Que melhor pode haver?

“Já há laranjas novas?”, pergunta uma senhora. “Ainda não”, respondem-lhe, “mas já há tângeras...”

A senhora torceu o nariz, como se tivessem falado da fruta do estrume. Depois virou-se para mim e explicou: “Detesto esta altura do ano. Já não há pêssegos e ainda não há laranjas.”

Saiu chateada. Entretanto chegou outra senhora com o cesto cheio de tângeras e  castanhas. Também estava chateada e, para concordar com a senhora ausente, encolheu os ombros e disse: “É o que há...”

É o que há? É o que há? As tângeras, este ano, chegaram cedo, cheias de sol, com uma acidez barroca, cheia de pormenores. Não há melhor sumo do que um sumo de tângeras num enorme copo cheio de gelo. É melhor do que o melhor gin-tónico e faz cantar as mesmas papilas gustativas.

É o que há? Às vezes o que há é o melhor. As amêndoas deste ano, de Figueira de Castelo Rodrigo — largas e espalmadas, a largar poeira castanha escura — são, mais uma vez, epicamente saborosas. Torrá-las no forno é um pecado capital, mas não se resiste: é bom de mais. E as nozes novas, que tanto diferem umas das outras, incluem maravilhas e frustrantes, porque nunca se sabe como vai ser a seguinte.

No Verão havia pêssegos, cerejas, morangos e melões. Era o que havia. Agora há tângeras, nozes, amêndoas e castanhas. É o que há. Castanhas já as comi, esta semana, cruas, cozidas e assadas no forno. Só falta grelhadas e fritas.

Às vezes o que há é o melhor de tudo o que pode haver. Na vida e, de vez em quando, na fruta...

miguelestevescardoso@gmail.com

Sugerir correcção
Ler 1 comentários