Torne-se perito

Fim do "feriado" de Carnaval desencadeia chuva de críticas

Foto
Programas já estavam fechados quando Governo anunciou decisão MANUEL ROBERTO

Ex-conselheiro de Estado António Capucho qualifica decisão como "um disparate". Alguns municípios mantêm tolerância de ponto

O social-democrata e antigo conselheiro de Estado, António Capucho, considerou ontem um "erro crasso" a decisão do Governo de não atribuir tolerância de ponto na terça-feira de Carnaval. "É um erro crasso", afirmou António Capucho, juntando a sua voz à saraivada de críticas à decisão do primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, para quem "ninguém perceberia" a manutenção da tolerância de ponto numa altura em que o Governo se propõe acabar com vários feriados.

Para António Capucho, porém, a decisão de acabar com a tolerância de ponto - repetindo uma tentativa malograda há 19 anos por iniciativa do então primeiro-ministro, Cavaco Silva - é "disparatada". "Os nossos governantes também têm de ter a noção que, depois de cortarem quatro feriados, impedirem que as pessoas tenham um dia por ano para manifestarem a sua alegria, a sua descontracção, é disparatado. Sinceramente, acho disparatado", criticou o também ex-presidente da Câmara Municipal de Cascais, sustentando que a não atribuição de tolerância de ponto, anunciada na sexta-feira, "vai diminuir o número de presenças e de participação pública" nos festejos de Carnaval, o que terá "graves prejuízos para as economias locais".

As críticas de Capucho reforçam igual contestação protagonizada por diversos autarcas e responsáveis políticos, com o PCP e a CGTP à cabeça. Para os comunistas, trata-se de "acrescentar mais um dia de trabalho forçado e não pago aos trabalhadores", como adiantou Paulo Raimundo, da comissão política do comité central comunista. Ana Avoila, da Frente Comum, também já tinha reagido em jeito de aviso: "Este Governo pensa que é imune a tudo, que pode calcar e fazer tudo o que quiser com a administração pública, e não é assim. Os trabalhadores saberão dar uma resposta adequada". Do lado dos municípios com tradições carnavalescas, o impacto económico da medida, numa altura em que os programas dos festejos estão fechados e os compromissos financeiros assumidos, é o argumento em que se funda a decisão de manter a tolerância de ponto para os seus funcionários. É o caso de Ovar, cujo presidente da câmara, Manuel Oliveira, qualifica a medida do Governo como "desajustada" e "inoportuna", por surgir numa altura em que "todo o investimento está feito". Dizendo-se preocupado com o efeito negativo no comércio, na hotelaria, na restauração e no turismo, o autarca lembra que "o Carnaval é uma vivência de toda a comunidade, não só dos funcionários da câmara", para criticar o que considera ser "a "obsessão deste Governo com estas questões pontuais, de feriados, tolerâncias de ponto...".

O presidente da Fundação do Carnaval de Ovar, José Américo, garante que o programa do Carnaval, que implicou um investimento da ordem dos 450 mil euros, manter-se-á. "É impossível parar esta máquina". Os contratos não serão quebrados, mas o responsável teme que a decisão do Governo não signifique o habitual retorno de cinco milhões de euros. "O primeiro-ministro revela desconhecimento da realidade do país e que é um mau gestor porque o Carnaval de Ovar, como todos os outros do país, reactiva a economia local, regional e nacional". Há cerca de um mês, José Américo telefonou para o gabinete de Passos Coelho para saber se a tolerância de ponto se mantinha e insistiu com um email. "A resposta chegou ontem [anteontem] via televisão", conta.

Tal como Ovar, Torres Vedras está preocupado com os prejuízos financeiros. Manterá a tolerância de ponto na segunda e na terça-feira de Carnaval e não abrirá ao trânsito as ruas do corso, condicionando assim o acesso ao Tribunal do Trabalho e ao centro de emprego. "O Carnaval vai sair à rua nem que chova picaretas", reagiu Carlos Miguel, o autarca socialista de Torres Vedras. No dia 18, os cabeçudos e matrafonas manifestam-se em frente à residência oficial de Passos Coelho. "Vamos entregar ao senhor primeiro-ministro um monumento fúnebre por não haver tolerância de ponto", adiantou Carlos Miguel.

O Carnaval de Buarcos, na Figueira da Foz, retira do programa o desfile de terça-feira e mantém apenas o de domingo.

Mais a sul, o presidente da Câmara de Loulé, o social-democrata Seruca Emídio, discorda da retirada da tolerância de ponto e defende uma maior flexibilidade do Governo para os concelhos onde o Carnaval tem tradição. O autarca também está preocupado com o impacto negativo na hotelaria, restauração e comércio tradicional. *com Lusa

Sugerir correcção