Terrorismo – a Miopia de uma Sociedade Reativa

Infelizmente, a dor que os acontecimentos de Barcelona nos fazem sentir será repetida recorrentemente, numa sociedade que durante uns dias comentará cada novo atentado.

Os hediondos ataques centrados em Barcelona vieram reavivar (como recorrentemente sucede e continuará a suceder) a atenção mediática e popular sobre o flagelo repugnante do terrorismo. Como é usual nestas situações, os noticiários enchem-se com comentadores que predominantemente têm origem nuns poucos círculos de amigos lisboetas da comunicação social. E, naturalmente, todos esses comentadores, jornalistas e entrevistados sabem tudo, perceberam tudo – depois de tudo ter acontecido. Mas muito poucos (que, não surpreendentemente, apesar de umas escassas exceções, não são aqueles que aparecem) têm sido capazes de prever e antecipar os tipos de ataques que virão a ocorrer algures, diferentes e muito mais dramáticos. Porque é isso que é difícil, mas é essa capacidade de antevisão estratégica que é vital na luta contra o terrorismo. Vivemos numa sociedade reativa que se alimenta mediaticamente do drama, em lugar de uma sociedade proactiva com uma visão estratégica do que virá em seguida. Contudo, só a lúcida consciência do futuro que se aproxima permite prepararmo-nos para as tendências que ainda não nos atingiram em vez de eternamente reagirmos ao que já sucedeu na véspera. Obviamente, esses são mais ouvidos no estrangeiro, mas é justo reconhecer que membros de sucessivos governos de todas as áreas partidárias têm dedicado atenção a esses (outros) especialistas.

Embora o terrorismo não se esgote na sombra do islamismo, sejamos claros ao sublinhar que, como a esmagadora percentagem dos atentados o demonstra, falamos essencialmente do terrorismo que invoca o Islão. Não se trata de intolerância religiosa. Tenho imensos amigos nos países muçulmanos e todos sabem como sou extremamente tolerante. Mas, por mais incómoda que ela seja para alguns na Europa, a verdade é que existe um esmagador padrão de implantação de terroristas na população islâmica, muitíssimo mais que no resto da população. São esses radicais islâmicos os intolerantes, os xenófobos. É inadmissível que continuemos, complexados, numa posição defensiva com o pavor de assumirmos o combate que (esses) nos impõem.

E, neste país demagogicamente obcecado em “exigir responsabilidades” de tudo e mais alguma coisa, talvez seja interessante começar a atribuir responsabilidades a todos aqueles que, por preconceito ideológico, não aceitam que se apontem padrões de criminalidade terrorista a comunidades muçulmanas radicais e a núcleos de imigrantes “refugiados” que se deixou entrar sem critérios, nem método, nem controlo, sem ter a coragem se separar o trigo do joio. Temos que acolher com muito carinho os verdadeiros refugiados, após identificados e separados os que vêm para nos agredir e para nos impor valores que não rejeitamos em absoluto. Quem assim pensou com pedantismo pseudo-intelectual é de certa forma co-responsável por esta revigorada onda de ataques que chacinam inocentes, e que ainda mal começou. As convulsões mais perigosas ainda não são estas.

Podemos erradicar o “Estado Islâmico” territorialmente do seu território de implantação na Síria e no Iraque, como fizemos no passado com a al-Qaeda no Afeganistão. Mas essa vitória militar não erradica a ideias quase demoníacas das mentes de muitos radicais islâmicos em toda a Europa. Esta é uma guerra essencialmente ideológica e para a vencermos necessitamos de ações muitíssimo específicas por parte da imensa comunidade de muçulmanos moderados e pacíficos que, apesar de condenarem ritualmente os radicais nestes momentos de drama, na verdade têm imenso medo de os enfrentar consistentemente. Os moderados têm mesmo que assumir essa sua vertente de luta contra os radicais que mancham o Islão, sob pena de, um dia, uma sequência de eventos dramáticos nos arrastar (não muçulmanos e islâmicos moderados) para disseminados confrontos aterradores em ruas e cidades europeias.

O preciso tipo de devastador ataque realizado pela al-Qaeda em 11 de Setembro de 2001 nos Estados Unidos foi previsto 6 anos anos numa reunião internacional ocorrida em Portugal com representantes oficiais de cerca de 3 dezenas de países. Esta nova tipologia de ataques que pavorosamente se generalizou na Europa e no mundo desde então foi também analisada numa reunião com os principais responsáveis da segurança portuguesa e na qual se fizeram representar 3 ministros. No estrangeiro múltiplas discussões foram realizadas em torno dessas análises centradas em Portugal. Há 22 anos, também numa reunião que agregou representantes de muitos países e da NATO, a partir de Portugal foi sublinhada a previsibilidade de, a prazo, a partir do Norte de África, se desenvolverem estratégias terroristas no seio da Europa, precisamente com os contornos que temos tristemente presenciado.

No momento em que estas linhas são escritas (domingo) prosseguem as investigações preliminares dos atentados de Barcelona. Parece consistente a tese das autoridades espanholas, de que a célula terrorista envolvida nestes atentados foi totalmente desmantelada. Mas as investigações em Ripoll revelarão provavelmente o centro conceptual destes atentados e a análise forense da moradia que explodiu em Alcanar, apesar de complexa e morosa, deverá ser reveladora de que, na realidade, esta célula estava ligada a uma rede mais extensa e perigosa. O fabrico de um explosivo como o TATP não parece ao alcance dos conhecimentos de qualquer dos membros desta célula e provavelmente também essa influência terá chegado do exterior através de Ripoll. A explosão prematura na moradia ocorreu numa fase em que estes terroristas não tinham ainda tentado apagar os vestígios que certamente teriam eliminado se a sua estratégia bombista tivesse sido terminada com uma destruição ainda pior que a de Barcelona. Quando se coligir uma maior informação sobre essa planificação abortada chegaremos talvez à rede que ainda se investiga, muito mais perigosa e presumivelmente ligada a outros atentados em preparação algures.

Por outro lado, não é correto que o ISIS tenha literalmente reivindicado o atentado. Esta organização costuma ser muito rigorosa nas frases que escreve neste tipo de comunicados após atentados. Neste caso, o documento divulgado considera que os autores destes atentados eram “soldados” da causa jihadi mas não explicita a autoria pelo ISIS enquanto organização. Este tipo de terminologia costuma ser utilizado em atentados que, na realidade, o ISIS não preparou mas cujos autores o invocam como inspiradores. Neste caso, a terminologia é estranha se existir uma rede para além da célula desmantelada, porque seria improvável que essa rede estivesse autonomamente a organizar uma série de atentados bombistas sofisticados. Existe nesse ponto algo que, para nossa segurança, temos de compreender muito rapidamente.

Infelizmente, a dor que os acontecimentos de Barcelona nos fazem sentir será repetida recorrentemente, numa sociedade que durante uns dias comentará cada novo atentado. Sem uma estratégia realmente inteligente e proactiva. Por esse motivo, vamos reviver estes momentos, muitas vezes. E, em cada novo drama, por uns dias as televisões estarão cheias de comentários dos mesmos de sempre.

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