O género das leis da República

As mulheres científicas em Portugal não fabricam intenções para consumo de leigos.

Sobre a notícia do PÚBLICO (09.05.2017), "PS insiste em monitorizar o impacto de género nas leis". Esta preocupação do PS (deputado Pedro Delgado Alves) em fazer passar por um crivo de género as leis a aprovar pretende produzir legislação mais justa para as mulheres, para diminuir, suponho, as desigualdades existentes.

Onde estava tão distinto representante aquando da aprovação do DL 57/2016, de 29 de Agosto de 2016, sobre a inclusão contratual em funções públicas dos actuais precários, bolseiros pós-doutoramento de investigação? Esse DL determina, no n.º 4 do artigo 23.º, que “é dirigido às instituições na contratação de bolseiros de pós-doutoramento, cuja bolsa é financiada pela FCT em 1 de Setembro de 2016, e que exercem funções nessa qualidade há mais de três anos seguidos, nas instituições de acolhimento”.

Por exemplo, quem tenha tido bolsa FCT de três, seis ou mesmo nove anos consecutivos de post-doc, mas tenha terminado antes de Setembro de 2016, não tem direito a ser contratado! Porquê três anos? São apenas os precários, recentes afilhados contratados? E as centenas de jovens investigadores que há mais de dez anos trabalham, inovam e produzem saber científico, eficaz para a subida no ranking das nossas universidades? Ficam de fora?

Saberá tão distinto representante que a maioria desses investigadores universitários são mulheres, sem qualquer vínculo à função pública? Saberá que em Portugal há mais de 30 anos que a presença feminina é maioritária nas universidades públicas e com um número de licenciadas exponencialmente crescente desde os anos 60 até hoje? Saberá que esta ascensão teve apenas um decréscimo pontual no ano de 1977, quando da primeira introdução de um numerus clausus no acesso universitário? Será que a actual proposta do PS é o retrocesso mímico do ano de 1977?

Como mulher e feminista, agradeço que me poupem a esta tão apregoada justeza das ditas igualdades de género, sempre badaladas e representadas no masculino. As mulheres científicas em Portugal não fabricam intenções para consumo de leigos. Elas inovam e produzem ciência há muitos anos, com saberes demonstrados e aceites por especialistas. O senhor deputado deve ter mais atenção às recentes leis aprovadas, para ser credível na sua proposta sobre o impacto de género nas leis.

 

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