Arquivada investigação à morte de David, que morreu à espera de cirurgia

David Duarte tinha 29 anos. Deu entrada no hospital numa sexta-feira com uma ruptura de aneurisma, mas por falta de equipa a cirurgia foi adiada até segunda-feira. Morreu na madrugada anterior.

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No fim-de-semana não havia as equipas necessárias no Hospital de S. José Pedro Cunha

O Ministério Público arquivou a investigação ao caso do jovem de 29 anos que morreu no Hospital de S. José, em Lisboa, em Dezembro de 2015, enquanto aguardava por cirurgia após a ruptura de um aneurisma cerebral.

Contra os profissionais de saúde e também decisores políticos impendiam suspeitas de homicídio por negligência, tendo também sido averiguados durante este inquérito indícios do crime de recusa de médico, que consiste na recusa da prestação de auxílio pelo clínico em caso de perigo para a vida ou perigo grave para a integridade física.

“Relativamente às responsabilidades políticas e civis ou administrativas por parte de dirigentes e administrações regionais ou sectoriais de ministérios, o Ministério Público entendeu que resultam de acto ou omissão no desempenho de cargo ou função e não de acto ilícito, culposo e punível”, pode ler-se numa nota informativa da Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa, segundo a qual não houve indícios de que nenhuma das condutas médicas em causa tivesse violado as boas práticas clínicas. O inquérito judicial esteve a cargo do Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa.

Quando foi conhecido o caso, o Ministério Público decidiu abrir um inquérito, ao qual se juntou depois a queixa-crime apresentada pela família do jovem.

Em Dezembro, também a Ordem dos Médicos concluiu que não houve responsabilidade médica no caso da morte de David Duarte. O então bastonário da Ordem dos Médicos, José Manuel Silva, explicou que não foi violada a legis artis, insistindo que o problema foi outro: “não havia condições logísticas para no Centro Hospitalar de Lisboa Central [Hospital de S. José] poderem intervencionar o doente mais cedo e a sua situação clínica não permitia a sua transferência para outro hospital”. O antigo bastonário acusa a tutela, por se tratar de um problema de organização.

Deveria ter sido operado de imediato

O doente, de 29 anos, deu entrada no Hospital de Santarém no dia 11 de Dezembro de 2015, uma sexta-feira, com dores de cabeça e paralisado do lado direito do corpo. Após o diagnóstico de uma hemorragia cerebral na sequência de um aneurisma, foi transferido para o Hospital de S. José, em Lisboa, com a indicação de que deveria ser operado de imediato para tentar reverter a situação.

No entanto, como a equipa de neurocirurgia vascular com capacidade para operar este tipo de casos deixou de ter elementos de prevenção aos fins-de-semana, o doente teve de esperar até segunda-feira. A situação agravou-se e acabou por não resistir às sequelas. Morreu na madrugada de domingo para segunda-feira, dia 14 de Dezembro.

A prevenção aos fins-de-semana das equipas altamente especializadas de neurocirurgia vascular estava suspensa no São José desde 2014 e a da neurorradiologia de intervenção desde 2013. São estas as especialidades que poderiam fazer os dois tratamentos possíveis em caso de ruptura de aneurisma cerebral (cirurgia ou embolização através de cateter).

Entretanto, na sequência deste caso, o Ministério da Saúde reorganizou a resposta da Urgência Metropolitana de Lisboa nesta área, que agora é dividida numa escala entre vários hospitais: São José, Santa Maria, São Francisco Xavier e Garcia de Orta.

Contactada pelo PÚBLICO, a advogada da família de David Duarte, Cristina Malhão, disse ter ficado surpreendida com o teor do despacho de arquivamento, uma vez que os seus clientes "nunca falaram em apurar responsabilidades políticas". A família também ainda não avançou com nenhum pedido de indemnização, embora não descarte essa possibilidade. "Mas não faz disso prioridade", prossegue Cristina Malhão, que ainda está a analisar os fundamentos do arquivamento. Caso não concorde com eles, poderá vir a pedir a abertura de instrução, para que um juiz possa analisar se de facto não havia indícios suficientes de crime para levar o caso a julgamento, como entendeu o Ministério Público. 

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