Mais de um mês após o início das aulas, ainda há 524 professores a caminho das escolas

É um ano recorde na dança de professores. Número de contratados para necessidades temporárias já quase duplicou o de 2015.

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Professores do 1.º ciclo são o grupo mais em falta nas escolas NFACTOS / FERNANDO VELUDO

Se não existirem incidentes de percurso, na próxima semana chegarão às escolas do ensino básico e secundário mais 524 professores contratados, dos quais 408 irão substituir docentes que entretanto ficaram de baixa. Segundo as contas feitas pelo professor do ensino secundário Arlindo Ferreira, autor do blogue DeAr Lindo, especializado em estatísticas da educação, são estes os resultados da sétima reserva de recrutamento que ficou concluída nesta sexta-feira.

As reservas de recrutamento são um dos vários mecanismos de colocação de professores, que visam responder às necessidades das escolas que não foram supridas pelo concurso nacional, concluído no final de Agosto, ou que surgiram depois deste. As reservas de recrutamento são lançadas semanalmente e subsistem até 31 de Dezembro.

Até agora, 2016 está a bater recordes na dança de professores. No conjunto, por via do concurso nacional, renovações de contratos e reservas de recrutamento, já foram colocados, desde o início do ano lectivo, mais 19 mil professores contratados para suprir necessidades que o Ministério da Educação continua a definir como temporárias. No ano passado foram menos de 10 mil.

Também o número de colocados neste final de Outubro (as aulas arrancaram nas escolas entre 9 e 15 de Setembro) é mais do dobro do registado em 2012 e bem superior aos 330 que na mesma altura de 2015 foram pedidos pelos estabelecimentos de ensino. Tanto para assegurar horários anuais, como para substituições temporárias de outros docentes, o grupo mais representado neste mapa de necessidades é o do 1.º ciclo do ensino básico. Esta semana, ainda estavam em falta nas escolas pelo menos 101 professores deste nível de escolaridade.

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Directores satisfeitos

Apesar de todos estes números, os responsáveis pelas duas associações nacionais de directores de escolas consideram a situação normal e até bem melhor do que o corrido nos últimos anos. “Não me recordo de outro ano em que a 1 de Setembro tivéssemos nas escolas os professores que pedimos”, frisa Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas. Como está à frente de um agrupamento com contrato de autonomia, Filinto Lima foi um dos 300 directores que teve de lidar com a chamada Bolsa de Contratação de Escola, criada pelo ex-ministro Nuno Crato, que no primeiro ano da sua implementação levou a que no final do 1.º período ainda existissem centenas de professores por colocar nas escolas.   

Também Manuel Pereira, presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares, frisa que no que respeita à colocação de docentes a maioria das escolas tem conseguido “garantir o funcionamento normal logo desde o início do ano lectivo”. Quanto ao número de substituições ainda em curso, diz que esta é uma situação que se repete todos os anos: “Num universo de mais de 100 mil professores a percentagem dos que estão em mobilidade é sempre elevada.”

Sindicatos pedem mais professores no quadro

O que isto quer dizer também, segundo João Dias da Silva, líder da Federação Nacional de Educação, é que continua a não se responder à exigência de base do arranque de um ano lectivo: garantir que todos os alunos estão a ter aulas. E tal acontece, adianta, porque as escolas não têm o número de professores que necessitam e o mecanismo de substituição de docentes de baixa “não responde com eficácia”. “Há sempre pelo menos quatro dias em que os alunos não têm aulas e que se podem transformar em 15 ou mais caso os docentes substitutos não aceitem o lugar”, diz.

Os professores contratados podem recusar o lugar que lhes coube na sorte, embora tal geralmente implique que fiquem impedidos no mesmo ano de concorrer a outras escolas. Também podem denunciar o contrato no final do período experimental, que ronda os 15 dias. Em resposta ao PÚBLICO, o Ministério da Educação lembra que estes são “direitos laborais” dos docentes. Na prática são situações que complicam ainda mais o já intricado puzzle da colocação de professores (ver texto nestas páginas).

Para Luís Lobo, da Federação Nacional de Professores (Fenprof), só há uma solução para todo este imbróglio: dotar os quadros das escolas com o número real de professores de que necessitam, o que implicaria a entrada na carreira de milhares de contratados. “O número de professores no quadro deve ser definido em função das necessidades de funcionamento das escolas”, corrobora Dias da Silva. E entre estas necessidades figura também a da própria escola ter professores em número suficiente para substituir os que fiquem de baixa, acrescenta.

A dotação dos quadros das escolas com mais professores é uma das reivindicações que ambas as federações sindicais vão apresentar ao Ministério da Educação no âmbito das negociações para a revisão da legislação sobre os concursos de colocação de professores, que deverão ter início ainda este mês. Foi pelo menos o que o ministério prometeu, embora por agora, ainda não esteja marcada qualquer reunião. Quanto a eventuais alterações, o ministério refere apenas que “serão equacionadas no contexto das negociações com os parceiros”.

Faltam funcionários

Por agora, directores e sindicatos são unânimes no diagnóstico. Mais de um mês depois do início do ano lectivo, o “grande problema” que subsiste nas escolas é o da escassez de funcionários, os chamados assistentes operacionais, que já levou mesmo ao encerramento de alguns estabelecimentos. Também há serviços, como bibliotecas e bares, que estão fechados em várias escolas por falta de pessoal, acrescenta Dias da Silva, da FNE.

O problema não é novo, mas a situação agravou-se este ano com o regresso às 35 horas semanais de horário de trabalho, que veio pôr em destaque as carências neste sector. O Ministério da Educação já autorizou a contratação de 300 assistentes operacionais, um número que directores e sindicatos dizem ficar muito aquém das necessidades.

“Há quase dez anos que não entra ninguém para o quadro de assistentes e entretanto foram muitos os que se aposentaram”, lembra Manuel Pereira. Luís Lobo, da Fenprof, apresenta as contas feitas pelos sindicatos da função pública: “São necessários mais seis mil assistentes para suprir as necessidades existentes nas escolas.”

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