PSD e CDS admitem criar outra comissão sobre a Caixa

Pressão recai também sobre Marcelo Rebelo de Sousa, por intervenção de João Galamba. Costa dá o caso dos SMS da CGD por encerrado.

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Matos Correia demitiu-se por considerar que a esquerda impediu trabalho da CPI de forma irregular Enric Vives-Rubio

Depois da demissão do presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à Caixa Geral de Depósitos, PSD e CDS decidiram deixar a comissão em banho-maria e não indicar substituto para a presidência. Até terça-feira, dia de nova reunião, é possível que os dois partidos proponham a criação de uma nova comissão de inquérito, com um âmbito mais alargado do que o habitual, e também através do regime potestativo, ou seja, sem que a sua constituição dependa de votação no Parlamento.

A decisão de adiar uma posição sobre a actual CPI permite fazer uma pausa, depois de dois dias de intensa pressão sobre o Governo e o ministro das Finanças. Pressão essa que, nesta quinta-feira, por força das notícias sobre quem conhecia e o que constava dos SMS trocados pelo ministro das Finanças, Mário Centeno, e o ex-presidente da administração da Caixa, António Domingues, e sobretudo por força da intervenção do porta-voz do PS, João Galamba, acabou por recair também sobre o Presidente da República. Isto, ao mesmo tempo que o primeiro-ministro e líder do PS declarava que o caso estava encerrado. A direita continua a acusar o ministro de ter mentido ao negar que tivesse prometido a Domingues isentar a administração da Caixa que este liderava das obrigações de transparência a que estão sujeitos os titulares de cargos políticos e gestores equiparados. 

João Galamba veio dizer que Marcelo Rebelo de Sousa está “profundamente implicado” no caso dos SMS no mesmo dia em que José Matos Correia (PSD) se demitiu da presidência da CPI, afirmando que se recusa a “pactuar” com “um conjunto de atitudes que violam a lei e põem em causa o funcionamento normal” da comissão. Matos Correia disse que nunca tinha visto ser posto em causa um direito potestativo e que, se estes casos se repetem, as comissões de inquérito correm o risco de desaparecer.

O PSD, a quem cabe escolher o novo presidente da CPI, não indica, para já, um nome. O coordenador social-democrata na comissão, Hugo Soares, declarou que o partido vai “ponderar” a sua posição política sobre o assunto, reiterando que é “grave” a maioria de esquerda pôr em causa um direito potestativo ao chumbar a admissão dos requerimentos que pediam acesso aos SMS entre o ministro Mário Centeno e o banqueiro sobre um eventual acordo para desobrigar a administração da CGD de apresentar declarações de rendimentos e património ao Tribunal Constitucional. 

As bancadas do PS, PCP e BE alegaram, entre outros argumentos, que os pedidos de comunicações não se enquadram no objecto da actual comissão de inquérito sobre a recapitalização da CGD. Uma das possíveis saídas é, por isso, avançar com uma nova comissão, já nos próximos dias. Isso mesmo foi admitido pelo líder da bancada do CDS, Nuno Magalhães, em entrevista à Antena 1.

A constituição de uma nova comissão de inquérito pode ser imposta pela direita, por direito potestativo, mas no limite as bancadas à esquerda podem boicotar o seu funcionamento, não indicando deputados para a integrar. Foi isso mesmo que aconteceu com uma comissão sobre a reforma do Estado, proposta e aprovada por PSD e CDS em 2013, e que, por causa dessa atitude assumida pela esquerda, nunca funcionou.

Outra das iniciativas possíveis por parte das bancadas da oposição é recorrer a outros órgãos de soberania. A líder do CDS, Assunção Cristas, admitiu nesta quinta-feira vir a pedir uma audiência ao Presidente da República “para discutir as questões de funcionamento do Parlamento”.

Implicado em “nada”

No dia em que dois jornais voltaram a noticiar pormenores sobre os SMS trocados entre Centeno e Domingues, o Presidente da República recusou comentar a demissão de José Matos Correia. "Não me pronuncio sobre a vida interna de outros órgãos de soberania", salientou Marcelo Rebelo de Sousa à saída do V Congresso Nacional de Saúde Pública, no Porto. O Presidente aproveitou para voltar a tentar colocar um ponto final na polémica, como tenta fazer desde que recebeu o ministro Mário Centeno em Belém e emitiu uma nota sobre o assunto, na segunda-feira. “Da minha parte, ponto final parágrafo em relação à Caixa”, disse no Porto.

Mas o ponto final não aconteceu. Pouco depois, foram divulgadas declarações que o porta-voz do PS, João Galamba, proferiu no programa Sem Moderação, do Canal Q e TSF. “Tudo aquilo de que é acusado Mário Centeno pode Marcelo Rebelo de Sousa, o Presidente da República português, ipsis verbis, ser acusado da mesma coisa”. Ao PÚBLICO, João Galamba explicou melhor o que queria dizer quando acusou Marcelo Rebelo de Sousa de estar “profundamente implicado” no caso da Caixa Geral de Depósitos. “O que eu disse foi que a polémica era em torno de nada, que era uma fabricação política e, por isso, nem o senhor ministro das Finanças nem o Presidente estão implicados em nada. Se há quem ache que há implicação do senhor ministro – que não é a minha interpretação – então tem de ter consciência que é extensível ao senhor Presidente”.

João Galamba acrescentou que as declarações foram proferidas em nome pessoal e não na condição de porta-voz do PS. No comentário do Canal Q e da TSF, Galamba dizia ainda: “O que ele tentou fazer, na segunda-feira, político hábil como é, foi tentar demarcar-se disto e tentar desresponsabilizar-se de algo que também é responsabilidade sua.”

Ao princípio da noite, o primeiro-ministro também tentou encerrar o assunto. “O quê, ainda andam com esse assunto? Ainda não ouviram o senhor Presidente da República? Isso já acabou tudo na segunda-feira", disse António Costa, questionado sobre a matéria à margem de uma iniciativa em Oeiras.

De resto, durante o dia, no Governo, as palavras públicas foram de elogio a Mário Centeno. No final do Conselho de Ministros, Eduardo Cabrita, ministro-adjunto, considerou que o ministro das Finanças “merece a admiração dos portugueses”, já que está “associado aos melhores resultados orçamentais de Portugal em democracia”.

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