Julgados de paz anseiam por mais trabalho

Um ano depois da criação dos julgados de paz, um largo número de pessoas continua sem saber o que são e para que servem. A divulgação acerca do funcionamento, das competências e da forma de acesso aos julgados de paz ficou muito aquém da necessária. Entraves de ordem burocrática têm ainda limitado a realização do principal objectivo a que se propõe esta nova forma de exercício da justiça: a celeridade e a proximidade com o cidadão. Como estes tribunais têm competência territorial e as petições iniciais dos litígios não especificam as freguesias em que ocorrem, as secretarias dos tribunais judiciais não remetem os processos para os julgados de paz, como deveriam, explica João Chumbinho, um dos juízes do julgado de Lisboa.Esta lacuna parte de quem elabora a petição inicial. "A informação e sensibilização dos próprios operadores judiciários para este aspecto é muito importante", considera Ascensão Arriaga, também juiz em Lisboa. Os processos relativos a litígios de menor gravidade continuam, assim, a acumular-se nos tribunais de pequena instância cível. Os dados mais recentes (estatísticas da Justiça) revelam que, em 2001, se encontravam ali cerca 500 mil processos pendentes. Simultaneamente, os julgados de paz apreciam muitos menos processos do que seria possível e desejável. "Estamos desejosos de ter mais trabalho", dizem os juízes. Em Lisboa, deram entrada, até agora, 123 processos, cem dos quais já foram resolvidos, segundo os juízes ali colocados. Destes processos findos, cerca de 70 foram solucionados por acordo obtido, quer na fase de mediação, quer na de julgamento.A acrescentar aos processos entrados em Lisboa, foi registada a entrada de 87 processos no Seixal, 55 em Oliveira do Bairro e 75 em Vila Nova de Gaia. Mas, segundo apurou o PÚBLICO, teria existido capacidade para apreciar um número mais elevado de acções. "O problema é que ainda há muita gente que não sabe que é muito mais simples e rápido recorrer aos julgados de paz", diz João Chumbinho. "Estamos perante um problema de falta de informação", afirma. Apesar destas dificuldades, tanto a filosofia como o balanço da actividade dos julgados de paz são considerados positivos, quer por parte dos operadores judiciários como por muitos dos cidadãos que ali têm acorrido. E é precisamente tendo por base essa aceitação que o Ministério da Justiça decidiu anunciar a criação de mais seis julgados de paz, quatro dos quais em Vila Nova de Poiares, Castelo Branco, Esposende e Terras de Bouro. O Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz (presidido pelo juiz conselheiro [jubilado] Cardona Ferreira), criado para acompanhar a instalação e funcionamento dos quatro julgados experimentais existentes desde o início de 2002, já defendera que os julgados deviam ser competentes em novas áreas, como a laboral, declarativa cível, executiva e penal.Em projecto está também a ideia do alargamento desta experiência às regiões autónomas dos Açores e da Madeira, bem como o alargamento das competências territoriais. Em Lisboa, esse alargamento verificar-se-á às freguesias de S. Domingos de Benfica, Campo Grande, S. João de Brito e Alvalade. Num relatório de recomendações do conselho de acompanhamento dos julgados à Assembleia da República, elaborado em Junho do ano passado, referem-se como principais problemas o "escasso número" de julgados de paz e as "limitadas áreas territoriais, mesmo nos iniciais quatro municípios".O julgado de paz de Oliveira do Bairro é o único que abrange todo o município. O de Lisboa inclui apenas as freguesias de Benfica, Carnide e Lumiar e o do município do Seixal inclui Seixal, Paio Pires e Arrentela, esquecendo a freguesia da Amora. Também em Vila Nova de Gaia há freguesias de fora da área do julgado de paz, que abarca apenas Avintes, Crestuma, Lever, Olival, Sandim e Pedroso."Estas limitações geográficas são potencial factor de perplexidade dos cidadãos, designadamente desigualando as suas possibilidades no mesmo município, e não permitem adequada rentabilização das potencialidades dos Julgados de Paz", criticam os membros do Conselho no seu relatório.

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