Entrada de capitais ilícitos na economia portuguesa ameaça segurança do país

"Hoje Bruxelas e o aeroporto belga, amanhã talvez Portugal ou Hungria" foi a ameaça divulgada por um canal de propaganda do Estado Islâmico. Autoridades portuguesas acompanham desde 2013 indivíduos ligados ao Daesh.

Fotogaleria
Fotogaleria

A entrada de capitais ilícitos na economia portuguesa, a par do terrorismo, faz parte dos riscos elencados pelas autoridades no mais recente Relatório Anual de Segurança Interna. O documento foi entregue nesta quinta-feira no Parlamento e diz respeito ao ano de 2015.

Foto

“Ao nível da criminalidade económica e financeira, a análise do período em apreço reforça as preocupações com a integração de capitais de origem ilícita na economia portuguesa, uma vez que a mesma potencia, a prazo, a utilização de Portugal por parte de estruturas criminosas transnacionais enquanto zona de recuo e de apoio logístico”, descreve o relatório, que confirma ao mesmo tempo “o recurso crescente ao outsourcing, por parte de diferentes redes do crime organizado, no que se refere aos serviços de agentes e estruturas facilitadoras do branqueamento de capitais, com capacidade de operar a um nível nacional e internacional”. Ao oferecerem “diversas soluções para a legitimação de fluxos financeiros ilícitos”, estes agentes “dificultam uma identificação clara da origem dos capitais a investir”.

Mas isso não é tudo: no que à circulação de capitais diz respeito, “reforçou-se a tendência para o regresso a metodologias tradicionais, tais como o transporte físico de numerário, bem como a aposta no recurso a sistemas extra-bancários, como as instituições de pagamento e respectivos agentes ou os novos métodos de pagamento de base web”.

A ameaça jihadista

No dia em que a edição online do jornal Expresso noticiou que o Estado Islâmico divulgou uma mensagem com referências a Portugal e à Hungria, o terrorismo surge, no Relatório Anual de Segurança Interna, incluído nas ameaças globais à segurança não despiciendas. "Preocupação acrescida suscita a atracção que a jihad síria exerce sobre os extremistas europeus, entre os quais se incluem cidadãos portugueses ou de origem portuguesa, em função [...] da eficiente máquina propagandística do grupo Estado Islâmico", pode ler-se. Uma atracção cujo sucesso é explicado pelo "recurso a uma narrativa poderosa e simples", mas também pela "excelente compreensão quer das funcionalidades dos media sociais, quer do modus vivendi ocidental" por parte dos terroristas.

"Os resultados alcançados pelos serviços de informações têm permitido rastrear cidadãos nacionais que se deslocam para palcos de jihad com o fito de se afiliarem ao Estado Islâmico, ou à Al-Qaeda, e detectar células relacionadas com o recrutamento de jihadistas ou com a promoção de apoio logístico a grupos terroristas transnacionais", descreve ainda o relatório, segundo o qual as autoridades portugueses acompanham, desde 2013, um grupo de indivíduos de nacionalidade portuguesa e luso-descendentes, que se encontra actualmente na Síria, ligados ao Daesh. No que às estatísticas diz respeito, o balanço é, por enquanto, magro: são oito as ocorrências de terrorismo que surgem registadas em território nacional em 2015, integradas na chamada criminalidade violenta e grave. O balanço estatístico do ano anterior tinha sido ainda de menor dimensão.

"Hoje Bruxelas e o aeroporto belga, amanhã talvez Portugal ou Hungria" foi a ameaça divulgada por um canal de propaganda do Estado Islâmico, na sequência da qual a secretária-geral do Sistema de Segurança Interna, Helena Fazenda, admitiu um reforço das medidas de segurança no país.

"A situação foi conhecida e foram tomadas as medidas de reforço e articulação entre as forças de segurança", disse Helena Fazenda à agência Lusa. “Foram tomadas as medidas de reforço que tinham que ser tomadas, incluindo nos aeroportos, havendo uma articulação de todos as forças e serviços de segurança, incluindo os serviços de informações", acrescentou.

Entretanto, o gabinete de imprensa da ministra da Administração Interna, Constança Urbano de Sousa, informou que as autoridades portuguesas estão a acompanhar a situação, “como fazem com todas as outras que, directa ou indirectamente, façam referência a Portugal ou a cidadãos portugueses".

Extrema-direita cresce

Do lado oposto, e ainda no capítulo das ameaças à segurança nacional, surge, no Relatório Anual de Segurança Interna, aquilo que é designado por “intensificação do activismo político e social de extrema-direita de contestação às políticas migratórias e ao acolhimento de refugiados. Em 2015 “continuou a registar-se um elevado dinamismo ao nível das actividades do movimento skinhead neonazi (concertos, encontros), situação que tem impacto directo no crescimento do número de militantes e de organizações desta matriz ideológica”, refere o documento, explicando que, apesar de estas actividades não se traduzirem em acções violentas, contribuíram para a difusão da ideologia de extrema-direita e para a radicalização dos seus militantes.

No que à espionagem diz respeito, o documento classifica como “notório” o “aumento” desta ameaça nas áreas política e militar, “essencialmente pela necessidade crescente de informação que antecipe as linhas estratégicas do Governo no seio das organizações internacionais que Portugal integra, em especial na União Europeia, na NATO e na Comunidade de Países de Língua Portuguesa”. “Aumentou o risco de recolha de informação sensível sobre a posição portuguesa relativa aos conflitos no Médio Oriente e no Norte de África”, pode ler-se ainda.

Não menos preocupantes, para os autores do documento, são as consequências da espionagem económica para o tecido empresarial português e para as instituições de investigação científica produtoras de conhecimento com elevado potencial económico. Tal como em anos anteriores, o relatório volta a chamar a atenção para o valor dos recursos marinhos portugueses e da exploração do mar, “alvos de potencial interesse para operações clandestinas de recolha de informação sobre recursos naturais ainda não explorados e para a obtenção de conhecimento sobre operadores e parceiros económicos, projectos em curso e seus intervenientes”.

A chamada criminalidade geral registou, no ano passado em Portugal, um acréscimo pela primeira vez em sete anos: houve mais 4721 participações, o equivalente a um aumento de 1,3%. Já no que à criminalidade violenta e grave diz respeito, registaram-se menos 124 participações, o que equivale a uma diminuição de 0,6% — muito embora tenha havido mais assaltos a farmácias e mais queixas por extorsão. Já os roubos a ourivesarias estão em queda: foram participados às autoridades apenas 29 durante o ano passado, um terço dos ocorridos em farmácias. com Pedro Sales Dias

Sugerir correcção
Ler 9 comentários