Parlamento madeirense aprova voto de protesto contra declarações de Ana Gomes

Eurodeputada socialista escreveu à Comissão Europeia a questionar a legitimidade de multinacionais beneficiarem de isenções fiscais na zona franca da Madeira, que considerou “opaca” e uma offshore.

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O PS-Madeira distancia-se da iniciativa da Ana Gomes e repudia a sua intervenção. Mas absteve-se Nuno Ferreira Santos

A Assembleia Legislativa da Madeira aprovou esta quarta-feira um voto de protesto pelas declarações da eurodeputada Ana Gomes. Em causa, está uma carta enviada pela parlamentar socialista à comissária europeia para a Concorrência, Margrete Vestager, na qual critica a “opacidade” do Centro Internacional de Negócios da Madeira (CINM) e define a zona franca madeirense como uma praça offshore.

Em resposta, a Comissão Europeia requereu ao Governo português a lista das empresas estabelecidas no CINM que obtiveram benefícios fiscais em 2014, pedindo uma relação sobre os montantes recebidos, o número de empregos criados e as características dos beneficiários.

O voto de protesto, que mereceu o apoio do PSD, que tem a maioria no parlamento regional, partiu da bancada do CDS, que acusou Ana Gomes de “iliteracia” nesta matéria e de ter colocado em causa o interesse nacional. “Toda esta propaganda negativa não é positiva para o CINM e em última análise para o país”, argumentou ao PÚBLICO o líder dos centristas madeirenses António Lopes da Fonseca, lamentando que a “esquerda mais radical” e alguns “dirigentes socialistas” estejam a tentar associar a zona franca ao escândalo dos Panama Papers.

Lopes da Fonseca afirma que a iniciativa de Ana Gomes “golpeou a boa reputação do CINM”, considerando que a eurodeputada revelou “revanchismo ideológico” contra a zona franca por esta estar situada na Madeira. Mesmo depois de o PS-Madeira, através do líder regional, Carlos Pereira, se ter demarcado e repudiado a intervenção da parlamentar em Bruxelas, o presidente do CDS no arquipélago estranha o “silêncio” de António Costa. “Teria um grande simbolismo se o primeiro-ministro se demarcasse claramente das declarações e dos actos da eurodeputada do seu partido”, afirmou, lamentando o “silêncio ensurdecedor” de Costa sobre esta matéria.

Na região, o PS apressou-se a distanciar-se de Ana Gomes, considerando que esta tomou uma posição contrária ao interesse da Madeira. “Eu disse várias vezes que a fronteira que separa a solidariedade com o partido é o interesse da Madeira, por isso o PS-Madeira distancia-se da iniciativa da Ana Gomes, repudia a sua intervenção e tudo fará para a defesa do CINM”, escreveu na altura Carlos Pereira.

Mas esta quarta-feira apenas o PSD votou favoravelmente a iniciativa do CDS. Carlos Rodrigues, vice-presidente da bancada social-democrata, defendeu mesmo que Ana Gomes deveria “renunciar” ao mandato, classificando a carta da eurodeputada como “inqualificável” e uma ataque “inusitado” ao centro de negócios madeirense.

Os socialistas abstiveram-se, tal como o Juntos Pelo Povo, com Vitor Freitas a justificar o voto com o facto de o partido já se ter demarcado destas declarações. Esta iniciativa, criticou o deputado socialista, é um “voto de ódio” contra a forma como Ana Gomes tem denunciado “certas atitudes” da direita nacional. Já o JPP justificou a abstenção com as “muitas perguntas no ar” que o centro continua a deixar.

As restantes bancadas votaram contra a iniciativa. O PCP, através de Ricardo Lume defende que o CINM “não é uma vaca sagrada, sobre a qual não se pode levantar questões”, e o bloquista Roberto Almada considerou o voto como uma tentativa de criar uma “cortina de fumo”, para que se continue a não levantar questões sobre a zona franca. Enquanto o Partido Trabalhista Português acusava o CDS de ser contra a “liberdade de expressão”, o deputado independente Gil Canha insistia que, enquanto o CINM tiver uma gestão privada, a desconfiança vai continuar.

Na carta escrita a 24 de Fevereiro, Ana Gomes questionava o facto de a União Europeia estar, no quadro do programa de ajudas, a contribuir para que multinacionais, de forma opaca, obtivessem benefícios fiscais por estar sedeadas na zona franca. A resposta de Margrete Vestager chegou a meio de Março, com um pedido de informações sobre as empresas registadas no CINM.

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