"The Gates", nova obra de Christo, enche Central Park

Às 8h30, 600 "voluntários" começaram a libertar as telas suspensas nos 7500 "portões" ao longo de 40 km. O parque ficará assim até 27 de Fevereiro

Rita Siza, Nova Iorque

- Quando vão distribuir as amostras de tecido?Às 11h de ontem, Doug já nem se lembrava quantas vezes tinha respondido à mesma pergunta.
- Só quando estiverem desembrulhados todos os portões. Não deve demorar muito... Há um milhão de amostras, não se preocupe: não estão aqui um milhão de pessoas, diz Doug diplomaticamente.
Mas ontem pela manhã, o Central Park de Nova Iorque estava absolutamente repleto de pessoas, que não quiseram perder os primeiros momentos da imensa obra ao ar livre "The Gates", dos artistas Christo e Jeanne-Claude. As equipas de voluntários, de coletes cinzentos e laranja, arrastavam atrás de si pequenos grupos de curiosos à medida que iam avançando de portão em portão. Com um gancho metálico agarravam uma pega de plástico, que fazia correr um fecho de velcro. Em segundos, o tecido, cor de laranja a fugir para o açafrão desenrolava-se de um tubo de papel, que caía ao chão com estrondo. E a assistência aplaudia.
John Allen sentia-se uma estrela de cinema. "Não consigo imaginar quantas vezes já fui fotografado hoje", ria-se. Às 11h10 a sua equipa desenrolava o último portão. Ao todo, fizeram descer o pano em 100 pórticos, entre o ringue de patinagem e o centro de visitantes do parque. No último, esperava-o uma surpresa: um grupo de amigos que aplaudia, incitava, fotografava e festejava. "Isto é incrível! Obrigada."
"Transformaste o Central Park na Terra do Nunca! Isto é magia!", disse um amigo. John remete os créditos para a dupla de artistas. "Eles é que criaram tudo isto. Eu só fico feliz por terem demorado 25 anos para conseguir a licença. Assim pude fazer parte da experiência!"
Há uma semana que está no parque a trabalhar na montagem da gigantesca instalação. Engenheiro, deixou o escritório para se tornar um "voluntário" - "Bem, Christo e Jeanne-Claude não aceitam trabalho voluntário, recebi o ordenado mínimo", esclarece. "A nossa equipa montou 154 portões." Levantar a estrutura, composta de tubos de vinil, demorava cerca de dez minutos. "Isto está mesmo bem pensado. É incrivelmente simples."
Tiram uma fotografia: "Daqui a 15 dias tudo isto terá desaparecido", diz. Sentir-se-á triste? "Acho que não. Ficarei triste pelas pessoas que não puderam viver esta experiência."
Paulette e Daniel passeiam-se pela segunda vez no meio de uma obra de Christo. São franceses e estão de férias em Nova Iorque, por coincidência na mesma altura em que "The Gates" "abriu". Daniel lembra a emoção que sentiu quando se passeou pela "Pont Neuf" em Paris, quando Christo embrulhou a ponte em tecido. "Para mim, o mais significativo nestes projectos é a emoção que transmitem. É difícil de explicar, uma energia...", diz Paulette.

Obra que gera "alegria"Os nova-iorquinos sentem a mesma dificuldade. "Já perguntei a vários voluntários o que é que este trabalho representa, qual é o sentido de tudo isto", diz Ellen, uma vizinha do Central Park, na Rua 66. "Todos me respondem que é o que eu quiser. Não há uma interpretação para tudo isto." Para si, "é uma celebração". "Encaro isto como uma celebração da natureza, da vida, da beleza e do amor", enumera. "Isto porque andar por aqui transmite sentimentos positivos, de alegria. Repare como as pessoas estão encantadas, a sorrir, a festejar."
As estruturas laranja, alinhadas simetricamente ao longo dos caminhos do parque, formam uma linha gigantesca. O tecido voa com o vento, muda de cor com os raios de sol, revela as sombras dos ramos das árvores. "Esse é o efeito que gosto mais, as sombras", garante Joyce, uma estudante universitária. Lynne prefere quando as bandeiras levantam com o vento. "É tão orgânico. Parece que ganha vida, como se fosse um animal." De máquina de filmar em punho, registam todos os momentos. "Passamos toda a semana entusiasmadas à espera disto", conta Joyce.
Nova Iorque está numa excitação com a sua obra de arte. Só Judy reclamava com a multidão. "O que deu a esta gente?", perguntava, desmontando da bicicleta depois de ter esbarrado com um grupo que admirava os portões. "Têm tantos dias para ver isto... não precisavam de vir todos hoje!".

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