Crise e direitos humanos na agenda do Papa

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Bento XVI chega a Portugal num momento difícil do seu pontificado Enric Vives-Rubio

D. Carlos Azevedo, responsável pela visita, diz que a pobreza e o desemprego deverão ser abordados.

A atenção aos mais pobres e debilitados da sociedade e a defesa dos direitos humanos, incluindo o direito à vida e ao emprego, deverão ser temas a abordar pelo Papa Bento XVI durante a sua viagem a Portugal, que hoje se inicia e que decorre até sexta-feira. Lisboa, Fátima e Porto serão as cidades visitadas.

Em declarações ao PÚBLICO, D. Carlos Azevedo, bispo auxiliar de Lisboa e responsável pela organização da visita, diz que estes temas deverão ser abordados pelo Papa na tarde de quinta-feira, 13, quando se encontrar com responsáveis das instituições de solidariedade social.

No discurso que pronunciará na Igreja da Santíssima Trindade, em Fátima, o Papa deverá desenvolver "o conceito de atenção aos mais debilitados, aos mais pobres", na linha do que escreveu na sua última encíclica, Caritas in Veritate (Caridade na Verdade), diz o bispo Carlos Azevedo.

Um apelo a que as instituições de acção social da Igreja tenham "uma identidade cristã forte" será também parte da mensagem do Papa Ratzinger neste discurso, acredita o mesmo responsável. Mas Bento XVI não deverá deixar também de pedir a todos os crentes que as diferentes comunidades católicas "tenham consciência" do trabalho dessas instituições e o assumam.

O mesmo discurso deverá ser ocasião para Bento XVI falar da importância de defesa dos direitos humanos. Neste campo, o direito à vida será um dos temas a privilegiar, já que é um argumento sempre caro à hierarquia católica.

Uma "vida condigna" na actual situação de crise económica internacional e o direito ao trabalho num contexto em que o desemprego tem assumido graves proporções em diversos países da Europa - em Portugal, está neste momento nos 10 por cento e em Espanha, a mais alta da União Europeia, situa-se acima dos 20 por cento.

O outro discurso mais voltado para o exterior da Igreja Católica é o que o Papa dirigirá aos agentes culturais, no Centro Cultural de Belém, amanhã de manhã. Bento XVI, que já em Novembro esteve na Capela Sistina, no Vaticano, com 260 artistas de todo o mundo, terá diante de si 1300 convidados de diferentes áreas artísticas.

Neste encontro, aliás, haverá também representantes de outras confissões cristãs e de outras religiões - incluindo do judaísmo e do islão. Académicos, investigadores, actores, pintores, cientistas, escritores, músicos compõem a assistência que ouvirá o Papa falar da importância do "aprofundamento do sentido da beleza e da verdade", diz Carlos Azevedo.

De acordo com responsável da organização da visita, o pensador Ratzinger não deixará de pedir que os artistas "não fiquem na superficialidade e que busquem o mais fundo da verdade e da beleza".

Contestação "atenuada"

Já nas missas que celebrará em Lisboa (hoje, 18h15, Praça do Comércio) e Porto (sexta, 10h15, nos Aliados), as mensagens do Papa deverão privilegiar os católicos como primeiros destinatários. Logo à tarde, em Lisboa, naquela que será a sua segunda intervenção desta visita (a primeira será no aeroporto, logo após a chegada), Bento XVI deverá falar da "radicalidade da vida cristã".

Os cristãos são cada vez mais uma minoria, diz Carlos Azevedo, e o próprio Ratzinger está consciente disso. O que o deverá levar a pedir que sejam "cristãos de corpo inteiro". Um discurso que ficará completo com o do Porto, quando Ratzinger fizer um apelo ao "dinamismo missionário", a uma Igreja com uma "consciência dinâmica muito forte".

A escolha do Porto para uma mensagem deste tipo tem a ver com o programa da Missão 2010, que a diocese está a realizar durante este ano. Um conjunto de iniciativas sob aquele mote está a ser dinamizado nos âmbitos cultural, religioso e social.

Na homilia da missa que celebrará dia 13 em Fátima, onde são aguardadas pelo menos 300 mil pessoas, o Papa deverá falar do tema da alegria. "Atendendo à mensagem da visita, a felicidade de ser cristão numa Europa cansada, que precisa de pacificação interior" pode ser a tónica da intervenção de Ratzinger.

Se este tema se confirmar, Bento XVI repetirá o mote da homilia da missa que presidiu no santuário, já em 1996. Nessa altura, o então cardeal Joseph Ratzinger falou da alegria dada pelo pão e pelo vinho: "O vinho é o símbolo da superabundância da qual também temos necessidade. Ele é sinal da alegria, da transfiguração da criação. Tira-nos da tristeza e do cansaço do dia-a-dia e faz do estar juntos uma festa. Alarga os sentidos e a alma, solta a língua e abre o coração; e transpõe as barreiras que limitam a nossa existência."

Para a Igreja em Portugal, esta visita de Bento XVI pode ser um acontecimento "positivo". "Tudo depende da capacidade que tivermos para continuar com os desafios que o Papa nos deixar e das consequências que saibamos tirar daí", afirma. Quanto à contestação que se fez sentir, num primeiro momento, à estadia do Papa em Portugal, Carlos Azevedo pensa que ela está "atenuada". Pelo menos, a avaliar por aquilo que se passa na blogosfera, diz. "Depois do trabalho de tanta gente, será um momento importante."

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