Costa teme venda de activos da PT (e agradeceu à Vodafone em Pedrógão)

O problema é menos a compra da TVI e mais o que a Altice está a fazer aos trabalhadores. E o que possa fazer aos activos. E nem o português na administração sossega o Governo.

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Miguel Manso

O problema não é tanto a compra da TVI, que na sexta-feira o ministro Pedro Marques remeteu para "os reguladores, que seguramente estão atentos". A maior preocupação que o primeiro-ministro terá manifestado na reunião com Patrick Drahi, patrão da Altice, é a de saber quais as intenções daquele grupo em relação à PT. De acordo com as informações recolhidas pelo PÚBLICO, há no Governo o receio de que o despedimento de trabalhadores, incluindo o fecho ou venda pontual de activos da PT, possa ser a razão pela qual a Altice está a transferir trabalhadores da PT para empresas satélites, entretanto criadas. 

O receio do Governo em relação à Altice prende-se com o facto de este ser, essencialmente, um grupo financeiro (e não assente na indústria), com pouco capital próprio. É um método várias vezes seguido pela Altice: faz aplicações, compra empresas, com crédito bancário, e reestrutura-as de forma a rentabilizá-las para garantir boas vendas e mais crédito.

Mesmo o facto de um dos membros da administração da holding ser um português, Armando Pereira, não parece sossegar o Governo: este é visto como um produtor de cabos de fibra óptica, mas não um gestor com perfil para dirigir uma empresa como a Altice.

Se o clima entre as duas partes já não era o melhor (Costa chegou a garantir ao Bloco e PCP que travaria um despedimento colectivo na empresa), ainda piorou com os acontecimentos de Pedrógão. Esta quarta-feira, no Parlamento, o primeiro-ministro fez um duro ataque contra a PT/Meo, que terá sido motivado pela experiência directa que António Costa viveu em Pedrógão Grande no fim-de-semana do incêndio que matou 64 pessoas e feriu 254. "O que aconteceu em Pedrogão Grande com a PT foi gravíssimo”, disse um membro do executivo ao PÚBLICO.

O tom de Costa foi agressivo e veio com um desafio à Anacom: “Espero que a autoridade reguladora [para as telecomunicações], olhe com atenção só o que aconteceu com as diferentes operadoras nestes incêndios de Pedrógão Grande. Compreenderá certamente que houve algumas que conseguiram sempre manter as comunicações e houve outra que esteve muito tempo sem conseguir comunicações nenhumas – e isso é muito grave.” De acordo com as informações recolhidas pelo PÚBLICO, enquanto no dia 18 de manhã, segundo dia do incêndio de Pedrógão, o presidente da Vodafone telefonou ao primeiro-ministro a garantir-lhe que tinha restabelecido com antenas móveis a rede destruída pelo fogo. Mas a rede da PT esteve sem funcionar pelo menos até domingo à tarde, o que fez com que o presidente de Castanheira de Pêra estivesse incontactável pelo Governo e ausente das primeiras reuniões sobre o incêndio - Fernando Pires Lopes teria um telemóvel da rede Meo e o primeiro-ministro não conseguia contactá-lo. Só no domingo às 16 horas, quando decidiu meter-se no carro e rumar a Castanheira de Pêra, António Costa conseguiu falar com o autarca. No final da conversa foi-lhe entregue um telemóvel da Vodafone para que a coordenação prosseguisse a bom ritmo.

De acordo com o membro do Governo ouvido pelo PÚBLICO, as falhas do SIRESP terão, pelo menos em parte, a ver com a rede da PT, empresa que faz parte da sociedade proprietária do sistema de comunicações em causa e que assegura as ligações por cabo. “O SIRESP funciona na rede PT. A rede SIRESP é gestora de um sistema que assenta nas antenas móveis, mas estas estão interligadas pelas comunicações da rede da PT", argumentou o mesmo membro do Governo, rematando: “Quando o SIRESP diz que as antenas e os seus meios de comunicação estavam a funcionar, é verdade. O que não funcionou foram os cabos da PT que arderam. E a PT não fez diligências imediatas para resolver o problema.”

Há duas semanas, quando foi foi contactada pelo PÚBLICO, a Altice/PT garantiu que as suas equipas estiveram “no terreno desde a noite de sábado, 24x7, nas operações de protecção das suas infra-estruturas e na reposição de traçados ardidos”, tendo instalado “inclusive uma Unidade Móvel Transportada temporária, configurada via satélite, para dar às autoridades e populações afetadas a possibilidade de comunicarem sem restrições”, assim como telefones satélite para apoio às equipas no terreno” e um Centro de Operações da Meo, “abrangendo cerca de 200 técnicos”. 

“Foram, em tempo recorde, substituídos mais de 100 km de cabos de fibra e mais de 200 km de cabos de cobre, bem como mais de 5000 postes de madeira”, garantiu a Altice ao PÚBLICO”, concluindo que “em 4,5 dias, 98% da globalidade dos serviços, nomeadamente a rede móvel, já estavam repostos”. As queixas do primeiro-ministro, porém, centram-se sobretudo nas horas decisivas do incêndio. com Liliana Valente

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