A história da notícia de um avião que, afinal, não caiu

Durante quase duas horas foi noticiada a queda de um avião em Pedrógão, informação que tinha sido confirmada inicialmente por fontes da Protecção Civil, que depois veio afirmar que não havia registo da queda de nenhuma aeronave.

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LUSA/MIGUEL A. LOPES

Durante quase duas horas, pensou-se que tinha caído um avião em Pedrógão Grande. Primeiro um avião, escreveu o PÚBLICO. Depois, segundo outros órgãos de informação, um Canadair. Mas, afinal, não se tinha registado a queda de nenhuma aeronave, mas sim a explosão de uma roulotte. No fim, apenas uma grande confusão, que teve como ponto alto a conferência de imprensa do comandante da Protecção Civil, na qual este afirmava que não tinha conhecimento de qualquer acidente com uma aeronave.

Pouco passava das 17h quando começaram a surgir as primeiras informações sobre a queda de um avião, que, segundo informações recolhidas pelo PÚBLICO, teria caído na Louriceira, concelho de Pedrógão Grande junto à fronteira de Góis. Muitos outros órgãos de comunicação social – nacionais e internacionais – começaram a noticiar a queda de um aparelho que estaria a combater os incêndios.

Pouco depois, surge a informação de que o avião seria um Canadair. Vários jornalistas confirmaram a informação junto de fontes ligadas ao posto de comando de Ansião, onde estavam. Nesta altura, o Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves e de Acidentes Ferroviários (GPIAAF) tinha indicado à agência Lusa que tinha sido informado da queda de uma aeronave.

Associada a esta informação estavam relatos de uma explosão e de uma bola de fogo. Fonte da Autoridade Nacional da Protecção Civil confirmou à agência Lusa que tinha caído um avião Canadair que estava no combate ao incêndio e que estaria a caminho do local um helicóptero do INEM.

As dúvidas começaram a surgir também sobre a origem da aeronave, uma vez que estavam no terreno aviões franceses, espanhóis e italianos, sendo que Portugal não possuiu aviões Canadair — apesar de ter contratado o serviço destes aparelhos.

A agência EFE adiantou que o avião que tinha caído não era espanhol, uma informação confirmada depois pela própria Força Aérea de Espanha. As informações contraditórias começam aqui quando fonte da Protecção Civil adianta à Lusa que o Canadair que caiu não era nenhum dos contratados por Portugal.

Enquanto a confusão adensa, o Ministério da Administração Interna remeteu as explicações para mais tarde – e nisto tinha passado quase uma hora desde as primeiras informações. A localização da queda do aparelho foi actualizada perto das 18h, sendo que o avião teria caído no pinhal entre as localidades de Louriceira e Ouzenda. A GNR não deixava nenhum jornalista chegar àquela zona. Fonte da Protecção Civil disse ao PÚBLICO que ainda não tinha sido possível confirmar qual era o Canadair que tinha caído.

Para além das informações contraditórias e confusas, o primeiro sinal de que algo não estava bem veio de Jorge Gomes, secretário de Estado da Administração Interna, que quanto a esta questão disse aos jornalistas: “Não confirmo”.

Já perto das 19h, fonte da Protecção Civil garantiu depois ao PÚBLICO que nenhum avião de combate aos incêndios teria caído, apesar de ter confirmado a informação contrária algum tempo antes. Os aviões de combate ao incêndio “foram todos contactados e estão operacionais”. Surge, no entanto, uma nova informação adiantada pela mesma fonte que diz que nada garante que não possa ter caído outro qualquer aparelho.

Estava marcada para as 19h a conferência de imprensa para novo ponto da situação. Vítor Vaz Pinto, comandante da Protecção Civil, reforçou a informação que tinha sido dada ao PÚBLICO de que não tinha conhecimento da queda de um avião, ainda que tenha sido lançada uma operação de busca e salvamento após a notícia, mas sem qualquer confirmação da queda.

Vítor Vaz Pinto fez saber durante o briefing que se registou uma explosão numa roulotte abandonada, que teria botijas de gás no seu interior, e que o seu rebentamento poderia estar na origem dos relatos sobre a suposta queda da aeronave. O avião que não caiu pode ter sido, afinal, uma roulotte abandonada. As botijas de gás que estavam no veículo podem justificar os relatos de explosão e de bolas de fogo que muitos viram.

Ao PÚBLICO, testemunhas no local confirmaram terem avistado a queda de um avião. Horas depois, confrontadas com a certeza de que nenhum aparelho tinha caído na zona, a reacção foi de negação: "O avião caiu mesmo! Alguém tem de estar a mentir". Pouco tempo depois confirmou-se no local a origem da explosão.

A explicação desta confusão poderá estar na geografia do local. As aldeias Louriceira e Ouzenda, ambas do concelho de Pedrógão, ficam a vários quilómetros de distância por estrada. Em linha recta, porém, são vizinhas e implantadas num terreno que desce até uma parte larga do rio Unhais, onde os Canadair abastecem de água. O reabastecimento de um destes, que desaparece da linha de visão de quem se encontra na estrada, poderá ter coincidido com a explosão justificando o facto de tanta gente ter "visto" um avião a cair.

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