Cinco sugestões de leitura: da ciência da alma à Síria explicada às crianças

Cinco jornalistas do PÚBLICO deixam cinco sugestões que valem a pena ler na imprensa internacional. A filosofia, a violência, os digests mediáticos, os miúdos espevitados e a vírgula que valia dinheiro.

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Crianças sírias refugiadas brincam em infantário turco, no campo de Elbeyli, em Dezembro de 2016 Umit Bektas/Reuters

 

A ciência da alma de um filósofo ateu

The New Yorker

 

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Bárbara Wong, editora de Life&Style

O início do longo texto de Joshua Rothman na The New Yorker (edição do próximo dia 27 de Março, mas já disponível online) sobre o filósofo Daniel Dennett fez-me lembrar o início do Evangelho de São João. “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus.” Neste caso reza assim: “Há quatro mil milhões de anos, a Terra era um sítio sem vida. Nada lutava, pensava ou queria. Lentamente, isso mudou.” O professor norte-americano, de 74 anos, é ateu e a sua reflexão gira em torno da criação da mente humana, procurando explicar como é que “um mundo sem alma deu origem à alma” e, por isso, olha também para outras disciplinas como a biologia, a neurociência, a psicologia, a linguística e a inteligência artificial. O seu último livro, já publicou uma dúzia, chama-se From Bacteria to Bach and Back e é sobre a consciência. Embora Dennett nunca tenha acreditado em Deus, frequentou a igreja, tem uma irmã que é pastora, e gostaria que os seus filhos tivessem ido à catequese por causa da beleza dos rituais e da música. Pertenceu mesmo a um coro e é com emoção que fala sobre a Paixão segundo São Mateus, de J.S. Bach. O materialismo para ele não é um desespero, mas sim “espiritualmente satisfatório”, quanto às religiões estas não devem ser praticadas, mas sim estudadas. Ler

As histórias por detrás da violência policial na América

Radiolab

 

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Dinis Correia, coordenador de Design Digital

Começou com um projecto de jornalismo de dados: Ben Montgomery, jornalista do Tampa Bay Times, tenta preencher o vazio de estatísticas oficias, a nível nacional, sobre cidadãos atingidos a tiro por agentes da polícia na América. Começa pelo estado da Florida e, depois de anos a contactar autoridades locais, acaba com uma pilha de quase dois metros de altura de relatórios, recortes de imprensa e fotografias. Nessa pilha contam-se 828 casos de mortes ou ferimentos causados pela polícia, entre 2009 e 2014. Insatisfeitos apenas com números, decidem seguir as histórias das pessoas por detrás de alguns desses relatórios. O primeiro episódio de uma série de dois, com a sonoplastia e produção irrepreensível do Radiolab. Ouvir

O melhor de três mundos

Medium

 

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Sérgio B. Gomes, editor de Multimédia

Gosto de começar o dia pelo Medium, uma rede social virada para a palavra mas que não desdenha a imagem. Por aqui consigo ter um olhar alternativo da actualidade (e para o mundo para além da actualidade) feito por pessoas que não são “profissionais” da actualidade. E, se quiser, mesmo à mão de semear, tenho o personalizado daily digest, onde faço uma mistura de histórias que me dão o melhor de três mundos: histórias de profissionais de actualidade (ainda poucas porque os media têm medo que o Medium lhes roube audiência); histórias de vida quotidiana; e histórias que coincidem com os meus interesses. Desde que recebo a newsletter, que chega por volta das 8h, é raro o dia em que não clico numa história. Esta manhã comecei no roteiro cultural sugerido por Manuel Falcão e terminei no texto (bem intermediado por fotografias) de Rian Dundon sobre uma exposição de fotografia em San Francisco, a propósito da cobertura que Jim Marshall fez do chamado “Verão do amor”, quando 100 mil hippies aterraram no bairro de Haight-Ashbury para uma celebração do tipo “sexo, drogas e rock’ roll”. Daí viajei, via Timeline (uma espécie de filho adoptivo do Medium, que promete “ligar os pontos entre o passado e o presente”) para outras três histórias: “Hand-tinted photographs capture Japan on the brink of modernization”; “An entire Manhattan village owned by black people was destroyed to build Central Park”; “Fifty years ago, a teenager wrote the best selling young adult novel of all time”. Gosto de começar o dia pela Medium. Ler

Trocar por miúdos

Libération

 

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Ana Brito, jornalista de Economia

Que as perguntas das crianças são como as cerejas não é segredo para nenhum pai. Atrás de umas vêm outras. E nem todas são fáceis de responder. “O que é que se passa na Síria?” é um bom exemplo de como oito palavrinhas mais um ponto de interrogação nos podem deixar em curto-circuito. Como atribuir algum sentido a toda a crueldade que nos entra diariamente sala adentro, mas que felizmente está lá longe, a milhares de quilómetros de distância? O suplemento interactivo do jornal Libération, Le P'tit Libé, destinado a crianças entre os sete e os 12 anos, pode ser um bom ponto de partida. Quem é Bashar al-Assad? Quem são os seus aliados? O que são extremistas? Quantos mortos fez o conflito? E refugiados? O P'tit Libé troca tudo por miúdos. As explicações são simples e directas, os desenhos e esquemas também e os artigos são ilustrados com fotografias reais, porque nada disto é faz de conta. O P'tit Libé (disponível nas versões impressa e online) já vai na 20.ª edição (a mais recente é sobre as presidenciais francesas) e já abordou temas tão distintos quanto os atentados de Nice ou o europeu de futebol (sabiam que Cristiano Ronaldo “s’aime beaucoup”?). Não dá todas as respostas, mas pode ser o início de uma boa conversa com miúdos espevitados. Ler

A pontuação ganhou

The Guardian

 

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Tiago Pimentel, jornalista de Desporto

Há pontapés na gramática que podem custar caro. Um grupo de trabalhadores do Maine, nos EUA, ganhou em tribunal o direito ao pagamento de horas extraordinárias graças à falta de uma vírgula na lei estadual que listava as actividades não elegíveis para esse benefício. A chamada “Oxford comma”, por vezes também designada como “serial comma”, é utilizada em enumerações, antes do “e” ou “ou” final, para distinguir com clareza aquilo que é enumerado. E a falta dela deu razão a estes trabalhadores. Ler

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