E uma agência do medicamento para a memória?

Em Maio, todos os deputados apoiaram no Parlamento a candidatura de Lisboa a sede da Agência Europeia de Medicamentos. Agora, alguns questionam a escolha e sugerem alternativas.

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O voto passou despercebido, numa sessão que deliberou sobre 46 projectos de resolução Rui Gaudêncio

O texto foi a votos no dia 11 de Maio passado, na Assembleia da República. Defendendo, enfaticamente, uma ideia, que resume na conclusão: “A Assembleia da República, reunida em plenário, saúda e apoia a candidatura de Portugal à fixação da sede da Agência Europeia de Medicamentos em Lisboa, como de interesse nacional.”

Lisboa. Não o Porto, nem Braga, nem Coimbra. Lisboa. Todos os deputados presentes na sala das sessões carregaram no botão “sim”. Foi aprovado por unanimidade este “voto de saudação” pela candidatura portuguesa à agência (actualmente com sede em Londres, mas em vias de relocalização com a saída do Reino Unido da União Europeia).

O voto passou despercebido, numa sessão que deliberou sobre 46 projectos de resolução, projectos-lei, requerimentos e votos de protesto e saudação. Ninguém mais falou do assunto até que a polémica rebentou. Rui Moreira, presidente da Câmara do Porto, escreveu uma carta ao primeiro-ministro, António Costa, a mostrar a disponibilidade do Porto para receber a agência – cinco dias depois do voto no Parlamento, e depois da decisão do Conselho de Ministros que recaiu sobre a capital. “Temos, no Porto, grandes competências para acolher a agência. O mais importante é que venha para Portugal. Escrevi uma carta, não a reivindicar, mas a mostrar o nosso interesse”, adiantou o autarca.

A maioria dos partidos passou, entretanto, a criticar a escolha de Lisboa. O CDS considera-a um “provincianismo” nas palavras da deputada Cecília Meireles. O Bloco escolhe outro adjectivo, “centralismo”, para vir agora defender “que se devia decidir que Lisboa não era a melhor opção”, como afirmou a líder do partido, Catarina Martins. O PSD, pela voz do vice-presidente do grupo parlamentar, Miguel Santos, questionou o ministro da Saúde: “Consegue o ministro da Saúde verbalizar, com um toque de verdade, das razões para tal decisão e dos argumentos para preterir outras cidades portuguesas?” Além disso, vários deputados social-democratas vieram a público defender Coimbra como a melhor escolha.

Até alguns deputados do PS, que propôs o voto sobre Lisboa, são agora críticos da saudação que aprovaram. Carla Miranda (vereadora no Porto e deputada) e Tiago Barbosa Ribeiro (líder concelhio do PS Porto e deputado) consideram que “o Porto reúne todas as condições para ser considerada pelo Governo na candidatura nacional”. Esta frase faz parte de uma proposta levada à reunião de câmara no Porto em que os eleitos socialistas propuseram criar um grupo de trabalho para “elaborar um dossier de candidatura da cidade do Porto ao acolhimento da futura sede da EMA [Agência Europeia do Medicamento]”. Isto já depois do voto em Lisboa.

O que motivou esta reviravolta? Miguel Santos, do PSD, contactado pelo PÚBLICO, rebate a ideia. “As coisas não são bem assim… Eu estava lá. Não há mudança de posição.” Para o vice-presidente do grupo parlamentar social-democrata, o voto a favor representa apenas um esforço de convergência para a candidatura nacional. "Nós, PSD, não podíamos estar contra uma coisa destas.” O que o partido agora lamenta é a “falta de transparência do processo”, porque “a candidatura de Lisboa já estava decidida” e o Governo devia “ter ponderado” outras alternativas.

Catarina Martins, do BE, também comentou, em Setúbal, o assunto: "Existe consenso para apresentação de uma candidatura forte, mas o que aconteceu foi uma precipitação do Governo." Contactado pelo PÚBLICO, o BE esclarece que o voto exprimiu o consenso, e as críticas posteriores quanto à localização se devem à falta de estudo de alternativas.

Marcelo Rebelo de Sousa, na Póvoa do Varzim, também se referiu a esta polémica: "O que posso pedir é que os partidos estabilizem a opinião, cheguem ao acordo possível e depois remem todos na mesma direcção, senão o que já é difícil torna-se impossível."

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