Hoje há “manif” de colégios em Lisboa. Porque protestam?

Pelas 15h, o protesto sobe da Avenida 24 de Julho à Assembleia da República. Eis um resumo da matéria, em cinco pontos.

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Protesto em Coimbra no domingo passado Sérgio Azenha

Já protestaram em vários locais — até na inauguração oficial do Túnel do Marão aproveitaram para fazer valer os seus argumentos. Neste domingo, pais, alunos e dirigentes de colégios particulares fazem uma manifestação nacional em Lisboa. Manuel Bento, do movimento Em Defesa da Escola Ponto, diz que está a contar com 20 a 25 mil participantes.

Autocarros, serão 100 a chegar à capital, diz. Por volta do meio-dia, aquele que baptizaram como o “Comboio da Liberdade” — um comboio especial, fretado pelo Em Defesa da Escola Ponto — trará mais de 830 pessoas mais os seus cavaquinhos, tambores, bombos, faixas e bandeiras. O comboio vem de Braga, pára em várias estações para recolher apoiantes e chega a Santa Apolónia ao almoço.

“Vai ser uma verdadeira festa da família”, diz Manuel Bento. Se é automobilista na capital fique a saber mais isto: prevê-se que a marcha até à Assembleia da República arranque pelas 15h da Avenida 24 de Julho.

Porque protestam os colégios? O que são os contratos de associação, de que tanto se tem falado? Eis um resumo da matéria, em cinco pontos.

1. Os contratos de associação

O Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de 1979 previa que o Estado podia "conceder subsídios e celebrar contratos para o funcionamento de escolas particulares e cooperativas". Os contratos de associação começaram a ser celebrados nos anos 80 do século passado, numa altura em que a escolaridade obrigatória passara de seis para nove anos e em que a rede pública era deficitária em várias regiões. Assim, segundo o decreto 553/80, o objectivo essencial destes contratos com os privados era garantir que todos os alunos tinham acesso gratuito à escola em "zonas carecidas" de escola pública.

Em 2013 o novo Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo foi aprovado e o então ministro da Educação Nuno Crato anunciou como a principal novidade o seguinte: os contratos deixariam de estar dependentes da oferta pública existente numa dada região.

Desde 2015, os resultados dos alunos passaram a ser um dos principais critérios para avaliar os colégios que são candidatos ao financiamento via-contratos de associação.

2. Muda o Governo, muda a filosofia

O novo Ministério da Educação, liderado por Tiago Brandão Rodrigues, decidiu cortar o financiamento a 383 turmas de início do ciclo (5.º, 7.º e 10.º ano) de 39 dos 79 estabelecimentos que actualmente têm contratos de associação.

Os serviços centrais do ministério concluíram que existia “redundância” da oferta (pública e privada financiada pelo Estado).

A secretária de Estado da Educação, Alexandra Leitão, já disse que não iria abrir novas turmas com contrato de associação em zonas onde existisse oferta da rede pública mas garantiu a continuidade dos estudos aos alunos que estejam a meio dos ciclos.

3. Os argumentos dos colégios

A decisão do Governo tem motivado inúmeros protestos dos colégios, que acusam o ministério de ter passado uma “verdadeira certidão de óbito” ao sector, prognosticando o encerramento de mais de metade dos colégios financiados.

Também acusam o ministério de não respeitar os contratos celebrados em 2015 e que pela primeira vez deixaram de ser anuais para ter um prazo de vigência de três anos. Com a notícia de que haveria cortes, o movimento que os representa prometeu: “Providências cautelares serão interpostas por todo o território nacional, com uma cadência diária, o que irá permitir que os pais continuem a proceder às matrículas e renovações de matrículas nas escolas com contrato de associação.”

Alegam ainda os colégios que as turmas que funcionam no privado com financiamento do Estado representam menos custos directos para o Estado do que as turmas que funcionam nas escolas públicas.

Também a Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap) já defendeu que o direito das famílias a “escolher o projecto educativo” para os seus filhos poderá ser posto em causa com as novas regras.

4. Alunos transferidos

Os alunos dos colégios abrangidos pela decisão do Governo serão transferidos para as escolas públicas apenas no final do ciclo que estão actualmente a frequentar e apenas nos casos em que exista oferta pública. O Governo garante que está a analisar a capacidade de as escolas públicas acolherem as crianças, tendo em conta a proximidade, a qualidade da escola e a existência de uma rede de transportes.

Há cerca de 45 mil alunos abrangidos por contratos de associação.

5. Contas diferentes

Continua a não existir um estudo fidedigno sobre o custo médio por aluno e, por conseguinte, por turma, o que tem resultado em valores para todos os gostos.

Os dados divulgados sobre os custos do ensino público pela anterior equipa do Ministério da Educação revelavam uma poupança com os contratos de associação. Já o actual executivo fala num novo estudo, ainda não publicado, que mostrará que custa menos transferir esses alunos para o ensino público.

O Instituto de Gestão Financeira de Educação concluiu que transferir uma turma do privado para o público custaria cerca de 54 mil euros anuais, segundo informações avançadas pelo ministério. Este valor é o custo médio da contratação de dois docentes e parte do pressuposto de que a escola tem capacidade para receber a turma. O Estado paga às escolas com contrato de associação 80.500 euros anuais por cada turma.

Este valor é o mais baixo dos que foram apresentados nos últimos anos e tal deve-se ao facto de o Instituto de Gestão Financeira de Educação apenas ter contado com a contratação de novos docentes, esquecendo os custos associados à necessária contratação de mais pessoal não docente, à manutenção e gestão das escolas e à Acção Social Escolar...

O valor a que assim chegou está muito abaixo dos 85.540 euros por turma que consta, por exemplo, nas contas de 2015 apresentadas pelo Agrupamento de Escolas de Mangualde e que foram divulgadas no blogue de educação DeAr Lindo.

No final de 2012, também o então Ministério da Educação e Ciência divulgou um estudo, para servir de referência ao financiamento futuro dos colégios, onde situava o custo médio por turma no ensino público nos 70.256 euros. Este estudo, coordenado pelo ex-ministro da Cultura Pedro Roseta, teve como dados de referência os relativos a 2009/2010, antes da aplicação do programa de assistência financeira da troika, mas a partir destes foi feita uma estimativa tendo em conta os cortes salariais de 5% para a função pública, a retirada de um dos subsídios e os efeitos da revisão curricular de Nuno Crato, que levou à saída de muitos docentes do sistema de ensino. Com isto tudo, segundo o ministério, o custo médio por turma passou de 79.601 para 70.256 euros, ou seja, menos cerca de 15 mil do que então era pago aos colégios.

A zona Centro é a região do país com mais escolas com contratos de associação, seguindo-se o Norte e, finalmente, Lisboa e Vale do Tejo. No Algarve não existe nenhum contrato de associação e no Alentejo apenas dois.

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