Pais solteiros também vão poder recorrer a conservatórias para guarda dos filhos

Regime dos casados vai ser alargado aos restantes progenitores. Mas há quem ache que isso é tratar crianças como mercadoria.

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bruno lisita

O Parlamento aprovou esta sexta-feira na generalidade um projecto de lei destinado a alargar aos pais solteiros a possibilidade de recorrerem às conservatórias do registo civil para dividirem a guarda dos filhos quando se separam do outro progenitor.

A lei em vigor prevê desde 2008 que as pessoas casadas possam, em caso de divórcio, recorrer às conservatórias para obterem a regulação das responsabilidades parentais, em vez de terem de passar por um processo em tribunal. O grupo parlamentar do PS, que propôs a alteração legislativa agora aprovada, explica que o recurso directo aos tribunais imposto aos progenitores solteiros “acarreta encargos adicionais para as partes e uma sobrecarga desnecessária para o sistema judicial” – ou, nos casos em que os pais optam por combinar só entre si o regime de guarda das crianças, “uma menor certeza e segurança jurídica para os menores e suas famílias”.

O projecto de lei prevê que passem a poder recorrer às conservatórias em caso de separação de facto, dissolução de união de facto e também nos casos de pais não casados nem unidos de facto, desde que estejam de acordo relativamente à divisão de responsabilidades. As conservatórias poderão igualmente tratar da alteração de acordos de regulação do poder parental pré-existentes. Aos funcionários das conservatórias cabe apreciar os acordos propostos pelos pais, convidando-os a alterá-los se entenderem que não acautelam os interesses dos menores, enviando depois o documento para validação pelo Ministério Público, que tem um mês para se pronunciar. Quando o casal desavindo rejeitar as alterações determinadas pelo Ministério Público resta-lhe recorrer para tribunal.

Apesar de o projecto de lei ter sido aprovado por unanimidade, a associação Igualdade Parental não vê com bons olhos o poder que ele confere aos conservadores dos registos civis. “Não estão habilitados para aferir do superior interesse da criança”, observa o presidente da associação, Ricardo Simões. Deixar uma questão tão importante como esta à consideração das conservatórias do registo civil é tratar as crianças como mercadoria, acrescenta. “Se o argumento é económico, por causa dos custos implicados nestes processos, porque não baixam as custas judiciais?”, interroga. Por último, o mesmo dirigente diz que a alteração legislativa pode ter problemas de constitucionalidade ao discriminar casados, que para rever acordos pré-existentes ainda têm de passar pelo tribunal.

“Não é isso que decorre da lei em vigor”, assegura o deputado do PS Pedro Delgado Alves, mostrando, no entanto, abertura para melhorar o projecto durante a sua discussão na especialidade. O socialista refuta a tese de que as conservatórias estão a decidir matérias que desconhecem: “A intervenção do Ministério Público está sempre garantida nestes processos”.

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