Investidores pressionam Inditex, proprietária da Zara, a publicar cadeia de abastecimento completa

A Inditex é um caso isolado entre os grandes retalhistas de vestuário, pois não publica a lista das fábricas onde se abastece. Entidades reguladoras e investidores querem maior transparência.

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A Inditex publica anualmente o número de fornecedores em 12 países principais, mas não fornece informações sobre as fábricas individuais Reuters/Borja Suarez

Os investidores querem que a Inditex, proprietária da Zara, siga o exemplo das rivais H&M e Primark, tornando pública a sua lista completa de fornecedores, para poderem avaliar melhor os riscos da cadeia de abastecimento.

Os retalhistas de vestuário, em particular, estão sob pressão para provar que não há trabalho forçado nas suas cadeias de abastecimento e que os trabalhadores do sector do vestuário recebem salários decentes.

O grupo de moda chinês Shein foi objecto de escrutínio por parte dos legisladores norte-americanos relativamente aos riscos da cadeia de abastecimento, antes de planear uma cotação nos EUA.

Na União Europeia, os desacordos bloquearam as regras propostas que exigiriam que todas as grandes empresas revelassem se as cadeias de abastecimento prejudicam o ambiente ou utilizam trabalho infantil. As sanções propostas em caso de incumprimento poderiam incluir coimas de 5% das receitas.

Algumas marcas e retalhistas de moda, incluindo a Adidas, a H&M, a Hugo Boss, a M&S, a Nike, a Primark e a Puma, já publicam listas detalhadas de fornecedores, incluindo nomes e endereços de fábricas.

A Inditex publica anualmente o número de fornecedores em 12 países principais, mas não fornece informações sobre as fábricas individuais.

A Reuters perguntou aos accionistas da Inditex o que queriam ver da empresa em termos de melhor divulgação. Em resposta, o gestor de activos holandês MN afirmou: “No nosso compromisso com a Inditex, uma das coisas que pedimos é que divulguem uma lista dos seus fornecedores e a sua localização geográfica.”

“Embora a Inditex nos garanta que tem estes dados disponíveis, até agora não está disposta a divulgar esta informação, ao contrário de alguns dos seus pares do sector que publicam listas extensas de fornecedores.”

A MN, que gere os activos dos fundos de pensões holandeses, disse que era importante ter esta informação para mostrar se a Inditex tem esta informação disponível, bem como para a sua própria diligência.

A MN lidera o diálogo com a Inditex para a Plataforma Financeira do Salário Digno (PLWF), um grupo de 20 investidores institucionais com activos combinados sob gestão de 6,58 mil milhões de euros, e trabalha para promover um rendimento mais elevado para os trabalhadores da indústria do vestuário e do calçado.

A Inditex, que deverá publicar os resultados anuais a 13 de Março, recusou-se a comentar os pedidos dos investidores para que publique a lista completa dos seus fornecedores.

“A Inditex está profundamente empenhada em manter elevados padrões na sua cadeia de aprovisionamento e acredita que o seu sistema de rastreabilidade, líder na indústria, que nos dá a máxima visibilidade da cadeia de aprovisionamento, é fundamental para isso”, afirmou um porta-voz da empresa.

O fundador da Inditex, Amancio Ortega, detém uma participação de 59% na empresa, com uma fatia de 5% detida pela filha Sandra Ortega. Em conjunto, valem cerca de 69 mil milhões de dólares (63 mil milhões de euros).

Os cinco investidores da Inditex que responderam às perguntas da Reuters detêm uma participação combinada de cerca de dois mil milhões de dólares na empresa (1,8 mil milhões de euros), cuja avaliação actual é de cerca de 140 mil milhões de dólares (perto de 128 mil milhões de euros).

Nenhum dos investidores com quem a Reuters falou está a considerar desinvestir na Inditex.

A MN disse que aconselhou os seus clientes em Dezembro a desinvestir na cadeia de retalho TJX, que detém a Homesense e a TK Maxx, o que aconteceu a partir de 1 de Janeiro. “Ao longo dos mais de três anos de envolvimento, vimos muito poucas melhorias na diligência devida em matéria de direitos humanos na sua cadeia de abastecimento global”, disse a MN à Reuters.

A TJX afirmou que reforçou o seu código de conduta de fornecedores e expandiu o seu programa de auditoria de fábricas nos últimos anos.

Mais transparência

A Inditex tem um acordo com a federação sindical mundial IndustriALL, segundo o qual lhe fornece a lista completa dos seus fornecedores. Mas a IndustriALL quer uma divulgação mais alargada por parte de todas as empresas, incluindo a Inditex, afirmou.

Know The Chain, uma iniciativa de benchmarking para empresas e investidores para lidar com o trabalho forçado nas cadeias de abastecimento, deu à Inditex uma pontuação geral mais baixa na sua avaliação de 2023 do que na sua avaliação de 2021.

“A empresa é incentivada a fortalecer a transparência da sua cadeia de abastecimento, divulgando uma lista completa, e não parcial, de seus fornecedores directos”, disse Know The Chain.

A publicação das suas fábricas poderá aumentar a concorrência dos rivais da Inditex pelos mesmos fornecedores, segundo os investidores.

Swetha Ramachandran, gestora de carteiras da Artemis Investment Management em Londres, quer saber que parte das receitas da Inditex é fabricada em cada um dos diferentes países fornecedores. “Isso ajudar-nos-ia a determinar a resiliência da sua cadeia de abastecimento”, afirmou.

Os números da cadeia de abastecimento publicados pela Inditex desde 2019 mostram que a empresa cortou fornecedores na China e aumentou-os no Bangladesh e em Marrocos. Mas não dá detalhes sobre a quantidade de produtos que compra a esses fornecedores.

Grace Su, gestora de carteiras da Clearbridge Investments, que detém acções da Inditex, disse que pediu mais clareza e divulgação da cadeia de abastecimento. “É muito importante, devido a todo o escrutínio em torno de ESG (Environmental, Social, and Corporate Governance), [ter informação sobre] mão-de-obra e factores de produção. Eles afirmam ser líderes neste domínio, pelo que é realmente importante que tenham esse nível de divulgação.”

A Schroders, accionista da Inditex, acompanha o conhecimento que as empresas têm dos locais de produção e incentiva os retalhistas de vestuário, incluindo a Inditex, a serem transparentes, afirmou Hannah Shoesmith, directora de envolvimento da empresa.

Uma melhor divulgação, entre outros factores ambientais, de sustentabilidade e de governação, poderia influenciar as decisões de investimento, afirmou Marie Payne, responsável pelo investimento responsável da Cardano, accionista da Inditex.

O fundo soberano da Noruega, que detém uma participação de 1,4 mil milhões de dólares (1280 milhões de euros) na Inditex, afirmou que se envolve regularmente com a empresa na gestão de riscos da cadeia de abastecimento, direitos humanos e transparência. Mas recusou-se a dar pormenores sobre essas discussões.

O fundo afirmou que, no que respeita às práticas da cadeia de abastecimento das empresas em geral, “existem desafios contínuos, nomeadamente no que respeita à rastreabilidade e à apresentação de relatórios”.

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