Ministro do Ambiente vai a Espanha tentar resolver a terceira ameaça

Matos Fernandes debate esta quinta-feira em Madrid, com os ministros do Ambiente e da Energia de Espanha, a construção de um aterro nuclear em Almaraz, a 100 quilómetros da fronteira portuguesa.

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Ministro Matos Fernandes reúne-se hoje com o homólogo em Madrid Enric Vives-Rubio

É terceira vez que Espanha ameaça enterrar resíduos nucleares junto à fronteira com Portugal. Depois de, há 30 anos, as relações entre Lisboa e Madrid terem conhecido um dos seus piores momentos pela pretensão espanhola de construir um armazém em Aldeadávila de La Ribera, junto ao Douro internacional, há uma década a possibilidade de edificar tal estrutura na localidade de Peque, Zamora, quase assombrou a primeira visita de Estado do Presidente Aníbal Cavaco Silva ao outro lado da fronteira.

Em Setembro de 2006, em vésperas da visita, o Governo de Rodriguez Zapatero fez marcha atrás. O recuo foi então justificado ao PÚBLICO pelo Palácio da Moncloa com um parecer. A não localização do armazém em superfície de resíduos nucleares junto à raia era uma das condições dos peritos: “Por respeito aos países limítrofes, para manter os critérios de boa vizinhança e por questões de segurança.” Madrid dissolvia, assim, a polémica ibérica englobando a França nos vizinhos, mas a medida destinou-se a contentar Portugal.

Agora, a polémica foi reaberta. Esta quinta-feira, o ministro do Ambiente português reune-se em Madrid com os ministros do Ambiente e da Energia espanhóis. Tema: a intenção de Espanha de construir um aterro nuclear em Almaraz, a 100 quilómetros da fronteira portuguesa.

João Pedro Matos Fernandes tinha já ameaçado não participar na reunião se se confirmasse que a decisão de construir o armazém estava tomada. E acenou com uma queixa a Bruxelas — por falta de consulta das autoridades portuguesas, em violação de uma directiva comunitária que impõe análises ambientais para casos com possível impacto além fronteiras. Mas ontem, chegaram garantias de Espanha: a de que o processo “não está encerrado”. E assim, depois do caso de Aldeadávila de La Ribera e do de Peque, Matos Fernandes vai a Madrid tentar resolver a nova ameaça.

Ontem mesmo, o Bloco de Esquerda (BE) entregou, no Parlamento, uma pergunta ao Governo questionando se este tem conhecimento da fiscalização que detectou falhas de segurança na central nuclear espanhola de Almaraz, a 100 quilómetros da fronteira com Portugal, e se vai questionar as autoridades do país vizinho sobre este assunto. Segundo uma notícia do jornal El Diario, citada pelo BE, a acta da última inspecção semestral à central refere, entre outras anomalias, a existência de peças com deformações e folgas, bem com uma avaria num motor. Constatou-se igualmente que no interior de Almaraz é permitido fumar, o que é por regra proibido neste tipo de instalações.

Protestos marcados

Em 2010 não chegou a haver tensão diplomática: mas foram várias as localidades espanholas que se candidataram a receber um armazém de resíduos nucleares. Ascó, junto às duas centrais nucleares, na Catalunha; Yebra e Villar de Cañas, em Castela-la-Mancha; Santervás de Campos, Torrubia de Soria — povoado então com 88 habitantes — e Melgar de Arriba, na comunidade de Castela-e-Leão; Zarra, em Valência. A vencedora foi Villar de Cañas — mas ficava longe da fronteira e, seja como for, a mudança de cor política do Governo regional levou à paralisação do projecto.

É bem diferente, agora, o caso. Ontem de manhã, Matos Fernandes ainda se escusou a confirmar a sua presença em Madrid, dizendo que só faria sentido haver encontro se houvesse “coisas para discutir”. Ao Presidente da República o Rei Felipe VI garantia que não seriam tomadas decisões unilaterais. À tarde, o Ministério do Ambiente emitiu finalmente uma nota a confirmar que a reunião aconteceria.

Várias associações ambientalistas portuguesas e espanholas já marcaram para esta quinta-feira uma manifestação junto ao consulado de Espanha em Lisboa. Defendem que o problema não está na construção de um armazém. “O principal risco é ter em funcionamento uma central nuclear obsoleta” que “é uma bomba relógio”, diz também o PAN.

A Zero – Associação Sistema Terrestre Sustentável, refere em comunicado que, “ainda em 2016, Almaraz foi a central nuclear espanhola com maior número de notificações por incumprimentos de segurança”. A central tem dois reactores. O primeiro começou a funcionar em 1981 e o segundo em 1983. A Zero lembra que “o projecto inicial previa um tempo de vida útil de 30 anos. No entanto, responsáveis espanhóis já assumiram “publicamente que haviam solicitado ao Governo o prolongamento para 2030”, prossegue Francisco Ferreira, presidente da associação.

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