Ministério Público ainda não extraiu certidões para voltar a investigar o caso Freeport

Foto
Licenciamento do centro comercial está na origem do caso Foto: Pedro Cunha

O Ministério Público ainda não extraiu qualquer certidão para voltar a investigar o processo Freeport, apesar de diversas testemunhas terem referido a existência do pagamento de luvas para conseguir o licenciamento do outlet de Alcochete, factos que ficaram fora da acusação.

Durante os quatro meses do julgamento, que tem marcadas para hoje as alegações finais, o ex-primeiro-ministro José Sócrates continuou a ser a estrela do caso, apesar de nunca ter sido sequer ouvido pelos investigadores e não ser arguido no processo. Isso fez muitos esquecer que a discussão em tribunal se centrava apenas numa alegada tentativa de extorsão de dinheiro pelos arguidos Manuel Pedro e Charles Smith, que foram consultores dos promotores ingleses do projecto, junto destes.

"A Procuradoria-Geral da República [PGR] e a Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa desconhecem que tenha sido extraída qualquer certidão", respondeu a PGR a uma pergunta do PÚBLICO. Fonte ligada ao processo admite, contudo, que tal ainda possa vir a acontecer após a decisão final do colectivo que está a julgar o caso, no Tribunal do Barreiro, depois de conhecidos os factos dados como provados pelos juízes. E acredita que o acórdão será divulgado até ao final do mês.

A advogada dos dois arguidos, Paula Lourenço, recusa-se a fazer balanços sobre o julgamento, confirmando apenas que vai pedir a absolvição dos seus clientes hoje, durante as alegações finais.

Ao longo de quatro meses foram ouvidas cerca de 40 testemunhas, apenas três de defesa, algumas das quais foram obrigadas a voltar ao tribunal depois de detectadas falhas na gravação dos seus depoimentos. As contradições nos testemunhos foram muitas, o que obrigou o colectivo a colocar algumas testemunhas frente a frente. Foi o que aconteceu entre o ex-engenheiro civil da empresa Smith & Pedro, João Cabral, que foi confrontado com os advogados Alexandre Oliveira, José Gandarez e Albertino Antunes.

No centro da discussão esteve uma reunião realizada entre os arguidos e aqueles advogados dois dias antes do chumbo do projecto, em Dezembro de 2001, e um memorando dirigido à Freeport em que se pedia dinheiro para evitar o indeferimento.

Para o Ministério Público, residem nesse encontro e nesse documento as chaves da acusação contra Manuel Pedro e Charles Smith. Mas a defesa tentou provar que os arguidos nada têm a ver com o pedido de dinheiro aos ingleses e que o memorando é da responsabilidade do escritório dirigido por Albertino Antunes.

Controverso foi o depoimento de Alan Perkins, administrador do Freeport entre Julho de 2005 e Dezembro de 2006, uma das testemunhas ouvidas através de videoconferência a partir de Londres. Perkins acusou o então ministro do Ambiente, José Sócrates, de ter recebido "pagamentos ilícitos" - entre 200 e 220 mil euros - para viabilizar o outlet em Alcochete e identificou-o como sendo "Pinóquio", referido em alguns e-mails apreendidos como destinatário de luvas. O advogado do ex-primeiro ministro Daniel Proença de Carvalho não gostou e avisou: "José Sócrates não deixará de responsabilizar judicialmente quem abusivamente invocou ou venha a invocar o seu nome para obter vantagens ilícitas de qualquer natureza".

Contudo, contactada pelo PÚBLICO, a sociedade de advogados recusou-se a adiantar se intentou qualquer acção contra algumas das testemunhas do Freeport, alegando que "não têm qualquer intervenção neste caso".

Os arguidos esperaram pelo fim do julgamento para falar, insistindo que não tentaram extorquir dinheiro a ninguém. Manuel Pedro e Charles Smith insistiram que foi José Gandarez, advogado e genro do ex-ministro da Economia do PS Mário Cristina de Sousa, que pediu aos promotores do outlet dinheiro para viabilizar o licenciamento. Os dois coincidiram ainda na versão de que "Pinóquio" é o contabilista da Smith & Pedro.

Sugerir correcção
Comentar