Direitos das mulheres
As mulheres 50 anos depois de Abril
“Ser mulher em liberdade” é o tema da edição de aniversário deste ano do PÚBLICO. Este retrato em números faz parte de uma série de trabalhos com os quais assinalamos os 34 anos do jornal.
As mulheres protagonizaram a maior transformação das últimas décadas, mas a desigualdade persiste. Apesar de estudarem mais e de representarem metade da força de trabalho, andam sobrecarregadas com o trabalho doméstico, ganham menos, ocupam menos lugares de decisão.
Mais mulheres e mais escolarizadas
Tantos anos depois do fim da Guerra Colonial, Portugal continua a concentrar mais mulheres do que homens. Eles até nascem em maior número do que elas, mas vivem, em média, menos tempo e emigram mais (não obstante a diferença de género no fluxo migratório ser cada vez menor). A redução tem início na casa dos 20. Partindo em desvantagem, elas viram na educação e no trabalho uma forma de emancipação. Nas últimas décadas, a taxa de abandono escolar precoce entre as mulheres desceu mais, enquanto a percentagem com curso superior subiu também mais. Em 1960, havia 0,3% com ensino superior; em 2021, 22,4%. Elas têm mais licenciaturas, mais mestrados e mais doutoramentos.
Há mais mulheres do que homens
Em milhões
População analfabeta residente com 10 e mais anos segundo os Censos: total e por sexo
Quantos homens ou mulheres não sabem ler nem escrever?
Taxa de analfabetismo entre as mulheres passou de 31% para 4%
Houve uma inversão no ensino superior:
nas últimas décadas elas passaram a estar em maioria
Número de matriculados
Quantas mulheres há para cada homem
no ensino superior
Trabalhadoras na fábrica de conservas de peixe Conpensul, em Olhão, a 15 de Dezembro de 1988
João Paulo Trindade/Lusa
Trabalhadoras na fábrica de conservas de peixe Conpensul, em Olhão, a 15 de Dezembro de 1988
João Paulo Trindade/Lusa
Metade da força de trabalho, menores salários
Com o desenvolvimento da indústria, a eclosão da Guerra Colonial e o fortíssimo fluxo migratório, no fim da ditadura um número crescente de mulheres encontrou trabalho assalariado. Instaurada a democracia, não se enfiaram em casa. Em Portugal, as mulheres representam metade da força de trabalho. Embora mais escolarizadas, continuam a auferir salários em média mais baixos, o que se repercute nas pensões. Homens e mulheres ainda escolhem diferentes áreas de trabalho, sendo as feminizadas menos valorizadas. E elas têm menos oportunidades de progredir na carreira e de ocupar cargos de chefia, até pela sobrecarga doméstica e familiar.
Há quase tantas mulheres como homens na população activa
População activa Total/H/M
Diferença entre a taxa de actividade de homens e mulheres
Em pontos percentuais
A disparidade salarial entre homens e mulheres persiste
Disparidade no ganho médio mensal H/M entre trabalhadores por conta de outrem
As pensões das mulheres são 43,2% inferiores às dos homens
Valor médio da pensão velhice em Dezembro de cada ano, em euros
Total de pensões
Novas pensões
Nota: as novas pensões são relativas a pensionistas com primeiro processamento no ano, os valores apresentados incluem complementos sociais.
Mulheres recebem pensões mais baixas
A taxa de risco de pobreza é sistematicamente mais alta entre as mulheres
Risco de pobreza após as transferências sociais
Diferença entre a taxa de risco de pobreza entre homens e mulheres
Em pontos percentuais
Famílias na zona ribeirinha de Belém, em Lisboa
Daniel Rocha/PÚBLICO
Famílias na zona ribeirinha de Belém, em Lisboa
Daniel Rocha/PÚBLICO
Em casa, mulheres fazem grande parte das tarefas
A estrutura familiar democratizou-se. Os homens deixaram de ser chefes de família e as mulheres de lhes dever obediência e de ter atribuído o governo doméstico. Homens e mulheres têm legalmente o mesmo poder na família. As pessoas casam-se menos e divorciam-se mais, têm menos filhos, mais tarde e muitas vezes fora do casamento. O uso diário do tempo é ainda desigual. Pouco a pouco, os homens assumem mais tarefas relacionadas com os filhos. As tarefas da casa, porém, continuam a recair sobretudo sobre as mulheres. São elas que, na maior parte das vezes, preparam as refeições, limpam a casa, lavam a roupa. Eles ficam com mais tempo para investir na carreira e para actividades de desporto e lazer.
As famílias mudaram, há menos casamentos e mais divórcios
Mulheres têm menos filhos e mais tarde
Idade média da mãe ao nascimento do primeiro filho
Índice sintético de fecundidade
Proporção de pessoas a viver com companheira/o,
que referiram realizar habitualmente tarefas domésticas e cuidados aos filhos
Mulheres e homens em 2019, em %
Evolução do uso das licenças parentais
Maria de Lourdes Pintasilgo toma posse a 1 de Agosto de 1979 na presença do Presidente da República António Ramalho Eanes. Foi a única mulher que desempenhou o cargo de primeira-ministra em Portugal
João Santos/LUSA
Maria de Lourdes Pintasilgo toma posse a 1 de Agosto de 1979 na presença do Presidente da República António Ramalho Eanes. Foi a única mulher que desempenhou o cargo de primeira-ministra em Portugal
João Santos/LUSA
Quotas impulsionaram presença feminina na política e nas empresas
Só uma mulher liderou um Governo, Maria de Lourdes Pintasilgo. No conjunto de ministros, secretários de Estado e subsecretários de Estado, o país passou de 1,9% de mulheres em 1976 para 37,5% em 2022. O domínio do poder continua muito masculino. O número de mulheres só se tornou mais expressivo nos lugares de decisão por força do estabelecimento de quotas, primeiro, nas listas de candidaturas para a Assembleia da República, para o Parlamento Europeu e para os órgãos electivos das autarquias locais, depois, nos conselhos de administração das empresas públicas e das empresas cotadas em bolsa e no pessoal dirigente e nos órgãos da administração pública.
A presença de mulheres no Parlamento cresceu com as quotas
Deputados eleitos
* O limiar da paridade, de acordo com o Conselho da Europa, é 40%. Há paridade quando pelo menos 40% é de outro género
Em 2022 a paridade não foi atingida por pouco: sete lugares
O país demorou quase cinco décadas
a aproximar-se de um Governo paritário
Nada obriga os governos a cumprir a paridade
de 40%, mas em 2022 ficou-se muito perto
Peso das mulheres nos executivos
A representação feminina nas autarquias ainda fica aquém:
elas são menos de 10% dos presidentes de câmara
Em 2021 foram eleitas 29 mulheres presidentes de câmara, num total de 308 municípios. Dados consultados em Agosto de 2022
Representatividade de mulheres
noutras instâncias de poder e tomada de decisão
Em 2023, em percentagem
Taxa de feminização dos/das representantes dos conselhos de administração das maiores empresas cotadas em bolsa
Em percentagem
Mulheres nos órgãos de administração do sector empresarial local
Em %
Manifestação em Dezembro de 2003 junto ao Tribunal de Aveiro onde 17 pessoas estão a ser julgadas por prática de interrupção voluntária da gravidez clandestina
Carla Carvalho Tomás/PÚBLICO
Manifestação em Dezembro de 2003 junto ao Tribunal de Aveiro onde 17 pessoas estão a ser julgadas por prática de interrupção voluntária da gravidez clandestina
Carla Carvalho Tomás/PÚBLICO
As mulheres vivem mais, mas com pior saúde
Diminuiu substancialmente a mortalidade materno-infantil. A interrupção voluntária da gravidez está em queda desde que foi legalizada. As pessoas vivem mais tempo. A subida nota-se um pouco mais entre homens do que mulheres, mas elas continuam a ter mais esperança média de vida. Embora vivam mais, as mulheres têm menor expectativa de vida saudável. Têm menos tempo para si, para lazer ou desporto. Dizem os estudos que algumas até se habituam ao desconforto (menstruação, gravidez, maternidade, recuperação pós-parto, menopausa). Desvalorizam sintomas. E nem sempre se sentem bem tratadas pelo sistema de saúde. Durante muito tempo, por serem mulheres, não participaram em ensaios clínicos.
Esperança média de vida à nascença
Em anos
Os homens têm maior esperança de vida saudável à nascença
Mulheres
Homens
A mortalidade materno-infantil caiu de forma vertiginosa
Taxa de mortalidade materna
Taxa de mortalidade infantil
A interrupção voluntária da gravidez está a diminuir quase desde a legalização a pedido
Nota: Para alguns anos em análise não existem dados disponíveis; é o caso da evolução das disparidades salariais (para os anos de 1990 e 2001).
FICHA TÉCNICA
Textos: Ana Cristina Pereira Edição: Andreia Sanches Ilustração: José Alves Infografia: José Alves, Francisco Lopes , Gabriela Gómez e Cátia Mendonça Desenvolvimento web: José Alves, Francisco Lopes e Gabriela Gómez