Cocaína está a ganhar terreno em Portugal

Pela primeira vez, a cocaína, "em tempos considerada a droga dos ricos", está a ser vendida a um preço inferior ao da heroína. Segundo Fernando Negrão, presidente do Instituto da Droga e da Toxicodependência (IDT), vários elementos policiais e judiciais apontam para a importância crescente desta substância, que tende "a tomar o lugar da heroína". Este é um dos dados do relatório anual do IDT sobre "A situação do país em matéria de droga e toxicodependências, divulgado ontem."A cocaína vem nos últimos anos a aumentar a sua importância relativa no conjunto das drogas", lê-se no documento. São prova deste facto as quantidades apreendidas desta substância, que "ocuparam o terceiro lugar no ranking da década" e uma importância crescente confirmada ao nível das interpelações policiais e condenações por tráfico e tráfico-consumo, refere o documento, relativo a dados de 2002. O presidente do IDT afirma que a cocaína (que, tal como a heroína, também pode ser injectada, inalada ou fumada) parece estar a tomar o lugar da heroína, o que é notório nos seus preços de venda cada vez mais acessíveis: cada grama custa 38,57 euros enquanto a heroína é vendida a 43,78. Esta importância crescente reflectiu-se também ao nível do número de mortes associadas ao consumo de drogas. "Em 2002 verificou-se um acréscimo da importância relativa da cocaína", uma vez que a substância foi detectada em 44 por cento das 156 mortes (um número ainda assim inferior às 280 mortes verificadas em 2001) relacionadas com o consumo de drogas; o negro recorde continua a caber à heroína (69 por cento) e em 13 por cento associou-se ao consumo de cannabis.Embora esta última seja a substância mais consumida entre a população portuguesa, o ecstasy "continua a aumentar a sua visibilidade", registando um aumento de 16 por centro no número de apreensões e uns exponenciais 76 por cento nas quantidades apreendidas, "os valores mais altos da década", lê-se no documento. O grau de prevalência do ecstasy na população escolar do 3º ciclo (estudo realizado em 2001) põe-a com níveis por vezes semelhante à heroína e cocaína, uma evolução que Negrão considera "preocupante", até porque não tem ainda tradução nas ofertas de tratamento. O responsável do IDT reconhece que as ofertas estão viradas para o tratamento de heroinómanos e que tem que haver uma crescente articulação com os serviços de medicina mental, admitindo que já há consumidores jovens destas drogas sintéticas com distúrbios mentais devido ao consumo da substância. Ao nível das mortes, no ano passado registou-se apenas uma morte associada ao MDMA (designação cientifica do ecstasy), em conjugação com opiáceos. Em 2001 tinham surgido pela primeira vez quatro casos de mortes em que foi detectada esta substância, todos eles em associação com o álcool.Comissões de disuasão com balanço positivoO relatório faz um balanço positivo da actuação das comissões de dissuasão da toxicodependência, que resultaram da descriminalização do consumo de drogas até certa quantidade. O seu potencial, segundo Negrão, demonstrou-se em duas frentes. Em primeiro lugar, "na contenção de consumidores em início de percurso": dos 5580 processo de contra-ordenações por consumo de drogas, a maior parte disse respeito a não-toxicodependentes, predominando os casos ligados ao haxixe (57 por cento) e sendo os indiciados mais jovens que no ano anterior (predomina o grupo dos 16 aos 34 anos). Em segundo lugar, o responsável realça o trabalho positivo realizado pelas 18 comissões (uma por distrito) no encaminhamento para tratamento, admitindo no entanto deficiências ao nível da articulação com os centros de atendimento a toxicodependentes, que têm que ser melhorados em futuras alterações à lei. A avaliação deste processo decorre no próximo ano, mas na sua opinião o projecto deve continuar.

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