Sucesso de agência de comunicação que trabalha para o Governo intriga concorrentes

F5C foi criada há um ano e é liderada por João Tocha, "amigo" de vários ministros socialistas e do assessor de imprensa de José Sócrates

O protagonismo ganho junto do Governo por uma pequena agência de comunicação, criada no final do ano passado, está a intrigar as agências de comunicação numa altura em que aceleram os anúncios, os lançamentos e as cerimónias promovidos pelo executivo e aumenta a guerra pelos contratos associados a eventos institucionais. Quadros dessas agências, que se recusam a ser identificados, suspeitam de favorecimento por parte do Governo.

Em causa está o facto de a First Five Consulting (F5C), que apenas surgiu em Setembro de 2007, ter passado desde logo a estar associada à organização de vários eventos públicos do Governo que contaram com a presença de José Sócrates e de vários ministros. Neste momento, segundo fontes de várias agências concorrentes, esta agência está já a rivalizar com as maiores e mais antigas empresas do sector, nomeadamente na área de influência do Ministério dos Transportes e das Obras Públicas. A F5C conta apenas com oito funcionários, não faz qualquer tipo de publicidade - e não tem sequer site na Internet.

Desconhecida até há pouco tempo da maioria das empresas da área da comunicação e publicidade, a sua presença no sector começou por ser detectada através do aparecimento em eventos governamentais de João Tocha, um experiente e conhecido especialista na área da comunicação, com longa colaboração com o PS e com elementos ligados ao Governo.

No entanto, no meio ninguém conhece os donos formais da nova empresa, registada como sociedade anónima.

Ao consultar o registo comercial da agência, apenas se apura que tem um administrador único, o advogado José Abreu Rodrigues, sócio do mesmo escritório de António Ramos Preto, deputado do PS. E que o mesmo José Abreu Rodrigues é também um dos seus cinco sócios, de longe o maior: dos 50.000 euros de capital social, Abreu Rodrigues subscreveu 49.980. A empresa teve ainda outros quatro sócios fundadores, todos com a participação simbólica de uma acção (cinco euros).

Contactado pelo PÚBLICO, João Tocha, que se apresenta como director para a área da comunicação, recusou explicar como esta foi formada e disse não conhecer os sócios, para além de José Abreu Rodrigues: "Não faço a mínima ideia de quem são", disse.

As vendas líquidas declaradas pela F5C ao fisco, em 2007, obtidas durante os primeiros três meses de funcionamento, foram de 197.097 euros, lamentando que estejam a "marrar" com ele quando há outros a "comer à grande".

De resto, acrescentou, tem trabalhado para vários partidos e forças políticas, dando como exemplos disso as colaborações que manteve com dois dirigentes do PSD: Hermínio Loureiro, presidente da Liga de Clubes, e Fernando Ruas, da Associação Nacional de Municípios Portugueses. "Quando os outros o fizerem, eu também ponho a minha carteira de clientes em cima da mesa", afirmou, referindo-se depois às duas outras agências que mais proximidade tinham com o Governo PS quando a F5C foi criada: "Já lá andavam a LPM e a Unimagem". À frente da Unimagem está Miguel Almeida Fernandes, ex-chefe de gabinete de Jaime Gama, quando este era ministro dos Negócios Estrangeiros.

Muitos contactos no PS
Desde então, o trabalho de João Tocha para o Governo tem passado pela produção de eventos para ministérios como os das Obras Públicas, Ambiente e Saúde, mas não só. Ainda em 2007, após declarações polémicas do ministro da Economia, durante a viagem oficial de José Sócrates à China, João Tocha foi chamado a ajudar Manuel Pinho.

Instado a comentar essa ligação, na altura, Tocha disse que havia sido apenas uma "troca de opiniões" entre "amigos". Já no início do ano, essa "troca de opiniões" estender-se-ia a outros ministros, como o semanário Sol noticiaria em Abril. Primeiro foi Correia de Campos, em Janeiro, depois Ana Jorge, que lhe sucedeu, e também Nunes Correia, ministro do Ambiente.

Ao PÚBLICO, João Tocha disse ser "amigo e conhecido" das pessoas em causa e não ter culpa de ter "muitos contactos", nomeadamente no PS. Já os gabinetes dos ministros das Obras Públicas, do Ambiente e da Saúde negaram ter qualquer relação "contratual" ou "laboral" com a F5C, não respondendo contudo sobre a existência de outro tipo de colaboração com João Tocha ou com a empresa Tocha Global Communication, que tem como único empregado Tocha.

Correia de Campos, contactado pelo PÚBLICO, admitiu ter "recorrido" a João Tocha, mas durante pouco mais de uma semana e numa altura em que "já não havia condições" para salvar a sua imagem pública. Sobre a relação contratual nesse período o ex-ministro disse nada saber.


João Tocha, o homem-telemóvel
 

Pouca gente terá ouvido falar de João Tocha, mas entre os poucos que sabem quem ele é está muita gente próxima do poder político e empresarial do país. Residente na Quinta da Beloura, apreciador de grandes carros, este influente consultor tem tido um percurso heterodoxo.

Do que é público, sabe-se que pertenceu à direcção da JS com António José Seguro, que editou o jornal universitário Universus, que criou uma empresa na área da arquitectura e da construção civil, a Primeira, depois a Jardim e Arte, no sector dos espaços verdes, e por fim, em 2003, a Tocha Global Communication. Antes, a sua entrada no mundo da comunicação sucedeu na Emirec, nos anos 90.

Num currículo disponibilizado em 2004, Tocha assumia-se como "consultor" do Presidente Eduardo dos Santos, de "forças políticas em África", do presidente do Governo Regional dos Açores (para o qual fez, aliás, a campanha das eleições regionais), de "diversos ministérios do Governo português" e coordenador de "diversas" campanhas autárquicas em Portugal.

Mais recentemente, desde 2004, trabalhou para a LPM, onde assumiu o departamento de comunicação regional e local, através do qual coordenou várias campanhas autárquicas por todo o país. Forçado a sair pelo próprio Luís Paixão Martins, João Tocha ingressou depois, já em 2006, na agência rival de António da Cunha Vaz. A experiência seria contudo curta. Já em Setembro de 2007, cerca de dois anos das legislativas de 2009, aparecia como a cara da F5C.

Actualmente, nem os seus concorrentes o desmerecem. "É alguém que almoça e janta com 30 mil pessoas e depois, quando tem de cobrar, cobra", define um ex-colega. "Está sempre ao telemóvel, às vezes punha um funcionário a conduzir-lhe o carro, só para poder ir a falar ao telemóvel", refere.
2003

Depois de passar pela Emirec, João Tocha funda neste ano a Tocha Global Communication. Mas não faltou muito para que a sua rede de clientes saltasse para fora de Portugal. Em 2004, era já consultor do Presidente de Angola.

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