O valor jurídico do Acto Médico: defender os doentes e combater a corrupção

A indefinição jurídica sobre o Acto Médico permite que outras pessoas e outros profissionais não médicos exerçam “medicina”.

Nunca como hoje o Acto Médico foi alvo de tantas agressões.

Na relação médico-doente os atropelos externos sucedem-se em catadupa.

Como acontece com a imposição de tempos de consulta absurdamente curtos. A sobreposição de tarefas e os tempos prolongados de actividade consecutiva. O não cumprimento de descansos compensatórios. O acesso limitado ou negado a tratamentos, dispositivos médicos, materiais clínicos ou equipamentos. A informatização excessiva e disfuncional com reflexos negativos na humanização. Estes, são apenas alguns exemplos de práticas impostas superiormente e que fazem perigar a qualidade do Acto Médico e a segurança dos doentes.

É no Acto Médico que se evidencia a relação de confiança médico-doente, trave mestra no exercício da medicina, e que tem sido de forma imprudente ignorado pelos responsáveis políticos,  que centram excessivamente as suas preocupações nos números e no financiamento, em detrimento claro das pessoas.

Não é por acaso que, nos últimos anos, milhares de médicos emigraram ou se aposentaram de forma antecipada.

Por outro lado, a indefinição jurídica sobre o Acto Médico, permite que outras pessoas e outros profissionais não médicos exerçam “medicina” sem que lhes possa ser imputada responsabilidade profissional ou outra, desde que não se intitulem formalmente médicos. Já para não falar daqueles outros que invadem a esfera de competências dos médicos, praticando actos para os quais apenas e só os médicos se encontram preparados e que, desse modo, cometem o crime de usurpação de funções mas nunca são penalizados, porque a lei não define tais actos como médicos.

Nesta medida, os verdadeiros prejudicados com esta falta de definição são os doentes, que não estão preparados para distinguir o trigo do joio. E são muitos.

É essencial informar a sociedade civil e alertar os decisores políticos da necessidade de enquadrar juridicamente o Acto Médico, como imperativo Constitucional, imperativo este já concretizado em praticamente todas as outras profissões na área da saúde.

Muitos outros argumentos poderiam ser dados para fundamentar a necessidade do referido enquadramento jurídico. No entanto, para defender os  doentes e aumentar a sua segurança e o seu direito a informação verdadeira, daria apenas três: combater a corrupção, privilegiar a transparência de processos e procedimentos e eliminar os conflitos de interesses.

Não se entende de que é que o poder político tem medo ou quais são as amarras ou estigmas que o limitam. Será que consideram os médicos cidadãos incómodos por, independentemente da cor política do Governo, lutarem pela dignidade e pelos direitos dos doentes?

Todos estes motivos impulsionaram a Ordem dos Médicos a eleger como tema central do seu Congresso Nacional o Acto Médico, reunindo durante três dias [de 26 a 28 de Novembro] a comunidade médica e a sociedade civil a analisar e debater este tema premente para o exercício da medicina em Portugal.

Presidente da Secção Regional Norte da Ordem dos Médicos

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