Terapêuticas biológicas/biotecnológicas e biossimilares: duas faces da mesma moeda?

Enquanto sociedade, deveremos ter em mente um equilíbrio entre o que podemos pagar e o que gostaríamos de ter para a saúde dos cidadãos.

Todos os sistemas de saúde nos países desenvolvidos encontram-se sob pressão em termos de sustentabilidade por diversos motivos: envelhecimento populacional, maior esperança de vida, maior número de doenças crónicas por doente e custos superiores com fármacos cada vez mais evoluídos tecnologicamente, com melhores resultados mas de preço igualmente muito superior.

O aparecimento de genéricos e de biossimilares surge como uma estratégia adoptada por diversos países para redução de custos com as terapêuticas. Se nos genéricos, que são cópias de fármacos muito simples, a tarefa de fabrico e de vigilância de segurança é mais simples, os biossimilares são medicamentos muito mais complexos e embora sendo semelhantes têm particularidades ao nível da eficácia e de potenciais efeitos adversos que necessitam de maior vigilância e alguns cuidados suplementares.

Se pensarmos em como gerir estes medicamentos biológicos que são utilizados na Reumatologia, Dermatologia, Gastro, Oncologia, etc. como sendo os fármacos mais avançados e utilizados apenas para situações de franca gravidade de múltiplas doenças, devemos pensar em três pontos fundamentais com claras poupanças para o SNS: acessibilidade, equidade e racionalidade.

A acessibilidade é muito mais que apenas aceder a uma terapêutica. É ter o melhor plano desde o início. É o especialista que deve utilizar estes fármacos estar acessível, pois com isso sabemos que foi feito um correcto diagnóstico e a utilização de terapêuticas ajustadas e que na falha destas se seguirão como recomendação as terapêuticas biotecnológicas. Em Portugal, o acesso aos especialistas, apesar de existirem planos nacionais e redes de referenciação hospitalares raramente cumpridos e avaliados, é para muitas especialidades uma impossibilidade mesmo em hospitais centrais ou de referência. Dando como exemplo o que conheço melhor, a Reumatologia, alguém pode explicar aos utentes de hospitais como os Civis de Lisboa, Amadora-Sintra, Santo António no Porto, Guimarães, Cascais, etc., como é possível que, mesmo havendo especialistas interessados em abrir serviços, eles não existam? E com isso os doentes, que deveriam ser vistos e orientados por especialistas, são avaliados por médicos sem competência reconhecida pela Ordem dos Médicos, com aumento de custos e diminuição da qualidade assistencial.

E assim teremos diferenças na equidade quer no acesso aos especialistas mas igualmente aos fármacos. Com negociações hospital a hospital existem neste momento hospitais que disponibilizam diferentes medicamentos biológicos e/ou biossimilares, sendo que as primeiras ou segundas linhas terapêuticas são determinadas por negociações e não por opções clínicas. Assim, o fármaco indicado para um determinado doente poderá não ser o que está disponível no hospital (a disponibilidade pressupõe burocracia e tempo adicional até se fazer chegar o fármaco certo ao doente que dele precisa).

A racionalidade de custos e de estratégias é fundamental para todos: SNS, médicos e doentes. Se quisermos ter um Serviço Nacional de Saúde mais preparado e equipado para o futuro temos de fazer o máximo para que tal racionalidade seja uma prioridade nacional em todas as áreas e não só na saúde.

Assim, a importância dos biossimilares na redução de custos deverá ser equacionada numa estratégia mais ampla que tenha em conta questões científicas ainda não totalmente esclarecidas, como por exemplo a troca automática, com potencial aumento dos riscos de eventos adversos, ou perda de eficácia, e a integração dos fármacos inovadores. A decisão da troca de um fármaco desta complexidade não deve ser permitida ao gestor ou a uma comissão de gestão hospitalar mas ter em conta os doentes na sua individualidade. Quem melhor conhece e protege os seus interesses são os médicos especialistas que os seguem.

Enquanto sociedade, deveremos ter em mente um equilíbrio entre o que podemos pagar e o que gostaríamos de ter para a saúde dos cidadãos e, porventura, discutir de forma mais ampla quais dos medicamentos inovadores deverão estar acessíveis para que doentes e como reduzir custos sem pôr em causa o desenvolvimento da Medicina, tão necessária para multi patologias cada vez mais complexas e difíceis.

Não me parece que o SNS evoluirá se a forma de reduzir os custos é através de barreiras burocráticas, administrativas ou informáticas. E em que de forma apenas ideológica se pressiona para haver mais genéricos e biossimilares mesmo que o custo destes noutros países seja menos 40% do que em Portugal. Um país só de genéricos e de biossimilares é do 2.º mundo (apenas um pouco melhor que do 3.º), mas um só de inovação sem avaliação credível e pública é um país em rota para a falência. Temos obrigatoriamente de atingir um equilíbrio que seja muito mais durável do que apenas um ano de Orçamento Geral do Estado, a bem do SNS e dos doentes.

 

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