Linha Internet Segura

Ameaças num canal de YouTube, insultos e humilhação no Instagram

Quatro casos de ciberbullying denunciados através de telefonemas para o 800 219 090, um serviço que a APAV passou a coordenar em 2019. “Faz delete ao cyberbullying!” é o tema de um seminário, em Lisboa, a 11 de fevereiro, Dia da Internet mais Segura.

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PAULO PIMENTA

Como tantas vezes acontece, foi a mudança de comportamento da filha — andava triste, cabisbaixa, evitava o computador e não tinha vontade de ir à escola — que fez desconfiar que algo não estaria bem. Confrontada pelo pai, contou. Uma colega desentendera-se com ela por causa de um canal de YouTube (cada uma delas tinha um); e como represália divulgara um vídeo a pedir aos seus seguidores que lá fossem “largar hate”. O pedido foi prontamente acatado por vários deles, que começaram a insultar a outra pré-adolescente, nos comentários do respetivo canal, havendo mesmo quem “largasse” ameaças de morte.

Quando foi posto ao corrente do que se estava a passar, o pai da visada ligou para a Linha Internet Segura, coordenada pela APAV – Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, a pedir ajuda. Neste caso, contado ao PÚBLICO na Escola pelo gestor operacional da linha, Ricardo Estrela, a intervenção passou por vários momentos, desde o apoio psicológico, numa fase inicial, até à denúncia do vídeo instigador e dos comentários a que este deu origem. “Expusemos a situação, explicando por que violavam os padrões de comunidade do YouTube. Fazemos parte da rede de Trusted Flaggers, o que garante que quando o conteúdo é reportado, é removido com mais facilidade”, explica. Assim aconteceu. 

Também no mundo offline o processo desencadeado perante a denúncia “surtiu efeito”, tendo a escola, na Grande Lisboa, assumido um papel decisivo. “A diretora de turma fez uma ação de sensibilização com os alunos da turma em causa”, concretiza Ricardo Estrela. “Houve muita compreensão por parte dos colegas, havia aliás outros que também sofriam de bullying” e que portanto conseguiram rever-se no que a colega estava a sentir.

Por telefone ou formulário

Este foi um dos quatro casos de ciberbullying reportados, no último ano, através do número 800 219 090. A Linha Internet Segura, disponível através do número 800 219 090 e do e-mail linhainternetsegura@apav.pt, é operacionalizada pela APAV desde janeiro de 2019, altura em que a associação passou a integrar o Consórcio Internet Segura, coordenado pela FCT – Fundação para a Ciência e Tecnologia e do qual fazem também parte a Direção-Geral da Educação, o Instituto Português do Desporto e Juventude, a Fundação Altice e a Microsoft Portugal. Está também acessível através de formulário, para quem quiser pedir um esclarecimento ou denunciar conteúdos ilegais online. O serviço é gratuito e confidencial.

O balanço deste ano de atividade, que registou mais de 800 processos de atendimento e apoio, é apresentado na terça-feira, 11 de fevereiro, Dia da Internet mais Segura 2020, num seminário em Lisboa, com o tema “Faz delete ao ciberbullying!”.

Três dos telefonemas relacionados com ciberbullying recebidos na Linha Internet Segura partiram de familiares das vítimas. Para além daquela cujo pretexto era um canal de YouTube, as duas restantes situações contadas por elementos da família das vítimas envolveram fotos no Instagram: num caso associadas a mensagens racistas, divulgadas num grupo de uma equipa de desporto, noutro para insultar e humilhar uma aluna de uma escola privada de Lisboa. O quarto caso chegou ao conhecimento dos técnicos da APAV por iniciativa de um aluno de 10 anos, que ligou durante um intervalo das aulas; um rapaz com quem falava num chat tinha começado a enviar-lhe fotos em que aparecia nu, o que estava a causar grande desconforto e dúvidas acerca de como pedir para parar. 

No início do ano letivo, o Ministério da Educação lançou um plano de combate ao bullying nas escolas. “Escola Sem Bullying. Escola Sem Violência” é apresentado “como um auxiliar de apoio, com vista à utilização de diferentes abordagens de prevenção e intervenção face a este fenómeno, de modo a incentivar, reconhecer e divulgar práticas de referência. O ciberbullying, aqui também contemplado, “consiste em humilhar, excluir ou até agredir alguém, de forma repetitiva e sistemática, através de ações virtuais”. São várias as formas de fazê-lo, com recurso à Internet e a conteúdos de fotografia, de vídeo, de áudio ou de texto. As consequências do ciberbullying nas vítimas “são idênticas às do bullying”.

Já este ano, no final de janeiro, foi noticiada a criação do Observatório Nacional do Bullying, da responsabilidade da Associação Plano i, para denúncia de casos em contexto escolar. E o Capítulo Português da Internet Society e o Projeto MiudosSegurosNa.Net divulgaram a campanha "ePrivacidade Trocada por Miúdos".