Proposta salarial do Governo “não é uma verdadeira base negocial”, declaram juízes

Ministério da Justiça diz que não há dinheiro senão para para pagar mais 155 euros mensais a magistrados, repondo verba que tinha sido cortada havia seis anos.

Foto
Manuela Paupério, presidente da Associação Sindical de Juízes Portugueses Enric Vives-Rubio

A oferta do Governo de reposição de 155 euros nos salários “não é uma verdadeira base negocial”, considera a Associação Sindical de Juízes Portugueses, que entrega esta quinta-feira ao Ministério da Justiça uma contraproposta de estatuto profissional.

Os aumentos salariais constituem uma das partes dos estatutos de juízes e dos procuradores, cuja revisão está a ser negociada entre os sindicatos do sector e a tutela. “A proposta do Governo não é uma verdadeira base negocial, uma vez que traduz uma mera reposição de um direito”, entende a Associação Sindical de Juízes Portugueses. Como o PÚBLICO já noticiou, o Governo alega que não tem dinheiro para aumentar os salários-base dos magistrados, razão pela qual apenas admite voltar a pagar aos juízes na íntegra um suplemento salarial que era de 775 euros até 2011, ano em que sofreu um corte de 20% por causa da austeridade e passou a ser de 620 euros. Independentemente do seu salário todos os magistrados judiciais recebem este suplemento, que no passado funcionava como um subsídio de habitação mas que, neste momento, entendem ser uma compensação pelo facto de não poderem, por lei, exercer mais nenhuma função remunerada para além da de juízes.

Contraproposta: aumentos “muitíssimo moderados”

Na sua contraproposta, a associação sindical apresenta ao Ministério da Justiça outras soluções de revalorização da carreira, que dizem estar congelada há década e meia. A diminuta diferença, por causa da tributação fiscal, entre os salários de quem está nos tribunais de primeira instância e quem ocupa lugares de topo na magistratura deverá ser um dos cavalos de batalha dos representantes sindicais. Sem entrar em detalhes, a associação diz que vai propor ao Governo aumentos “muitíssimo moderados” e com impacto orçamental “muito diminuto”, uma vez que só existem cerca de dois mil juízes em Portugal.

Mas a primeira preocupação vai para outra matéria do estatuto profissional: a defesa da independência da classe. A associação entende que a proposta do Governo abre a porta não só à sua funcionalização como à interferência hierárquica – algo que seria normal na maioria das profissões, mas que no caso dos juízes é considerado grave por as garantias de independência do seu trabalho assentarem também no facto de serem, ao contrário dos procuradores, uma magistratura sem hierarquias.

Os representantes dos magistrados judiciais dizem temer que as novas regras que o Ministério da Justiça quer criar permitam o afastamento de juízes incómodos de certos lugares de trabalho ou de certos processos – um risco que a ministra da Justiça considerou ontem no Parlamento não existir. “Não se podem confundir divergências com ataques à autonomia e independência”, observou a governante.

Em causa está uma norma que impõe um dever de respeito e obediência dos juízes a ordens ou instruções do presidente do tribunal e do Conselho Superior da Magistratura, órgão de gestão e disciplina destes magistrados do qual fazem parte representantes do poder político.

A Associação Sindical de Juízes Portugueses pronunciou-se também em relação à composição do Supremo Tribunal de Justiça: quer que os juristas de mérito que o integram não ultrapassem uma quota de 20%, e que tenham pelo menos 55 anos.

Caso as negociações com a tutela não cheguem a bom porto, os juízes ameaçam boicotar o processo eleitoral autárquico, fazendo greve. 

Sugerir correcção
Ler 1 comentários