada que leva a Quinhamel. Terá sido vítima de grande brutalidade. Um jornalista da agência AFP que o viu no hospital confirmou que tem múltiplas fracturas nas pernas.

Os sequestros e espancamento de Iancuba Indjai e Silvestre Alves fazem parte da vaga de perseguições a adversários, desencadeada após o ataque a uma base aérea perto de Bissau, no domingo, alegadamente chefiado por um capitão, Pansau N" Tchama, e que fez seis ou sete mortos, consoante as versões.

Na segunda-feira, a sede do PAIGC foi, de acordo com vários testemunhos, invadida duas vezes por militares, num dos casos à civil, à procura de opositores. No mesmo dia terá sido detido um ex-comissário da polícia, Bitchofla Na Fafé, considerado próximo do primeiro-ministro Gomes Júnior, afastado pelos militares há seis meses. A AFP noticiou "várias detenções".

A Liga dos Direitos Humanos responsabilizou ontem as autoridades de transição "pelas atrocidades" e lamentou a ineficácia da ECOMID, força de estabilização da CEDEAO (Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental) no país. O ministro da Presidência, Fernando Vaz, condenou, numa conferência de imprensa, em Bissau, as "detenções ilegais" de Silvestre Alves e Iancuba Indjai e disse que o executivo instaurado após o golpe de Abril é "totalmente alheio" aos actos de "brutalidade física" de que foram vítimas. "O Governo tem controlo sobre as Forças Armadas" e os chefias militares "não têm conhecimento desses actos", disse aos jornalistas.

A acção militar de domingo foi considerada pelo Governo de transição uma tentativa de contragolpe apoiada por Portugal e pela Comunidade dos Países de Língua Portuguesa para fazer regressar Gomes Júnior. Críticos do regime e observadores da política guineense consideram ter-se tratado de uma encenação para justificar o silenciamento de opositores.

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