O ministro da Educação ainda não se demitiu?

Ou Tiago Brandão Rodrigues desmente de forma muito convincente o seu anterior secretário de Estado da Juventude e do Desporto ou o seu único caminho é a demissão.

Deixemos por um momento de lado o colapso moral da classe política portuguesa e dos seus tristes jotinhas, essa subespécie que enche gabinetes ministeriais após ter-se arrastado por universidades, com um empenho associativo inversamente proporcional à sua aplicação académica. A facilidade com que se continua a transitar da colagem de cartazes para o tacho da assessoria mereceria um texto só por si, pois demonstra bem que a cultura jobs for the boys está muito longe de ter esmorecido. Só nesta semana foram duas demissões. Depois de Rui Roque, adjunto para os Assuntos Regionais do primeiro-ministro, foi agora a vez de Nuno Félix, chefe de gabinete do secretário de Estado da Juventude e do Desporto, duas demissões por terem invocado (está em Diário da República) uma licenciatura que nunca tiveram. No que diz respeito à produção de aldrabões académicos, Portugal pode começar a apresentar-se como país exportador.

Mas independentemente de o governo estar a necessitar de uma profunda auditoria às habilitações dos seus membros de gabinete, vale a pena concentrarmo-nos naquilo que por esta altura já deveria ser óbvio para todos: ou Tiago Brandão Rodrigues desmente de forma muito convincente o seu anterior secretário de Estado da Juventude e do Desporto, João Wengorovius Meneses, ou o seu único caminho é a demissão. Wengorovius Meneses, que bateu com a porta do ministério em Abril, garantiu ao Observador que Brandão Rodrigues sabia perfeitamente que Nuno Félix tinha mentido nas suas habilitações, e que essa havia sido uma das razões para a sua demissão. O ministério da Educação negou que o ministro tivesse conhecimento de qualquer irregularidade – só que, como explicação, é curto.

Dizer que há aqui apenas a palavra de um ministro contra a palavra de um ex-secretário de Estado não convence ninguém que tenha lido com alguma atenção a investigação do Observador. Por uma razão simples: a demissão de Wengorovius Meneses foi muito badalada, e já em Abril ele havia afirmado publicamente que saía “em profundo desacordo” com o ministro da Educação no “modo de estar no exercício de cargos públicos”. De resto, recusou-se a adiantar mais por respeito à “dignidade do Estado” e à “estabilidade política”. Agora, o ex-secretário do Estado vem confirmar histórias inacreditáveis sobre Nuno Félix – hesito sobre qual será a minha favorita, se o facto de ele ter um motorista para o ir buscar e levar todos os dias a São Martinho do Porto (108 quilómetros de Lisboa, 432 quilómetros diários para o pobre motorista), se o facto de manter, em acumulação, o trabalho na secretaria de Estado do Desporto com o cargo de olheiro (juro) do Colónia FC –, mas vem dizer mais: Wengorovius afirma preto no branco que o ministro o impediu de exonerar Nuno Félix, nome que lhe havia sido imposto por Brandão Rodrigues aquando da aceitação do cargo e que era um homem da sua confiança directa, tendo transmitindo, segundo o Observador, “essa ordem por e-mail”. 

Ora, se há mails, há provas. Um dos dois está a mentir. Portanto, a bem da salubridade da República, espero que esse mail seja publicamente revelado se Tiago Brandão Rodrigues continuar a garantir que não tinha qualquer consciência das irregularidades de Nuno Félix. Se se provar que tinha, o caminho só pode ser um: apresentar a sua demissão do cargo de ministro da Educação, que não é com certeza o lugar mais adequado do país para andar a brincar às licenciaturas.

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