Menos burocracia e mais ética, por favor

Há mais de 1500 leis que a evolução social, económica e cultural do país tornou obsoletas e que o bom senso recomenda a sua pura extinção

A amostra é elucidativa e ainda se limita aos primeiros cinco anos de produção legislativa após o 25 de Abril. Leis como a da extinção dos concelhos territoriais das províncias ultramarinas ou da proibição de estacionamento em frente de casas de câmbio e repartições de finanças não são deste mundo. Há mais de 1500 leis assim, que ainda se encontram em vigor, mas que a evolução social, económica e cultural do país tornou obsoletas e cuja extinção o bom senso recomenda. Assim como muitas outras ainda estão por fazer – a evolução legislativa é mais lenta do que a evolução da sociedade, como temos visto, mais uma vez, com a discussão sobre a morte assistida ou a utilização da cannabis como droga terapêutica.

A reforma de um Estado não pode ignorar uma reforma legislativa deste tipo, por dela depender um Estado capaz de se relacionar menos burocraticamente com os cidadãos e com as empresas. Estas leis e normas burocráticas caídas em desuso, sobre temas tão prosaicos como a produção de farinha de pão, implicam duplicação de funções entre serviços do Estado e representam custos administrativos adicionais. Mais do que isso: são um desnecessário e intrincado quebra-cabeças para qualquer cidadão.

A simplificação e racionalização legislativa surge na sequência do lançamento do Diário da República Electrónico, preocupado em ser mais transparente na ligação com os cidadãos e em eliminar procedimentos burocráticos. E, um dia, talvez não seja obrigatório contratar um advogado para conhecer o regime jurídico aplicável a uma determinada actividade.

Mas a actualização administrativa passa também pela criação de centros de competências jurídicos na esfera do Estado, que lhe devolvam a autonomia e competências transferidas para os gabinetes de estudos e escritórios de advogados, com quem os vários organismos da administração central, local e regional gastam anualmente cerca de 30 milhões de euros. Daí que esta medida anunciada por António Costa, na semana passada, seja tanto uma questão de racionalização como de diminuição de custos. Só falta agora que seja algo mais do que uma intenção. E talvez seja desta que o Estado se iniba de negociar alterações à lei com escritórios de advogados, como no episódio da lei que tentava isentar os administradores da Caixa das obrigações associadas ao estatuto de gestores públicos. Será? Menos burocracia e mais ética, por favor.

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