A Internet antiga

Em 1983 o Pedro Ayres Magalhães e eu partilhávamos uma casa no Monte Estoril que ardeu até ao chão, levando tudo o que tínhamos.

Ficámos sem nada. Mudámo-nos para Cascais onde descobrimos que não tínhamos nada para guardar: nem um único livro, disco ou caderno de apontamentos.

Desde esse dia tenho tido medo não só do fogo como do apagamento. Perdi mais de 20 mil livros e 130 mil exemplares de revistas. Para não falar nos discos de vinil que eram 90 por cento merda, 8 por cento merecedor e 2 por cento tragicamente impossíveis de substituir.

Desde o dia desse terrível incêndio, que nos obrigou a despedirmo-nos das provas das nossas artes e vidas anteriores, compreendi que não conseguimos existir sós como seres humanos, por muito que queiramos triunfar assim.

Passei esta semana a reduzir a nossa biblioteca, atendendo à existência - entretanto - da World Wide Web. Descobri que toda a minha infalivelmente vasta biblioteca parte do princípio que a Internet poderá falhar e até deixar de existir.

Tenho à minha volta, graças a um cuidado e uma despesa desgraçada desde 1995, uma biblioteca física de livros materiais que contêm informações mais completas e exactas do que tudo o que se poderia suscitar através da Internet.

E não há dia em que não encontre, nesses dicionários (que cada vez é mais tristemente fácil actualizar, por serem cada vez menos as novas edições) coisas que não se encontram nem na Internet pública nem na universitária. E boas...

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