Dívida oculta da Madeira: Juíza arquiva processo, mas quer MP a investigar mais

O processo ‘Cuba Livre’, que investiga os 1,1 mil milhões de euros ocultados pelos governos de Jardim, foi arquivado. Mas a juíza de instrução considera que existem indícios de crime, e quer que o MP continue a investigar.

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Alberto João Jardim era arguido no processo de ocultação da dívida da Madeira Gregorio Cunha

Foi um ‘nim’ a decisão do Tribunal Judicial da Comarca da Madeira, sobre o processo ‘Cuba Livre’, relacionado com ocultação de 1,1 mil milhões de euros nas contas públicas madeirenses.

Por um lado, a juíza de instrução, Susana Mão de Ferro, decidiu esta tarde não pronunciar os arguidos, entre os quais o ex-presidente do executivo regional, Alberto João Jardim, decidindo pela arquivação do processo. Por outro, determinou que, assim que estiveram esgotados os recursos, sejam extraídas certidões autónomas do ‘Cuba Livre’ e remetidas ao Ministério Público, para eventual investigação.

A decisão de arquivamento, a segunda neste processo depois da Procuradoria-Geral da República ter feito o mesmo em 2014, é passível de recurso, mas o advogado dos assistentes, um grupo de militantes do extinto PND, que pediu a abertura da instrução, não sabe se vai recorrer.

“Está nas mãos do povo madeirense que sentiu na pele esta ocultação da dívida”, disse António Fontes ao PÚBLICO, explicando que os assistentes gastaram “milhares de euros” neste processo, e não sabe se estão dispostos a continuar.

O arquivamento do processo foi recebido com “espanto” e “surpresa”, pois no entender de António Fontes os factos estão provados e “confessados”, não só em tribunal como perante toda a sociedade. Jardim, em plena campanha eleitoral para as regionais de 2011 admitiu em várias ocasiões a existência de uma dívida oculta que, argumentou, foi a única maneira do arquipélago poder aproveitar os fundos comunitários.

Mesmo assim, e apesar do método utilizado para a ocultação de facturas de obras públicas ter sido tornado público, durante a fase de instrução do processo – existia mesmo um software específico para as fazer desaparecer da contabilidade nacional – a juíza considerou que, face ao objecto do processo, não conseguia apurar responsabilidades criminais aos titulares de cargos públicos da administração regional.

Além de Jardim, que chefiou o executivo entre Março de 1978 e abril de 2015, foram constituídos arguidos o vice-presidente do governo madeirense (2000-2015), João Cunha e Silva, e os secretários regionais do Equipamento Social (Santos Costa) e do Plano e Finanças (José Ventura Garcês), além de três directores regionais: Dulce Veloz (Orçamento e Conta) Amélia Gonçalves (Gabinete de Gestão e Controlo Orçamental) e Ricardo Rodrigues (Orçamento).

Em causa, estavam os crimes de abuso de poder, prevaricação com dolo e na forma tentada e violação de execução orçamental, praticados entre 2003 e 2010. Período em que as facturas não pagas e não declaradas foram-se acumulando.

Agora, com esta decisão, António Fontes admite que o processo possa “finalmente” ser investigado, e de uma forma mais abrangente. “Este processo veio inquinado de Lisboa, com o objecto de investigação a ser demasiado circunscrito”, explicou o advogado.

Já Gil Canha, um dos assistentes, desconfia. “Parece-me mais uma questão de fogo-de-artifício”, ironiza o deputado independente do parlamento madeirense, acrescentando que a juíza deveria ter pedido escusa do processo, por ser casada com um advogado que trabalha na mesma sociedade que defendeu um dos arguidos.

O processo ‘Cuba Livre’ remonta a 2011, quando Jardim foi obrigado a pedir assistência financeira a Lisboa. O então Procurador-Geral da República, Pinto Monteiro, mandou instaurar um inquérito em Setembro desse ano, que mediatizou-se numa operação conduzida pela GNR, em Abril de 2012, que cercou a sede da Secretaria Regional do Equipamento Social, para a realização de buscas.

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