A rainha do mundo

Nunca tinha visto uma ave de rapina. Agora é raro e triste o dia em que não dê com uma ou duas nos meus passeios.

Nunca tinha visto uma ave de rapina. Agora é raro e triste o dia em que não dê com uma ou duas nos meus passeios. Se calhar, sem saber, procuro-as em certas horas nada secretas, nos campos de onde teimosamente não saem.

Há pessoas que trabalharam muito para que estas aves voltassem a estas terras e nelas ficassem. É bom ver que, por uma vez na vida, contra todas as nossas tendências destruidoras, o dia de hoje é mais rico do que o de ontem.

Os peneireiros pairam tão imobilizados que, ao longe, parecem drones. Enganam-nos como enganam as presas. Há também falcões-peregrinos. Caem à maior velocidade de qualquer animal, acelerando cada vez mais, até agarrarem o pobre bicho que surpreenderam completamente.

Na segunda-feira parámos para fotografar uma das duas águias de Bonelli que já todos conhecem e acarinham. Ela levantou voo — chateada, claro, mas  faria o mesmo só para exibir o recorte dramático das asas contra o céu azul e frio de Janeiro — e foi pousar noutro poste. Assim aconteceu quatro vezes.

Nós só tínhamos a estrada. Ela tinha toda a serra de Sintra, os prados, as colinas e os mares do Cabo da Roca — mas recusava-se a sair da linha dos postes. Fez bem. Enchia a alma saber que ela estava ali confortável, com uma indiferença majestática, sem medo do inimigo humano. Aquela era a coutada de caça que lhe pertencia. Por que raio havia ela de se mudar ou de se aborrecer?

Há organizações maravilhosas a que devemos agradecer este resultado. Não é uma sorte: é uma missão. Tornemo-la nossa também.

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