Igualdade de género: um desafio para a década

Igualdade de género pressupõe a implementação de políticas efectivas de igualdade de oportunidades.

Ao longo dos últimos quarenta anos, no pós-25 de abril, Portugal evoluiu espantosamente em diferentes domínios. Realizou-se a democracia política, com eleições livres e universais, aprofundou-se a liberdade económica e as regras de mercado concorrencial, implementou-se um extenso programa de proteção social, na saúde, na educação, no acesso ao ensino superior, e mesmo no que respeita às pensões de reforma a evolução foi significativa face ao nível em que nos encontrávamos nos anos setenta.

De acordo com os ideais da justiça e da igualdade, a sociedade portuguesa mergulhou na modernidade e encontra-se hoje com elevados níveis de desenvolvimento civilizacional. Para este facto contribuíram vários factores incluindo as sucessivas revisões da Constituição, ou mesmo a aprovação de legislação moderna sobre a procriação assistida, o testamento vital, ou a não discriminação em razão da orientação sexual. Todavia, existem algumas áreas onde podemos e devemos fazer melhor. Por exemplo, no plano da igualdade de género, ainda que esta tenha sido amplamente promovida através de um acesso universal à educação – permitindo assim uma diferenciação profissional de ambos os géneros em condições de paridade – existem áreas da sociedade e da economia onde a desigualdade ainda se faz sentir. Este estado de coisas é particularmente visível nos lugares de topo da administração pública, nos titulares de cargos políticos, ou na administração das grandes empresas. Exemplos que são o reflexo de práticas menos divulgadas, mas bem conhecidas, como o desequilíbrio salarial e remuneratório entre ambos os géneros que ainda existe em muitos setores da economia.

Note-se que este desequilíbrio de género, ainda frequente dadas as suas profundas raízes culturais, pode também traduzir-se em práticas socialmente degradantes como, por exemplo, a violência doméstica. Pelo que importa lançar este desafio à sociedade portuguesa colocando-o mesmo como uma das principais metas a alcançar na próxima década. E todos os actores sociais estão naturalmente convocados para esta aspiração civilizacional. Através da sensibilização da sociedade para esta problemática, da realização de estudos que retratem com acuidade fenómenos de desigualdade, ou mesmo da denúncia de situações gritantes de desigualdade de género.

Também o poder político terá que assumir plenamente as suas responsabilidades. Quer através da aprovação de leis modernas, por exemplo reforçando uma posição equitativa de ambos os géneros na actividade política e na administração pública, ou também, e sobretudo, fiscalizando e garantindo que a legislação se aplica eficazmente. Na actividade política a aprovação de uma lei da paridade absoluta, segundo a qual 50% de todos os lugares políticos fossem assegurados a cada género, seria mais um excelente sinal neste sentido.

Igualdade de género pressupõe a implementação de políticas efectivas de igualdade de oportunidades. E estas dependem, sobretudo, da vontade dos Portugueses em tornar Portugal numa das referências internacionais no plano dos direitos humanos.

Professor Universitário da Faculdade de Medicina do Porto e presidente da Associação Portuguesa de Bioética

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