Quando o fado cabe dentro de uma caixa

  • De dentro de caixas, máquinas e artefactos de todo o tipo saem guitarradas inconfundíveis. É o fado enquanto música mecânica que está em exposição no Museu do Fado até final de Setembro.

    Dá-se à manivela umas quantas vezes e já está, o encantamento começa logo de seguida, quando o som mágico é libertado de dentro da caixa de música. Há-as para todos os gostos e sonoridades, de todas as formas e feitios. O fado, claro, não poderia estar ausente destes instrumentos de música mecânica e o Museu do Fado dedica-lhe uma exposição entre os dias 31 de Maio e 30 de Setembro.

    “O Maravilhoso Mundo da Música Mecânica” é o nome da exposição que reúne dezenas de dispositivos de música automática, todos eles com uma particularidade – silêncio que dali de dentro vai soltar-se o fado. Caixas de música, autómatos, realejos, pianolas, fonógrafos e outros objectos variados, todos podem ser – e são-no nesta colecção – receptáculos de fado, capazes de o reproduzir quando um mecanismo é accionado. O convite para viajar nesta melodia é feita pelo Museu do Fado que expõe peças do Museu da Música Mecânica (MMM), numa parceria que homenageia a originalidade de conter sons em objectos magníficos – autênticas obras de arte. Uma espécie de gadgets tecnológicos ancestrais produzidos numa altura em que a inovação residia no mecanismo criado para a reprodução do som.

    Paixão de infância

    Os objectos que o Museu do Fado expõe agora pertencem à colecção de Luís Cangueiro, o fundador e responsável pelo MMM, que se dedica há mais de três décadas a reunir peças para alimentar a sua paixão de infância, literalmente. É que o coleccionador nasceu ao lado de uma peça de música mecânica, em Miranda do Douro, há 75 anos. A mesma peça que acabaria por estragar uns sete anos depois para ver como funcionava. Mais tarde, talvez para tentar reparar os efeitos da curiosidade infantil, adquiriu algumas peças similares. E terá sido este seu gesto que esteve na génese do movimento de colecta que perpetua até ao presente, para deslumbre dos visitantes. Isto porque todas as peças (sem excepção) funcionam, permitindo ouvir música através de caixas repletas de história – não só relacionada com o próprio objecto como também com a melodia que o mesmo guarda.

    Remonta ao século XIX o florescimento da indústria da música mecânica na Europa, estendendo-se pelas primeiras décadas do século XX. O segredo do processo assenta no mecanismo utilizado, que permite a produção automática do som, dependente ou não de intervenção humana.

    No final do século XVIII, em 1796, o relojoeiro suíço Antoine Fabre criou a primeira caixa de música de cilindro metálico e, quase um século depois, em 1885, o alemão Paul Lochman produziu a primeira caixa de música de disco metálico. A Alemanha e a Suíça, mas também a França e os Estados Unidos da América destacaram-se na produção destas peças. Portugal nem por isso, mas isso não impede que na colecção de Luís Cangueiro constem objectos com mornas de Cabo Verde, o próprio Hino Nacional e muitos fados. São precisamente estes últimos que podem ser agora descobertos e ouvidos no Museu do Fado, em visitas guiadas diárias, numa viagem única pelos mecanismos do fado.