Funcionário da ONU morto perto de Rafah quando veículo foi atingido por tiros

Israel diz que a análise preliminar indica que veículo da ONU foi atingido numa zona de combates. Colonos israelitas bloquearam e atacaram camiões com ajuda humanitária para Gaza.

Membros da ONU e do Crescente Vermelho ajudam uma pessoa ferida num ataque israelita
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Membros da ONU e do Crescente Vermelho ajudam uma pessoa ferida num ataque israelita MOHAMMED SABER / LUSA
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Dois camiões de ajuda humanitária danificados MUSSA ISSA QAWASMA / REUTERS
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No mesmo dia em que a Human Rights Watch (HRW) denunciou que as Forças de Defesa de Israel (IDF) levaram a cabo, pelo menos, oito ataques deliberados contra organizações humanitárias na Faixa de Gaza, as Nações Unidas noticiaram que um funcionário da organização foi morto e outro ficou ferido quando o veículo da ONU em que seguiam a caminho de um hospital no Sul de Gaza foi atacado.

As Nações Unidas não dizem quem foram os responsáveis pelo ataque ao veículo, atingido perto de Rafah. Os militares israelitas afirmam que, de acordo com uma investigação preliminar, o carro foi atingido numa zona de combates. A BBC, que adiantou a notícia, refere que as imagens que circulam nas redes sociais, e que puderam ser confirmadas, mostram um veículo da ONU com vários buracos de bala no exterior do Hospital Europeu.

As IDF confirmam ter recebido um relatório do Departamento de Protecção e Segurança da ONU dando conta de dois dos seus funcionários feridos na área de Rafah na segunda-feira e que estava a analisar o caso.

A confirmar-se a responsabilidade dos militares israelitas, não é a primeira vez que as IDF atacam e matam pessoas ligadas a agências ou organizações humanitárias em Gaza. De acordo com a HRW, desde que as IDF iniciaram a sua contra-ofensiva em Gaza depois do ataque do Hamas contra Israel a 7 de Outubro de 2023, houve pelo menos oito ataques do género e em todos eles as organizações tinham enviado as coordenadas das suas equipas para garantir a sua protecção. E em nenhum momento as forças israelitas advertiram as organizações de que podiam ser atacadas.

Estes oito ataques redundaram em 31 vítimas, entre mortos e feridos. As Nações Unidas colocam a cifra de trabalhadores humanitários mortos por Israel desde 7 de Outubro em Gaza nos 250.

“Os aliados de Israel devem reconhecer que estes ataques que mataram trabalhadores humanitários aconteceram uma e outra vez e devem parar”, afirmou Belkie Willie, directora associada de crises, conflitos e armas da HRW, citada pela Europa Press.

Para a ONG, o que estes incidentes revelam é que o sistema destinado a proteger os trabalhadores humanitários que fazem o seu trabalho numa zona de conflito falhou redondamente.

Como lembrou Belkie Willie, o ataque israelita contra o comboio humanitário da World Central Kitchen, em Abril, não foi um “erro” porque as IDF tinham as informações e, mesmo assim, atacaram, sem aviso prévio.

Com os trabalhadores humanitários cercados na Faixa de Gaza, depois do encerramento da fronteira de Rafah por Israel, que assumiu o controlo do lado palestiniano do passo fronteiriço, os trabalhadores humanitários temem que a longa lista de vítimas entre eles continue a aumentar agora que Israel parece mesmo querer atacar a cidade de Rafah.

Para a HRW, os ataques de Israel contra as organizações e os trabalhadores humanitários mostram a incapacidade ou a falta de vontade israelita para agir de acordo com o direito internacional humanitário. Daí que tenha pedido aos aliados de Israel, aos Estados Unidos e ao Reino Unido, que deixem de fornecer armas a um país que vem cometendo atentados sistemáticos contra as leis internacionais “com impunidade”.

A HRW pediu a um grupo de especialistas internacionais de nomeada que levem a cabo uma investigação independente aos oito ataques contra membros de organizações humanitárias, solicitando às autoridades israelitas que permitam o acesso total aos investigadores durante a investigação.

Ajuda humanitária atacada

Também na segunda-feira, camiões que se dirigiam a Gaza carregados de alimentos foram atacados por colonos israelitas na Cisjordânia.

Os vídeos que circulam nas redes sociais mostram um grupo de homens a bloquear a passagem dos veículos e a atirar sacos de açúcar, farinha e arroz para a estrada. Os pacotes são depois pisados e inutilizados, deixando os alimentos espalhados pelo chão.

O ataque aconteceu no checkpoint de Tarqumiya, que separa a Cisjordânia de território israelita, e envolveu pelo menos sete camiões que tinham sido enviados pela Jordânia. A imprensa israelita diz que foram detidas quatro pessoas, mas que, depois de a polícia se ter ido embora, outras regressaram ao local e pegaram fogo a dois camiões.

“É um verdadeiro escândalo”, comentou Jake Sullivan, conselheiro de segurança nacional da Casa Branca, considerando que este “é um comportamento total e absolutamente inaceitável”. Os Estados Unidos, acrescentou Sullivan, vão “analisar as ferramentas” adequadas para reagir a esta situação.

Um porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros do Qatar, que tem estado envolvido nos esforços com vista a um cessar-fogo, disse já nesta terça-feira que não entra qualquer ajuda humanitária em Gaza desde a quinta-feira passada, 9 de Maio, pouco depois de as IDF terem entrado em Rafah e tomado o controlo do posto fronteiriço com o Egipto.

Foram já várias as ocasiões em que a ajuda humanitária destinada a Gaza foi bloqueada e atacada por colonos israelitas. Um grupo chamado Tzav 9, que o Haaretz diz ser composto por activistas de extrema-direita, reivindicou estas acções, defendendo que nenhuma ajuda deve entrar na Faixa enquanto houver reféns israelitas do Hamas.

“É uma insanidade que, num dia em que lembramos os nossos mortos [13 de Maio é dia de homenagem aos mortos em combate e vítimas de terrorismo em Israel], assassinados por terroristas, o Estado de Israel continue a arranjar todas as formas de enviar ajuda para esses mesmos terroristas”, declarou o grupo, em comunicado, citado pelo Times of Israel.

Em ocasiões anteriores, as Forças Armadas israelitas intervieram para impedir os bloqueios e permitir a passagem dos camiões, mas desta vez a segurança foi deixada à responsabilidade da polícia, segundo a qual deviam ter sido as IDF a estar no terreno.

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