Portugal condenado por demorar a analisar prisão preventiva

"É incumbência do Estado organizar o sistema judicial de forma a permitir celeridade na análise de assunto relacionados com prisão”, sublinha Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.

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Guido Raimondi é o presidente do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos Nuno Ferreira Santos

Portugal voltou a ser condenado pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos. Desta vez, por não ter analisado com a celeridade devida o caso de um suspeito que contestava a legalidade da medida de prisão preventiva. "É incumbência do Estado organizar o sistema judicial de forma a permitir celeridade na análise de assunto relacionados com prisão”, lembra o acordão.

Em Dezembro de 2013, o Departamento de Investigação e Acção Penal acusou Rafael Martins O'Neill Pedrosa de ter cometido diversos crimes em Sintra, incluindo coacção, ofensas à integridade física qualificadas, violação e omissão de auxílio. Já em Junho de 2014, o Ministério Público emitiu um mandado de captura internacional.

O suspeito acabou por ser detido no Reino Unido e, no dia 27 de Fevereiro de 2015, entregue às autoridades portuguesas para ser julgado. Naquele mesmo dia, foi sujeito a um primeiro interrogatório judicial e a uma medida de prisão preventiva. Questionando a legalidade daquela decisão, o rapaz, então com 20 anos, recorreu.

A acção foi interposta no dia 19 de Março de 2015. Volvidos 14 dias, o juiz julgou o recurso admissível e pediu ao MP que se pronunciasse. Já a 27 de Abril, o magistrado notificou o queixoso das observações feitas pelo MP. O processo deu entrada no Tribunal da Relação de Lisboa a 4 de Maio. E seguiu então os seus trâmites. O procurador emitiu um parecer. Rafael Martins O’Neill Pedrosa foi notificado, teve dez dias para responder. O juiz analisou o caso, ensaiou uma decisão, que partilhou com outros dois juízes. O suspeito continuou à espera.

Cansado de esperar, Rafael Martins O’Neill Pedrosa fez, a 24 de Junho, um pedido de habeas corpus ao Supremo Tribunal de Justiça. Queixou-se da falta de apreciação da sua detenção, que, em seu entender, fora irregular. Alegava que o período de 30 dias, estabelecido no Código de Penas, já tinha expirado.

O Supremo Tribunal de Justiça não deu razão ao queixoso. Alegou que o prazo de 30 dias para analisar um pedido de revisão de uma medida de prisão preventiva constitui apenas um princípio de orientação, que ilustra a urgência da tomada de decisão. Entende que a falta de rapidez não é motivo para um habeas corpus.

Só a 2 de Julho, 51 dias depois de o processo ter dado entrada no Tribunal da Relação de Lisboa, a decisão de manter o jovem em prisão preventiva foi confirmada. Martins O’Neill Pedrosa recorreu ao Tribunal Europeu. E, agora, o Tribunal Europeu deu-lhe razão. E condenou o Estado português a uma multa de 3250 euros por danos morais.

A Convenção para a Protecção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais garante a quem é detido o direito de contestar a legalidade da sua detenção e o direito a obter uma resposta célere. “Embora o número de dias que demoram os procedimentos relevantes seja relevante, não é necessariamente decisivo por si só para determinar se uma decisão foi tomada com a rapidez necessária”, lê-se no acordão. “O que é tido em conta são as diligências tomadas pelas autoridades, o atraso atribuível ao requerente e quaisquer factores que causam demora pelas quais o Estado não pode ser responsabilizado”, prossegue. Se o direito a uma resposta célere foi ou não respeitado é algo que deve ser visto caso a caso.

No caso em apreço, o tribunal julga que o tempo foi excessivo. O assunto não era complexo. O requerente não causou atrasos. O Estado não forneceu uma explicação para a demora. “O Tribunal considera que é incumbência do Estado organizar o sistema judicial, de forma a permitir celeridade na análise de assuntos relacionados com prisão”, refere. Mais: “O tribunal está preocupado com a existência, no quadro nacional, de provisões legais que não estabelecem prazos legais quando a liberdade de uma pessoa está em causa”. Reitera que devem ser estabelecidos prazos e que esses prazos devem ser respeitados. 

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