Falta de enfermeiros é que põe em risco vida de doentes, não a eutanásia

Bastonária reafirma que não quis dizer que se pratica eutanásia no SNS, fala-se é do tema "nos corredores dos hospitais". E anuncia que vai pedir redução de vagas nas escolas de enfermagem.

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Ana Rita Cavaco aos deputados: "Vi dois enfermeiros a cuidar de 57 doentes na Madeira" Enric Vives-Rubio

Mais do que de eutanásia, a bastonária da Ordem dos Enfermeiros quis falar no Parlamento sobre a falta de profissionais no Serviço Nacional de Saúde (SNS), esse sim o problema "que está a pôr em risco a vida das dos doentes". Ouvida na Comissão Parlamentar de Saúde nesta quarta-feira, Ana Rita Cavaco lamentou que ninguém fale sobre este assunto, que configura uma "ilegalidade", e voltou a assegurar que não assistiu à prática de eutanásia no SNS e que as suas declarações à Rádio Renascença em Fevereiro não foram reproduzidas na totalidade, acabando por ser retiradas do contexto.

Mas a bastonária também quis deixar claro que a discussão da eutanásia se “faz nos corredores dos hospitais”. “Não estou a dizer que os profissionais o fazem. Estou a dizer que falam [sobre este tema]”, reforçou. “Este é um dos assuntos que tem que ser debatido sem preconceitos. Temos que deixar de discutir estas questões por baixo do pano”, defendeu Ana Rita Cavaco, que adiantou já ter sido ouvida na Inspecção-Geral das Actividades em Saúde no âmbito do inquérito aberto sobre esta matéria, "ainda não concluído". "Sei que há pessoas que não gostam do meu estilo de denúncia pública, mas vão ter que se habituar porque não me vou calar", avisou.

Contornando assim o tema que a levou ao Parlamento a pedido do PS, que quis esclarecer as suas declarações que desencadearam grande controvérsia, a bastonária considerou que, muito mais importante do que a discussão sobre algo que "não disse", é "dizer que faltam enfermeiros para garantir a segurança das pessoas". A Ordem está, aliás, a fazer um levantamento sobre as necessidades de enfermeiros, anunciou, ao mesmo tempo que avançava com exemplos que ilustram as carências: "Vi dois enfermeiros a cuidar de 57 doentes na Madeira." 

Citou, a propósito, dois estudos; um de 2104 (efectuado por um consórcio em que participou a Universidade Católica) que concluiu que, por cada doente acima do que está definido, "a mortalidade aumenta 7%"; e um outro, já deste ano, que indica que, no caso de um enfermeiro ter a seu cuidado seis ou menos doentes, "a mortalidade reduz-se em 6%". Aproveitou ainda para deixar "um alerta" e "pedir ajuda" aos deputados, alegando que os enfermeiros "estão exaustos e à beira da ruptura".

Três euros por hora é "indigno"

Ana Rita Cavaco questionou igualmente a contratação de enfermeiros através de empresas de prestação de serviços, que ganham "milhares de euros do Estado" e chegam a pagar três euros por hora, o que é “indigno”, e pediu aos responsáveis que agilizem os concursos para contratação de novos profissionais.

Revelou ainda que vai pedir ao ministro do Ensino Superior que reduza no próximo ano lectivo as vagas para as escolas superiores de enfermagem, juntando-se assim aos responsáveis da Ordem dos Médicos que nos últimos dias têm vindo a público reclamar a diminuição das entradas nas faculdades de medicina, que dizem ser excessivas para as necessidades do país.


“Uma vez que ainda não estão fixadas vagas para o ensino superior, vamos pedir ao ministro para que, de uma vez por todas, as vagas sejam reduzidas”, disse. Argumentando que é muito elevada a despesa do país com a formação de profissionais, a bastonária sublinhou que “hoje, o número de enfermeiros que saem do país já é superior aos que saem das escolas de enfermagem [por ano]”. “Só em Inglaterra há 12 mil”, rematou.

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