“Nesta escola não há impossíveis”

A Escola Secundária Raul Proença é a pública que tem a melhor média a nível nacional nos principais exames do secundário. A Básica e Secundária da Batalha é que mais supera o resultado esperado, tendo em conta o seu contexto socioeconómico. Ficam as duas no distrito de Leiria.

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Carolina Ribeiro arregaça as mangas e corre para o trampolim. Afasta as pernas no ar e toca com as mãos nos pés. Está na aula de Educação Física, mas é tão ágil nos saltos como nos números ou nas letras. Gosta de todas as disciplinas, tem notas a rondar os 18 e é presidente da Associação de Estudantes da Escola Secundária Raul Proença, Caldas da Rainha, onde anda desde o 7.º ano.

Com 12,41 de média (numa escala de 0 a 20) nos exames a oito disciplinas e no 34.º lugar do ranking geral do ensino secundário — no ano passado estava em 39.º —, é a escola pública mais bem classificada. Acima dela, só colégios privados.

Agora com 17 anos, no último ano antes de entrar na faculdade, Carolina Ribeiro olha para trás e arrisca uma razão que distinga a Secundária Raul Proença: “Nesta escola, um aluno, mesmo que não tenha boas notas, fica com uma abertura muito grande, aqui não há impossíveis. Temos muitas actividades fora das aulas, qualquer projecto, concurso, ideia, a escola apoia.”

Conta, por exemplo, que no Halloween, em vez da tradicional festa, apresentaram à direcção da escola uma proposta para fazer um conjunto de performances sobre loucura. Queriam criar, em 10 salas, um espaço “assustador”, brincar cenicamente com a ideia de manicómio. Era essencial a colaboração de funcionários, entre as 21h e a meia-noite, mas mais do que isso: era preciso que a direcção não torcesse o nariz. “É difícil confiar assim nos alunos”, nota Carolina Ribeiro.

A Raul Proença é, então, a pública que melhor se sai e é ainda a quinta escola pública que mais supera o Valor Esperado de Contexto (VEC). Este indicador, do VEC, permite saber se uma escola supera ou não as escolas que fazem parte do mesmo contexto socioeconómico. O contexto 1, tal como ele é definido pela Universidade Católica Portuguesa para o PÚBLICO, é o mais desfavorável — mais alunos pobres e famílias menos escolarizadas. O 3, pelo contrário, caracteriza-se por ter menos alunos abrangidos pelos apoios sociais do Estado e pais com mais habilitações. A Raul Proença está neste contexto.

Curiosamente, a escola que mais se supera, a nível nacional, fica a três quartos de hora de carro: a Básica e Secundária da Batalha — contexto 2, média de exames de 12,27, 41.ª no ranking geral — é também uma das duas únicas que tem simultaneamente uma média de exames acima de 12 e uma taxa de conclusão do 12.º elevada (82,2%).

As duas escolas têm contrato de autonomia (o que lhes dá mais liberdade face às orientações ministeriais) e as duas receberam créditos horários do Ministério da Educação e Ciência por bom desempenho.

Entre outros projectos, as direcções de ambos os estabelecimentos realçam a importância das chamadas salas de estudo — aulas para tirar dúvidas dirigidas a todos os alunos e não só àqueles com mais dificuldades.

“Vou muitas vezes, quase todas as semanas, às salas de estudo de Matemática, Biologia e Física. São como aulas de apoio, não tenho qualquer explicação fora”, diz José Bastos, 15 anos, aluno de dezoitos, do 11.º ano da escola da Batalha (os estudantes que conversaram com o PÚBLICO foram escolhidos pela direcção de ambos estabelecimentos).

O director desta escola da Batalha, Luís Novais, também realça a importância destas salas: “Funcionam nos horários em que os alunos não têm aulas. Vão lá voluntariamente, está lá sempre um professor disponível da disciplina.”

O mesmo se passa na Raul Proença: “Quem beneficia desse apoio não são propriamente os piores alunos. Muitas vezes são os alunos que estudam e querem tirar dúvidas”, diz José Pimpão, que foi director desta secundária até ao final de Setembro. A subdirectora Paula Martins acrescenta: “Muitas vezes são os alunos que querem melhorar os 17 e os 18 que vão a estas salas.”

“A estabilidade é fundamental”
Mas há outros projectos que foram postos em marcha. O director da escola da Batalha enumera, por exemplo, a criação de uma sala de estudo a Português e Matemática no 9.º ano ou os chamados “grupos de homogeneidade” a Português, Matemática e Inglês, nos 2.º e 3.º ciclos. Estes últimos não funcionam para todas as turmas, só para aquelas que a escola entende ser necessário. De uma forma geral, implica que haja três professores a ensinar ao mesmo tempo três grupos de alunos da mesma turma. Os docentes evitam incluir na explicação que os estudantes são agrupados em função das dificuldades, mas é isso que acontece, embora o sistema permita que saltem de um grupo para o outro, à medida que vão superando os obstáculos.

José Bastos, aluno do quadro de honra desta escola da Batalha, está na segunda fila a tirar notas enquanto a professora explica a multiplicação vegetativa artificial. Está atento, não faz perguntas, mas vai acenando com a cabeça, enquanto acompanha o raciocínio da professora. Está no 11.º ano, na área de Ciências e Tecnologias. Ainda não sabe bem o que seguir, mas há-de ser algo relacionado com Ciências: “Não tanto Biologia, mais Física, Matemática. Se calhar, uma engenharia.”

Carolina Ribeiro, da Raul Proença, está em Ciências Socioeconómicas e quer ir para Economia na Universidade Nova. Não há uma disciplina de que não goste, embora o fraquinho maior seja Matemática. O que faz é estudar “mais intensamente” na semana dos testes e estar “com atenção nas aulas”: “Gosto das aulas”, diz a aluna que, fora da escola, faz dança criativa e contemporânea.

Os pais de Carolina Ribeiro são licenciados (o pai é economista, a mãe professora de Português). “Os nossos alunos são filhos de pessoas com alguns estudos. Têm computadores, Internet em casa”, admite Paula Martins.

Apesar de nestas escolas não haver problemas de indisciplina, ambas as direcções garantem que há regras cumpridas à risca. José Pimpão costuma contar uma história: “Quando estamos em reuniões com outras escolas, dizemos que na nossa escola não se fuma. Os outros dizem-nos que na deles também não, só na sala de fumadores. Mas aqui não há sala de fumadores. Alunos, professores, funcionários vão todos à rua. Não há privilégios.” E se algum aluno for apanhado a fumar? “Não é”, ri-se José Pimpão. “Os professores vão fumar lá para fora, eles vêem, o exemplo vem de cima.”

Há uma outra característica desta escola das Caldas da Rainha que a faz ser conhecida na região, acrescenta o antigo director: “Está vocacionada para quem quer ir para a faculdade.” Edgar Ximenes, docente de Físico-Química e responsável pelo Clube da Ciência, corrobora: “Sempre assumimos sem complexos, no projecto educativo, que o que sabemos fazer é preparar alunos para a universidade. Somos um antigo liceu. Sempre apostamos muito nessa missão. E temos uma área de influência muito grande, Peniche, Bombarral, Óbidos, Nazaré, Benedita... As famílias da região sabem o que a Raul Proença faz bem, os próprios professores assimilaram isso.” Paula Martins garante, porém, que não é feita “qualquer selecção à entrada do secundário”. Argumenta que recebem alunos com Necessidades Educativas Especiais e também estudantes de outras escolas que querem por exemplo melhorar notas.

Mas há outras razões de peso para explicar o desempenho destas escolas do distrito de Leiria: “A estabilidade do corpo docente contribui para os bons resultados. A escola tem um corpo docente estável”, diz o antigo director da Raul Proença, frisando que nesta secundária a percentagem de professores do quadro ronda os 90%. Já no caso da Batalha, o director salienta que, “a leccionar no ensino secundário são tudo professores do quadro”: “Ajuda e muito, a estabilidade é fundamental.”

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