O cão e a navalheira

È aquela pessoa da qual estamos sempre a ouvir falar que "está mal mas não deixa ninguém ajudá-la".

No último New York Review of Books Dan Chiasson cita um poema de C K Williams que descreve um Doberman preso numa cabina telefónica das antigas. Cada vez que alguém tenta abrir a porta o cão enfurece-se e aproveita a nesga para tentar morder o libertador, que acaba por desistir, claro.

Não é uma metáfora nova mas está bem escrita. O cão é aquela pessoa da qual estamos sempre a ouvir falar que "está mal mas não deixa ninguém ajudá-la".

É também uma variante do dog in the manger: o cão que, apesar de não comer aveia, não deixa que o cavalo a coma. Se o cavalo morrer primeiro podem ambos morrer de fome - o cão porque não sai dali para ir à procura de comida, não vá o cavalo aproveitar para comer a aveia - e o cavalo porque, nesta história, não pode comer nada senão aveia e toda a aveia do mundo está concentrada naquele local.

Noutra versão, há um cão que o hortelão ensinou a proteger as couves. O hortelão morre e o cão, por dedicar o que resta da vida dele à missão de que foi incumbido, não tarda nada em ir fazer companhia ao dono.

Jorge Luís Borges deu uma volta à ideia para descrever a guerra entre a Argentina e o Reino Unido a propósito das ilhas Falkland como dois carecas a lutar por causa de um pente.

Melhor ainda é o mariscador português (adapta-se a nacionalidade conforme o público) que deixa destapado o balde com as navalheiras que apanhou, sabendo que se alguma tentar escapar as outras encarregar-se-ão de ir buscá-la e puxá-la outra vez para o seio da comunidade.

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