Vamos todos recontar?

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Miguel Albuquerque, conhecido criador de rosas*, advogado e delfim traidor do jardinismo madeirense**, teve esta semana de acrescentar umas linhas ao seu slogan eleitoral: Sei que posso contar com vós, com o vosso voto em nome da Madeira… mas agora é recontar esta porcaria outra vez que vai para aí uma confusão maior do que comício no Chão da Lagoa.

O novo presidente do Governo Regional (nascido no Funchal a 4 de Maio de 1961) tem a oportunidade histórica de aplicar a sua renovação e o novo ciclo. A Madeira, a partir de Março de 2015, pode exportar mais do que bananas, vinho generoso, poncha de maracujá, dívidas gigantes, abismos, túneis alpinos, poetas obscuros, líderes em cuecas e melhores jogadores do mundo com um alto nos calções.

A ilha vai levar ao mundo um novo tipo de erros eleitorais, volte-faces e suspeitas de fraude. Desde as eleições americanas de 2000 — quando George W. Bush endrominou Al Gore no voto popular — que não se via isto. A Madeira ameaça ser a próxima superpotência mundial das eleições-macacas! Devemos felicitar mais este contributo ilhéu para o prestígio da nação, e se Alberto João Jardim, como agora ameaça, avançar para um partido de nome FAMA para reestimular, cacofonicamente, o passado bombista da FLAMA, vai ser ainda mais empolgante.

Já esquecíamos Porto Santo. Ao contrário do que pensa a Comissão Nacional de Eleições (CNE), Porto Santo não é a ilha da série Lost (Perdidos): os seus eleitores existem, estão talvez sonâmbulos, mas ainda comem ananás e anonas e não caíram despassarados de nenhum avião. As eleições da Madeira, é verdade, dão boa ficção científica: no domingo, oficialmente o PSD tem maioria absoluta (24 deputados); na terça-feira à noite, o PSD perde a maioria absoluta (a recontagem dá três deputados à CDU, em vez de dois); duas horas depois, o PSD reganha 24 lugares e a maioria absoluta! Funchalenses, machiquenses, etc.: um erro informático esqueceu-se daquele sítio onde passamos Agosto na praia.

Foi erro crasso e indesculpável, admitiu a CNE. Mas a um porta-voz da CDU vieram reminiscências de antigas chapeladase disse na televisão, à saída furiosa de uma sala:

— Qual erro informático. Saímos daqui e desaparecerem dez votos [da CDU]!

E acrescentou coisas que o Tribunal Constitucional e, apetece-nos dizer, a Polícia Judiciária terão de investigar a fundo: Agora não vamos aceitar de braços cruzados esta decisão que agora foi tomada por um senhor presidente da Comissão Eleitoral, ou da comissão de resultados, que fazia questão que houvesse sempre as actas a serem as primeiras a serem reconhecidas em relação a qualquer outro resultado, e houve actas onde, por exemplo, o PSD tinha 48 votos e concluíram que havia 148, há coisas muito estranhas nestes resultados. Caro militante do Partido Comunista, de estranho não tem nada: houve um gabiru que acrescentou uma unidade (1) à esquerda do número de votantes do PSD, é isso o que o senhor está a dizer. É mais um exemplo do óbvio ululante inventado pelo brasileiro Nelson Rodrigues e tantas vezes (e bem) citado pelo madeirense Vicente Jorge Silva ao fundar o PÚBLICO.

O curioso é que, pisando os caquinhos do PS e os sustos cardíacos do PSD (maioria, não maioria, maioria, Nossa Senhora do Monte que nos salve), surgiu, lá do outro lado da membrana do Tempo, o berro do costume. Alberto João Jardim acha que as últimas eleições demonstram que Portugal caiu no basismo e que a CNE é inútil e inconsequente. Conseguiu assim, depois de não ter felicitado Miguel Albuquerque (apenas se mostrou aliviado no domingo por se manter a maioria absoluta do partido), virar-se outra vez contra o arqui-rival. O ex-presidente da Câmara do Funchal que há muito se apresentou ao eleitorado como o negativo de Alberto João Jardim em termos democráticos. Ele queria libertar a Madeira de um conjunto de atitudes e arrogâncias que nos últimos anos levaram a um desgaste acelerado junto do eleitorado tradicional. Resposta na altura de Jardim: o advogado Albuquerque tinha ligações à maçonaria, aos interesses da Madeira velhae aos aliados de Lisboa que atraiçoam o povo madeirense.

Rapazes da Madeira, relax... Um dia, este triste caso acabará dissolvido no mar onde brilha a Pérola do Atlântico. Tranquilos. Cuidado com o vírus dos cruzeiros trazido pelos turistas, dá diarreias e cefaleias, desinfectem sempre as mãos. Subam ao Pico do Arieiro, ainda terá neve? Passeiem numa levada entre laurissilvas, vão a uma lição de abismo no cabo Girão (580 metros!), comam lapas em Porto Moniz. Nas artes — perdoem a agenda pessoal, mas é cultura e cá vai — subam à Rua do Quebra-Costas, onde aliás nasceu o Alberto João, e vejam uma exposição plástica na histórica Galeria Porta 33, guiados pela Cecília e o Maurício. Revejam os melhores colóquios do Festival Literário da Madeira, é ligar para a organização na editora Nova Delphi e falar com o Vítor Sousa, rapaz que pouco dorme.

Vamos calmamente esperar pela recontagem da recontagem, a recontagem da recontagem da recontagem, e a recontagem da recontagem da recontagem da recontagem.

* Quem não gostaria de ter junto à lareira um exemplar de Roseiras Antigas de Jardim (Alêtheia Editora, 2006)? Aliás, quem não gostaria de ter uma lareira, mesmo sem um livro para ver os bonecos?

** Respeitamos a opinião de Alberto João Jardim, mesmo que ele não respeite a de ninguém

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