O tecno de Mills no cinema mudo de Keaton

Buster Keaton realizou e é actor principal de Three Ages, filme mudo de 1926. Quase oitenta anos depois o pioneiro do tecno, Jeff Mills, resolveu musicá-lo. É exibido hoje, em Lisboa, com a presença do americano

São duas figuras consensuais. Quando se fala de cinema mudo do princípio do século (e de cinema em geral) é impossível passar ao lado do realizador e actor americano Buster Keaton. Quando o assunto é a música de dança electrónica o nome do músico e DJ americano Jeff Mills também é referência. Figuras de tempos diferentes, poderão parecer anacrónicos lado a lado, mas a justaposição da electrónica minimalista de Mills parece iluminar ainda mais a qualidade intemporal de Three Ages, filme de Keaton de 1926. O filme, com banda-sonora de Mills, vai ser exibido hoje, em Lisboa, no Auditório Fórum Picoas (19h), 4ª na Antiga Fábrica da Cerveja em Faro (19h), e 6ª no Passos Manuel do Porto (19h). Jeff Mills vai estar presente na sessão de hoje, em Lisboa.
Para a realização de Three Ages, o realizador americano inspirou-se em Intolerance, filme de 1916 de D.W. Griffith. O guião é uma paródia a esse clássico, com Keaton a criar uma sucessão de papéis para a figura de um amante que luta por alcançar o objecto do seu amor em épocas diferentes.
Pioneiro da música tecno dançável nos anos 80, a partir da cidade de Detroit, Jeff Mills tem-se afirmado ao longo dos anos como um dos DJs mais requisitados para sessões em todo o mundo. Mas a sua actividade não se resume à animação de pistas de dança. Quando assume o papel de músico e produtor, a sua electrónica ganha contornos mais abstractos. Não surpreende por isso que tenha composto a música para Metropolis (1927) de Fritz Lang ou colaborado na banda-sonora do filme francês Vendredi Soir, realizado por Claire Denis em 2002.
Compor música para o filme de Keaton foi uma experiência diferente. "É um filme com humor e com três fases diferentes", o que, segundo Mills, lhe criou dificuldades. "Na período da "idade da pedra" a música é mais primitiva, de arranjos simples. No período romano, optei por sons mais agressivos e na fase que pretende retratar o presente, compus sequências mais sofisticadas e com maior complexidade ao nível dos arranjos." Como acontece quase sempre neste tipo de experiências existiu quem não a aprovasse, mas Mills tem uma visão descomplexada sobre o assunto: "quando se faz música para um filme existe a hipótese de o transformar um pouco, mas aplicar electrónica a um clássico não o diminui, nem o transforma em qualquer coisa que ele não é. Quando envelhecemos, tomamos consciência de que as coisas evoluem em ciclos. Este trabalho é apenas uma forma de introduzir dois olhares de eras diferentes."
A banda sonora, evoluindo de ambientes electrónicos de contornos jazzísticos para minimalismos tecno, está agora também disponível no mercado português em formato CD + DVD. A exibição de Three Ages faz parte das actividades nacionais da Red Bull Music Academy, um evento anual em forma de laboratório que reúne músicos, produtores e DJ de todo o mundo, previamente seleccionados. A edição deste ano decorre em Seattle, EUA, entre 6 de Novembro e 9 de Dezembro. Os portugueses interessados em participar deverão preencher um questionário (disponível em www.redbullmusicacademy.com) e enviar uma "demo", com cerca de 30 minutos, até ao dia 3 de Junho.

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