"As pessoas não só usam manuais usados como até pagam por eles"

Secretária de Estado Alexandra Leitão acredita que não há argumentos sólidos contra a reutilização dos livros escolares.

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Alexandra Leitão Rui Gaudencio/Publico

O sucesso da Book in Loop, uma jovem start-up tecnológica de Coimbra que compra e vende manuais escolares usados, demonstra que os portugueses querem reutilizar, diz Alexandra Leitão, secretária de Estado Adjunta e da Educação.

"É uma lição a tirar. Este projecto veio preencher um espaço — fazia falta", disse ao PÚBLICO a adjunta do ministro socialista da Educação, Tiago Brandão Rodrigues. "E isso demonstra uma coisa: as pessoas não só não têm nenhum problema em usar manuais escolares usados, como até estão dispostas a pagar por eles."

Na leitura da secretária de Estado, a adesão e expansão da Book in Loop no seu primeiro ano de vida significa também "que todos os argumentos contra a reutilização — os livros não estão 'em condições', a 'relação afectiva com os manuais que se perde', etc — caem por terra. Se as pessoas até estão dispostas a pagar por um livro usado, por maioria de razão estão abertas a utilizar um livro reutilizado que lhe foi cedido gratuitamente como serviço prestado pela própria escola."

O Estado quer uma reutilização 100% gratuita dos manuais escolares e a Book in Loop, pelo contrário, quer lucrar com a sua reutilização, mas nenhum dos dois antecipa uma rota de colisão a médio prazo. Este ano, o Governo vai oferecer manuais a todos os alunos do ensino público até ao 4.º ano de escolaridade (2016/17, início da nova política pública, abrangeu apenas o 1.º ano do básico) e a Book in Loop só compra e vende manuais usados a partir do 5.º ano. Os universos de alunos não chegam a sobrepor-se.

Mas como será quando o Governo oferecer manuais aos alunos do secundário e já existir em Portugal alguma tradição de reutilização? Ambos imaginam possíveis parcerias.

"Queremos implementar uma forma de reutilização absolutamente gratuita. Um aluno recebe um livro da escola, usa-o, devolve-o e passo-o para o próximo aluno", sublinha Alexandra Leitão. "Mas no futuro não excluo parcerias."

A Book in Loop prevê que é isso que vai acabar por acontecer e que o Estado vai precisar das ferramentas da sharing-economy que a jovem empresa trouxe em 2016 para o sector da educação. "O Estado não vai conseguir fazer a reutilização a nível nacional, para mais de um milhão de alunos, sem aliados", diz João Bernardo Parreira, co-fundador da Book in Loop e, aos 19 anos, CEO da empresa. "Vai precisar de ferramentas. E nós já estamos a testar essas ferramentas." O seu amigo Manuel Tovar, 23 anos, CFO da start-up, acrescenta: "Podemos ser aliados ou parceiros do Estado."

O Governo de António Costa acredita que, a médio prazo, as escolas têm capacidade para serem elas a fazer o trabalho de análise e triagem necessário para a reutilização — "e já há imensas escolas que fazem isso, com a ajuda de professores, funcionários e pais", diz Leitão. "Claro que no futuro — que eu gostava que fosse próximo, mas que não acredito que seja — quando chegarmos ao 12.º ano, poderemos ter de desenvolver estratégias mais específicas." Ou seja, "quando o volume de livros a ser analisado para reutilização for muito elevado", o Estado poderá querer conversar com os projectos que desenvolveram "técnicas mais rápidas para fazer essa análise ". Quando é esse futuro? "O volume de manuais a reutilizar está directamente proporcional à celeridade da implementação da medida da gratuitidade que o Governo consiga. Por sua vez, a celeridade desse gradualismo dependerá do Orçamento do Estado. Neste momento, só posso garantir que em 2017/18 vai chegar a todo o primeiro ciclo. Não posso comprometer com o que vai acontecer em 2018/19."

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